Toque de acolher garante o direito à vida dos menores (fim)

 

O ECA, no artigo 74, autoriza o poder público a regular a presença de menores nas diversões públicas, como circular pelas ruas no período noturno, podendo ser restringido, por meio de portaria do juiz da Infância e Juventude. Finalizo, citando a doutrina do jurista Valter Kenji Ishisda, expert no Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu livro “ECA comentado”, cujas considerações são favoravelmente esclarecedoras quanto à legalidade do toque”.
 
“Questão que recai é sobre a legalidade e constitucionalidade da medida. O são Conanda em sua 175ª Assembleia aprovou parecer contrário à medida. Seus principais argumentos de que novamente crianças e adolescentes seriam tratados como “objetos de direito” e ainda que há restrição ao direito à convivência familiar. 
 
“Respeitados esses posicionamentos, próprios de um estado democrático de direito, não visualizamos como medida ilegal ou inconstitucional a portaria que limita o horário noturno de criança e adolescente. O art. 74 do ECA já dispunha sobre a regulamentação pelo Poder Público da diversão e do espetáculo. Nessa diapasão, toda criança ou adolescente possui direito à diversão e espetáculo adequado à sua faixa etária. Existe, portanto, um poder normativo do magistrado da infância e juventude, adequando o horário da diversão da criança e do adolescente.
 
Relacionado ao mesmo, o direito de ir e vir no período noturno que se relaciona diretamente à diversão pública. Pode-se alegar, por exemplo, que o adolescente frequente o ensino médio ou mesmo o superior nesse horário noturno. Logicamente, essa atividade deve constituir exceção ao denominado ‘toque de recolher’.
 
Importante frisar que tal poder do magistrado menorista repousa, conforme já salientamos, em nosso “Infração administrativa no Estatuto da Criança e do Adolescente”, p. 24, no poder de polícia consistente na obrigação da Administração Pública de condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades e direitos individuais, em benefício da coletividade ou do próprio Estado. Consoante se destacou, a edição de portaria encaixa-se nesse poder de polícia de cunho eminentemente administrativo, já conhecido com a edição do então Código Mello Mattos e, como se frisou, o próprio magistrado Mello Mattos sofreu enorme pressão, por tencionar exercer esse poder sobre o divertimento menorista.
 
É preciso ressaltar que o exercício efetivo da proteção integral e do superior interesse da criança e do adolescente não se faz apenas pela efetivação dos seus direitos, mas também pela delimitação das suas obrigações. O juiz, ao efetivar o poder normatizador por intermédio da portaria, estará também de certa forma, contribuindo na sua educação, limitando o contato pernicioso de crianças e adolescentes com substância entorpecentes, bebidas alcoólicas, cigarro etc.
 
Assim, desde que bem direcionada, e admitindo exceções como a de circulação de adolescentes em período de estudo ou acompanhado dos pais ou responsável legal, não vislumbramos obstáculo a instituição de portarias pelos juízes regulamentando o horário noturno de circulação de crianças e adolescentes.