Empregar é atividade de alto risco no Brasil, infelizmente!

Fernando Valente Pimentel
Presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit)

Criar empregos no Brasil é um ato temerário, conforme atestam dados estarrecedores: dez milhões de processos em tramitação na Justiça do Trabalho, sendo 6,5 milhões remanescentes dos anos pregressos e pouco mais de três milhões distribuídos no período da crise, entre o final de 2015 e 2016. Temos mais ações do que a soma de todos os países.
Isso subverte a lógica do capitalismo contemporâneo, de inclusão econômica e promoção do bem-estar social como consequências diretas do fomento à produção e valorização do capital humano. Tamanha insegurança jurídica é mais um fator, em meio à recessão, que conspira contra a recolocação dos 12 milhões de desempregados hoje existentes e a empregabilidade das novas gerações, o que também ameaça diretamente o sistema da Previdência Social.
Alguns segmentos da manufatura têm conseguido, neste início de 2017, responder à difícil situação do mercado de trabalho. É o caso da indústria têxtil e de confecção, que contratou 6.503 pessoas em janeiro último, depois de ter perdido 135 mil postos formais nos últimos dois anos. No entanto, os números do desemprego seguem aumentando na economia brasileira. Portanto, é preciso estimular a criação de vagas. A flexibilização do marco legal, em paralelo à retomada do crescimento, contribuiria para isso. Assim, é urgente a modernização das relações trabalhistas. Não há como ingressarmos num fluxo de crescimento sustentado carregando o peso da obsoleta CLT. Hoje, o Estado precisa interferir menos na relação entre empresas e seus colaboradores e reter parcela menor do valor do trabalho, de modo que os assalariados tenham rendimento líquido maior, com real expectativa de manutenção dos empregos, e as empresas, custos mais competitivos.
Por isso, entendemos ser importante o Projeto de Lei 6.787/2016, proposto pelo Poder Executivo e em tramitação na Câmara dos Deputados. Não se trata de precarizar as relações trabalhistas e reduzir salários. Ao contrário, o propósito é valorizá-los. O aspecto mais relevante da proposta é a liberdade a empregadores e trabalhadores de negociar, de modo soberano, 13 itens da antiga CLT. Tudo isso, sem revogar direitos ou violar a Constituição. Sim, pois a medida não é impositiva e não extingue as leis atuais. Porém, faculta às partes a prerrogativa inalienável de estabelecer um acordo condizente com a realidade produtiva e econômica de cada setor ou segmento de atividade, que, em sendo celebrado, sobrepõe-se à legislação, inclusive para efeito de julgamento em eventuais ações judiciais.
Trata-se de mudança fundamental. Nesse sentido, devem ser valorizadas as convenções e acordos coletivos, consagrando-os como norma prevalente, ao invés de continuar submetendo trabalhadores e empresas, sem alternativas, somente à imposição genérica do Estado, com base em lei que já não atende plenamente às especificidades e complexidades do trabalho no Século XXI. Tal avanço também reduziria a quantidade de processos na Justiça do Trabalho, nos quais o Brasil é o campeão mundial.
A excessiva judicialização do relacionamento entre contratantes e contratados gera custos bastante elevados para as empresas e permanente insegurança jurídica. Ônus desnecessários, pois não procedem as alegações de hipossuficiência dos trabalhadores ante a força do capital, da intolerância e da incapacidade de negociação. Isso é discurso do século retrasado. No Brasil, em 2016, foram celebrados mais de 40 mil acordos e convenções coletivas. Temos no País cerca de 15 mil sindicatos laborais e patronais. Há, entre eles, maturidade e respeito mútuo para negociações construtivas. Ademais, as entidades dispõem de estrutura, conhecimento, experiência e dados específicos do setor do qual participam para promover o diálogo e o entendimento.
Assim, a aprovação do Projeto de Lei 6.787/2016 significaria imenso avanço. A interação entre empregados e empregadores precisa inserir-se no permanente processo evolutivo de uma era na qual há cada vez mais novas formas de trabalhar, incluindo as atividades remotas, que não exigem a presença física dos profissionais nas sedes das organizações às quais prestam serviços. É necessário substituir gastos com ações judiciais por investimentos nas pessoas, máquinas e equipamentos, de modo a aumentarmos a produtividade e a competitividade das empresas e do Brasil. Para isso, contribuiriam acordos customizados, conforme as necessidades e peculiaridades de cada setor. Sobretudo, criar empregos precisa, com urgência, deixar de ser uma atividade de risco em nosso país.