Dada a nossa esquerda, assusta a nossa direita

Estamos concordes sobre desapreciarmos o político Jair Bolsonaro. Exatamente, não. Melhor seria dizer: Alguns estamos de acordo sobre não gostarmos do político Jair Bolsonaro. É que muita gente é fascinada pelo Capitão.

Bolsonaro reduz a seus termos simplistas a complexidade política, econômica e social em que o Brasil se encontra, manipulando um esquema discursivo alicerçado em receitas prontas para acudir todos os males da Nação.

Sua modalidade discursiva não explicita meios de aviar propostas; oferece (má) forma sem conteúdo. Os temas que elege para fundar suas falas, todavia, correspondem àqueles que assolam o cotidiano de boa parte da população.

Intelectualmente, Bolsonaro é reducionista: decompõe os intrincados acontecimentos da nossa vida em comum, tomando as partes pelo todo, dando-lhes mais importância do que ao fenômeno em sua completa abrangência.

Sucede que as falas de Bolsonaro encontram eco forte na Sociedade brasileira. Não aconteceria um Bolsonaro na crista dos lugares de fala da Nação se não houvesse quem o escutasse, referendasse e desse repercussão.

Em momento antipolítico, quem se configura como político atípico torna-se estuário dos desafogos contra os modos das nossas figuras públicas. O feitio mais político de nossos políticos é o escapismo: não entrar em bola dividida.

A nossa tradição eleitoral recomenda que o candidato não assuma posição em temas polêmicos. Desta maneira escorregadia de ser não se pode acusar Bolsonaro. Seus reducionismos não soam demagógicos. Ele parece sincero.

Nas exatas palavras de seu marquetólogo, “o Bolsonaro já foi assimilado pelo povo brasileiro. Cada vez mais, as pessoas compreendem que ele é verdadeiro, fala o que pensa e não mede palavras” (L. Salles, Veja, 01ago18).

A Veja adverte que Bolsonaro “cresce e assusta. A ameaça é real. Bolsonaro cresce no voto espontâneo, e surge um desafio: como lidar com um candidato que é um retrocesso no social e uma incógnita na economia”.

Ainda: “Sem apoio de partidos, dinheiro nem tempo de TV, Bolsonaro cresce nas pesquisas e demonstra ter musculatura para ser competitivo no segundo turno” (A. C. Costa). Sem intermediação institucional. Isso é inquietante.

Temos na História dois políticos que se elegeram sem dependência de partidos: Jânio Quadros e Fernando Collor. Ambos se puseram, ou foram postos, em rota de colisão com o Congresso. Não conseguiram governabilidade.

Retomo a Veja (8ago18): “A fadiga da democracia. “Os regimes livres não morrem mais a golpes de bazuca. O ataque é insidioso e tanto mais eficiente em países polarizados e em crise política e econômica – como o Brasil”.

Bolsonaro: ao contrário dos vaticínios, o candidato […] demonstrou ter trunfos na manga para sobreviver aos debates com adversários” (R. Paduan e E. Ghirotto).  Esnobado por partidos, bem posicionado no cenário eleitoral.

Revista Exame, janeiro de 2018: “Lá vem o Messias. Uma incógnita do ponto de vista econômico e defensor do indefensável. Num cenário de polarização política, Bolsonaro ocupou o posto de principal opção contra a esquerda”.

Por malfeitos, boa parte da esquerda está na cadeia. De esquerda, centro ou direita, a classe política está desacreditada. Lamento a conduta da esquerda no governo, porque, afinal, da deplorável direita jamais esperei nada.

Nesse clima árido aos políticos, arremedou-se o salvador: “Incisivo, Bolsonaro reflete o anseio popular, representando uma maioria que já não suporta a canalhice e a baboseira da política tradicional” (G. Bebianno, FSP, 21jan18).

Patifaria não tem lado. Após a Folha mostrar que Bolsonaro e seus filhos multiplicaram patrimônio na política, “Em redes sociais, presidenciável e seus familiares afirmam que há um complô entre adversários e imprensa.

Bolsonaro diz estar em curso ‘a maior campanha de assassinato de reputação’ da história recente, protagonizada pela grande mídia, e cobra foco em seus concorrentes” (R. Bragon, C. Mattoso e I. Nogueira, FSP, 09jan18).

A Istoé ironiza: “O manual petista de Bolsonaro. Jair Bolsonaro segue a mesma toada de Lula, na prática de ilegalidades e nos discursos de vitimização […] Flagrado em malfeitos, se disse alvo de perseguição” (A. Filgueira,17jan18).

Dada a trajetória do candidato, isso choca. “O espantoso é que uma parcela de seus seguidores ignore qualquer questionamento em nome da manutenção da mitologia em torno do ‘escolhido’” (V. Magalhães, Estadão, 14jan18).

Não obstante L. H. Mencken ter advertido que “para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, clara e errada”, muitos eleitores desprezam os elementos necessários ao encaminhamento do Brasil.