quinta-feira, 9 maio , 2024

Viver de peito aberto

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Viver de peito aberto

Você consegue dizer o que pensa e sente, sem medo do julgamento? Consegue fazer
o que acredita sem se preocupar com expectativas alheias? Como ser mais
espontâneo e autêntico?

Dia desses me peguei encurralada entre falar ou deixar o barco levar. Fiquei com medo, confesso. Como serei interpretada? Me posiciono ou deixo estar? Bateu um desconforto no peito, um nó na garganta, um entorpecimento. Tentei ensaiar palavras e criar um enredo, mas logo percebi que era tudo muito confuso e resolvi deixar. Cedi ao medo por algum tempo, parecia haver uma laranja entalada em minha garganta. Hesitei e deixei passar.

Não demorou muito, algo veio me sinalizar que não era mais possível segurar. O sangue
subiu, o coração acelerou, as pernas tremiam e quando menos esperava, comecei a falar.
Uma voz meio engasgada, torta e descoordenada saiu, sem que eu pudesse controlar.
Não havia nada ensaiado, apenas um impulso e uma vontade de a verdade revelar e de me
livrar do que me afligia. De tentar me expressar.

Como me senti? Frágil, confusa, exposta. Minutos depois tive uma leve impressão de ter feito tudo errado. Mas volto a fita e me imagino do outro lado, calada e fico aliviada em optar por deixar a voz se soltar. Pronto, falei, nem consigo acreditar.

É simples abrir o coração? Claro que não. Temos medo da reação alheia. Do julgamento. Da percepção. Da distorção. Na maior parte das vezes o sentimento de medo é real, embora exista uma pequena chance de concretização do que nos assusta, pois na maior parte das vezes, o enredo que criamos é fruto apenas da nossa imaginação.

E por que não queremos nos expor? Porque muitos de nós já vivemos experiências
passadas de rejeição, por falta de autoconhecimento ou confiança, por dificuldades de
comunicação ou para não expor nossas fragilidades.

Pois bem, tempos depois desse momento, ouvi Ana Holanda, uma escritora maravilhosa
dizer algo que conectou muito com essa experiência: Escrever é um ato de coragem de
expor a própria vulnerabilidade. É se colocar no palco, nua e crua. É encarar a própria
verdade.

Receber isso me soou como um soco no estômago e ao mesmo tempo como um eco da
minha própria voz. A mais pura verdade. Eu apenas substituiria o “escrever” por “viver”, embora de fato, a fala dela também se aplique à escrita. Se colocar no palco, se expor ao julgamento é ser protagonista da própria história. É arriscar cantar encarando a possibilidade de ser vaiado, de levar tortas na cara. É falar, mesmo correndo o risco de ser mal interpretado. É se lançar na vida de peito aberto, se dando a oportunidade de sair da armadura que criamos e nos traz uma falsa sensação de proteção mas nos leva a viver na anestesia, na ilusão, encarcerados.

Optar por sair para saber o que tem do outro lado e decidir o que fazer, mesmo que o
resultado não seja o esperado, é sair da deriva e controlar o leme do barco. É sair da prisão
da dúvida. E se for difícil a escolha, pensa que na vida, tudo é uma questão de botar na balança e entender para onde ela pende. O que te dói mais? Arriscar ou ficar no mesmo lugar? Falar ou calar?

Outra dica é fazer experimentos em pequenas doses até entender o que funciona melhor ou até o novo ou a expressão da sua voz ficar mais confortável. Devagar se vai ao longe, como dizia minha mãe. E quem tem boca vai à Roma, ela dizia também.

E eu aprendi mais algo com a vida. A coragem vem no caminho então se há dúvidas, comece a caminhar. Quer aprender a falar em público? Comece falando. Abra mão da expectativa alheia, diminua a autocrítica, considere as emoções do outro mas
pare de se preocupar em sempre agradar ou ser perfeito e veja o que acontece.

Aposto que você descobrirá forças que não sabe que tem, se tornará mais espontâneo e
autêntico. E sabe mais? Você pode até se surpreender com o resultado.

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