Sudão: de guerra civil a genocídio

 

Situado no continente africano, o Sudão possui um histórico litigioso, o qual foi fomentado pela má divisão no período colonialista. Explorado pelo Egito e, posteriormente, pela Inglaterra, o país somente tornou-se independente em 1956. O governo do país era centralizado em uma elite árabe, em Cartum, sendo que a população negra de Sudão clamava por maior representatividade política e econômica. Dessa forma, uma série de revoltas eclodiu, fomentando a ideia de separar ambas as regiões (Sudão do Norte e Sudão do Sul). Entretanto, a independência do Sudão do Sul, em 9 de julho deste ano, não trouxe a paz. Apesar de rico em petróleo, o novo país enfrenta uma série de problemas sociais e uma infraestrutura praticamente inexistente. Os conflitos persistem, principalmente nas questões relativas à demarcação das fronteiras, à dívida externa, à repartição dos dividendos oriundos do petróleo e à disputa sobre a região de Abyei.
 
Enquanto a guerra civil consiste em um conflito interno, travado entre grupos organizados, para resolver questões políticas, conseguir autonomia ou poder dentro de um determinado país, o genocídio comporta um tipo específico de carnificina, onde os assassinatos coordenados ocorrem para realizar uma limpeza étnica, nacional, racial ou religiosa dentro de um determinado território. Tendo em vista que a Organização das Nações Unidas adota o princípio da não-interferência, o qual compreende que não se deve interferir nos assuntos internos dos países, a utilização do termo “guerra civil” para definir os conflitos ocorridos no Sudão (especialmente na região de Darfur) atuaria de forma a beneficiar grandes potências, como a China e os Estados Unidos, as quais possuem interesses econômicos no território que, hoje, compreende ao Sudão do Sul. Desse modo, evitou-se utilizar o termo “genocídio” para classificar o massacre ocorrido no Sudão, pois, se assim fosse, o Tribunal Penal Internacional (TPI), com base no dever de proteção aos direitos humanos, teria que adotar medidas mais enérgicas, as quais, provavelmente, prejudicariam os interesses econômicos de determinados países, no que concerne à exploração do petróleo. 
 
Tendo em vista o desrespeito explícito dos direitos humanos, no Sudão, deve-se realizar uma análise acerca dos princípios que norteiam as relações internacionais. Até que ponto serão inobservados os direitos dos homens em prol da perpetuação de um sistema que permite o derramamento de sangue, desde que seja para a manutenção da ordem econômica vigente? Os direitos humanos consistem em direitos inatos aos seres humanos, direitos que lhes são garantidos pelo simples fato de existirem. Amparados pelo princípio da dignidade e da igualdade, esses direitos são inalienáveis. No entanto, para que ocorra a efetiva defesa dos direitos do homem, faz-se necessário a existência de normas legais capazes de regularem eventuais transgressões. A Organização das Nações Unidas (ONU) possui relevante papel nesse sentido, pois abrange 193 países, representando, pelo menos em tese, o ponto de vista de diferentes culturas do globo.
 
Em 1948, a assembleia geral da ONU adotou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, a qual se tornou documento internacional de grande notoriedade, no que concerne ao respeito dos direitos humanos. Ademais, discussões posteriores sobre o tema também tiveram repercussão internacional, como foi o caso da Convenção Internacional dos Direitos Humanos, de 1966, e da Conferência Mundial de Viena sobre Direitos Humanos, de 1993.
 
Com base nos fatos analisados, pode-se analisar que os direitos humanos foram explicitamente violados no Sudão, sendo que a comunidade internacional negligenciou a existência de um genocídio (pois o massacre no Sudão foi, de fato, um genocídio, ao invés da nomenclatura veiculada “guerra civil”), a fim de atender um consenso entre as potências que possuem licitação na exploração de petróleo da região. Dessa forma, para que as disposições do Direito Internacional tornem-se eficazes, deve-se reavaliar a aplicação das sanções, a fim de tomar medidas mais justas e igualitárias, que visem estimular a solidariedade e a integração global; ao invés de medidas seletivas, as quais são movidas conforme interesses individuais dos estados soberanos.