Angustiados porém conectados

Um jovem programador é atormentado por estranhos pesadelos nos quais sempre está conectado por cabos a um imenso sistema de computadores do futuro. À medida que o sonho se repete, ele começa a levantar dúvidas sobre a realidade.

E quando encontra os misteriosos Morpheus e Trinity, ele descobre que é vítima do Matrix, um sistema inteligente e artificial que manipula a mente das pessoas e cria a ilusão de um mundo real enquanto usa os cérebros e corpos dos indivíduos para produzir energia.

Essa sinopse do filme Matrix, que já tem um tempo mas é incrivelmente atual pela semelhança com a nossa realidade, me despertou um olhar para o como estamos vivendo em tempos de tanta conectividade.

“Não sei o que faço, as redes sociais estão me deixando atordoado.”

“Como muda a vida, ficar desconectado”

Esses são relatos de pessoas que me contactaram dias atrás, divididos entre viver na matrix ou na realidade. Dias depois, passei um tempo desconectada, atenta demais às dores em recuperação a um mal real chamado Covid-19, e senti na pele. Caramba! Muda ficar conectado, mas qual é o problema?

Será que as redes sociais estão nos fazendo ter uma falsa impressão da realidade? Vejamos. Basta um rápido ​scrolling ​(deslizar o dedo e atualizar a rede), para sermos abduzidos para algo que tem a capacidade de sugar toda a nossa atenção.

Uma enxurrada de informações que disparam emoções antagônicas, uma relação de amor e ódio. Não queremos viver nelas (nas redes) mas não conseguimos mais viver sem, me parece claro. Quer saber por que?

Quando olhamos para o celular, é como se acendesse uma luz na nossa mente, é a sensação inconsciente de que tem algo ali para nos animar.

É a dopamina que o nosso cérebro libera quando recebemos uma curtida ou comentário, quando lembramos da interatividade ou quando os algoritmos nos trazem como se fosse mágica o vídeo que “estávamos precisando assistir”, inocente. E de repente, 30 minutos, 1h, 3h do nosso dia (vida), já eram.

Será que estamos viciados? Veja você, analise os seus atos. E como lidar com a vida real, que parece chata e monótona quando as redes nos trazem um caminhão de estímulos em alta velocidade?

Como desviamos os olhos dos nossos filhos das telas e o fazemos conversar conosco no jantar? Como eu sei o que é fake ou realidade? Será que aquela pessoa que parece extremamente feliz nos stories está feliz mesmo ou está triste?

Tenho mais perguntas do que respostas. Mas elas são o primeiro passo para acordarmos de algo. Uma coisa é fato. Tem muita gente com a saúde mental ameaçada, mas no mundo dos algoritmos e filtros, está tudo bem, obrigada.

Às vezes é um amigo nosso, que admiramos pela sua espontaneidade no TikTok mas que quando desliga a câmera tem vontade de se jogar da janela de tanta ansiedade. E a gente nem sabe.

Pode ser o seu filho, que começa a perder sua autoestima ao ver que o filtro não corresponde a como ele é no espelho. E chora escondido. E você também não sabe. É fato. O índice de suicídio e internações hospitalares por automutilação aumentou com o surgimento das redes sociais nos jovens da geração Z.

E será que estamos tendo sanidade o suficiente para olhar e conversar com quem nos importamos e entender como está a sua vida, fora das telas? A cada momento, notícias novas, milhares de vídeos, fotos nos trazem flashbacks, ou seja, funcionam como gatilhos que mexem com nossas emoções. Comece a notar, como isso te afeta?

Dia desses uma pessoa começa a chorar dentro de minha casa e eu pergunto: O que houve? Ela diz que teve um sonho horrível sobre a perda de alguém. Em segundos minha memória me lembra que cedo ela chegou na minha casa contando de uma notícia que viu de um acidente na cidade. Pelos detalhes que ela me falou, me pareceu óbvia a sincronicidade.

Algo distante parece que está dentro de casa e nos mexem profundamente porque nos remetem a medos e angústias que são muitas vezes inconscientes. E a maioria das pessoas não consegue ligar os fatos. Apenas reagem ao que vêem e ouvem. 70% dos brasileiros dormem e acordam grudados no celular. E como dormimos e acordamos, de verdade?

Temos parado para nos ouvir com atenção e cuidado das nossas dores e necessidades? Ou temos preferido nos distrair e ficamos “dormindo” para não precisarmos lidar com a nossa vida como ela é? Com suas imperfeições e instabilidades.

Espero que não seja tarde para pararmos de fazer essa comparação injusta, de egos off-line realistas com egos on-line idealizados. As redes não necessariamente são as vilãs, mas tem sua parcela de responsabilidade. Agora a mudança está nas nossas mãos.

Precisamos de mais consciência para que possamos controlar o que queremos em nossa vida e não para sermos controlados. Quer uma dica?

Desligue todas as notificações do seu celular. Modere o tempo que você passa nas redes. Acompanhe o que seu filho assiste. Não dê tanta liberdade. Se os adultos já se atrapalham, imagine quem não tem maturidade.