Pós-verdade na era digital

Foto: Divulgação/Notisul
Foto: Divulgação/Notisul

Antes de começar a discorrer sobre o título e sua relação com a tecnologia e a educação nos dias atuais, permitam-me apresentar uma rápida resenha do livro publicado por George Orwell (1903-1950) no ano de 1949, o romance distópico “1984”.

O enredo se passa na “Pista de Pouso Número 1”, antiga Grã-Bretanha, uma província do superestado da Oceania. O protagonista principal, Winston Smith, trabalha no “Ministério da Verdade” (Miniver, em Novafala) e é responsável pela propaganda e pelo revisionismo histórico, onde utilizando uma máquina que datilografava a partir da sua fala, reescreve artigos de jornais do passado de modo que seus textos estejam redigidos como se sempre tivessem apoiado a ideologia do partido e o “Grande Irmão”. Além disso, o Miniver também é o responsável por destruir documentos que não foram revisados ou editados, de modo a não deixar nenhuma prova de que o governo possa estar mentindo.

Além desta obra maravilhosa, poderíamos explorar outras tantas, como “Revolução dos Bichos” também de Orwell, “Fahrenheit 451” de Ray Bradbury e “Admirável Mundo Novo” de Aldous Huxley. Todos de leitura e releitura obrigatória.

Mas afinal, qual a importância destes livros na contextualização deste texto? É que de uma forma ou outra, todos abordam o conceito de “Pós Verdade”, onde as estórias se passam em ambientes cujos governos atuais querem “destruir” toda a “verdade” existente que não condiz com o que eles entendem como sendo a sua realidade (ou pelo menos sua atual interpretação).

Mas afinal o que é Pós Verdade? Este termo foi utilizado pela primeira vez em 1992 durante a Guerra do Golfo, e foi considerado pelo Oxford a palavra do ano em 2016, é de forma geral é utilizado para representar circunstancias onde fatos objetivos são menos influentes na opinião pública do que a interpretação ou emoções geradas por eles nas pessoas, e também, intenciona-se mudar o passado, pelo menos do ponto de vista histórico (como contar o fato ocorrido). E novamente, a internet e as mídias digitais, são apenas meios para que isto tudo ocorra mais rapidamente.

Como escrevi no texto “ódio digital”, é agora que vou conquistar meus “haters” (risos).
No Brasil, e em muitos outros países do mundo inteiro, temos presenciado situações muito similares aos enredos de “1984” e das outras obras, pois, os Governos que assumem o poder tentam de toda a forma reconstruir a verdade segundo suas ideologias. Está acontecendo isso neste exato momento, sem contar que o grupo político que governou o Brasil nos últimos 16 anos fez exatamente a mesma coisa, assim como o anterior também o tinha feito. E não é só isso, mesmo períodos mais distantes estão sendo “reescritos” e “recontados” com vieses diferentes de acordo com a ideologia dos escritores (re-escritores). Alguns exemplos são relativos ao período do Regime Militar, do Estado Novo, e até mesmo da Monarquia, onde frequentemente novas obras são editadas e publicadas trazendo versões “demonizando” estes acontecimentos enquanto outras os “reconstroem” como tendo sido os melhores tempos vividos pelos Brasileiros.

A verdade é que não foram “nem 8, nem 80”, e sim, épocas tanto de opressão quando de segurança, dependendo do ponto de vista do historiador.

Ocorre no Brasil, na América, na Europa, Ásia, em todos os países. Este mecanismo foi utilizado ontem, é utilizado hoje e será amanhã. Então cabe a nós Pais, Educadores e Estudante, tentar identificar este artificio que comumente está presente nas mídias publicadas pelos governos, oposição, centro, direita ou esquerda, e olhar além do fato relatado e buscar a verdade nua e cria. É fácil? Garanto que não é não. Mas é necessário.

E é exatamente neste ponto que a Educação se torna a principal arma. Busque ler não apenas “um lado da história/estória”, e sim, consulte outros autores que pensam diferente. Reflita, questione, o mais importante, jamais “compre” a notícia como sendo verdade absoluta se a única fonte disponível for um post em alguma mídia social, uma mensagem eletrônica, e até mesmo aquela notícia no “jornal das 8” da emissora mais importante do país. Sempre questione, porque eles estão dando este enfoque para o ocorrido? Quais são os interesses escondidos por traz do tom noticioso?

Pais/educadores:
Dependendo da idade dos seus filhos e alunos, uma dica é a leitura das obras citadas neste texto, e a discussão das mensagens transmitidas pelas mesmas. Podem aproveitar também os acontecimentos atuais no Brasil e no Mundo e como eles estão sendo divulgados. Busque a mesma notícia em mais de um jornal/revista/canal de TV e compare as manchetes e os conteúdos, discuta com seus alunos/filhos o fato de que o mesmo acontecimento por vezes é tratado como positivo ou negativo, dependendo de quem o escreve.
Acredite no que você vê/lê, mas também duvide!

Leia outros textos desta coluna em http://bit.ly/fernandopitt.