A culpa não é da cegonha

 

O assunto preservativo voltou a ser debatido animadamente por clérigos católicos, celibatários, por ocasião de um novo livro do papa Bento 16. Tais clérigos, contrários ao mínimo sinal de abertura enviado por Bento 16, são tout court contra o preservativo e a favor dos métodos “naturais”.
Conheci vários casais católicos que tiveram seus casamentos quase arruinados por terem usado esses tais de métodos “naturais”, que são ótimos, mas para engravidar. Filhos e mais filhos não planejados. Mulheres com medo de se relacionarem sexualmente com seus maridos, inseguras, temendo outra gravidez não planejada. Do ponto de vista do planejamento generoso e responsável, os métodos “naturais” estão mais para propaganda enganosa, com odor de jansenismo.
 
Há clérigos católicos, celibatários, que gostam muito de debater sobre coisas de casados. Escolhem o tema em suas teses e dissertações. Mas aquilo que para eles é mera metafísica, número de filhos, para os casados é uma questão vital, concreta: ter 2 ou 7 filhos não é a mesma coisa. Aliás, cabe notar que persiste em partes da igreja católica o velho clericalismo pré-conciliar, até mesmo em temas particularmente laicais. Clérigos supostamente iluminados, falando para auditórios vazios…
 
Há casais católicos que, mesmo sendo professores de métodos “naturais”, tiveram vários filhos não planejados e, depois, passaram, por justo desespero, para vasectomia e laqueadura. Passaram de um extremo ao outro. Outros usuários de métodos “naturais” colocam a culpa em Deus pelos filhos não planejados. Para eles, a culpa não seria dos métodos “naturais”, mas de si mesmos, como se eles fossem tarados por sexo, ou, então, a culpa seria da “vontade de Deus”, como se eles não fossem seres humanos responsáveis.
 
A orientação moral da igreja católica referente à paternidade e maternidade responsável é, em minha opinião, correta. Sexo dentro do casamento, união e procriação, generosidade, mas com responsabilidade, prática. O problema é que, ao abençoar esses tais métodos chamados de “naturais”, a igreja católica termina por promover a irresponsabilidade, ou seja, a negação prática da moral da paternidade e maternidade responsáveis que ela defende em teoria. Ou termina por promover, mesmo se involuntariamente, o adultério, pela negação prática da recomendação paulina: “… é melhor casar-se do que ficar abrasado” (1 Coríntios 7, 9).
 
Talvez os métodos “naturais” deixarão de ser os métodos oficiais da igreja católica somente quando o celibato não for mais obrigatório para seus sacerdotes.
 
Assim, sem lugar para colocar mais filhos dentro das casas paroquiais, e tendo de aumentar o valor do dízimo para aumentar o salário dos padres pais de 7 filhos não planejados, o tema será debatido novamente, mas não como questão metafísica, e sim como questão de moral concreta, prática, cotidiana.
 
Gerar 7 filhos não é, claro, um problema, desde que seja resultado de planejamento, e não obra do acaso; desde que os geradores tenham condições de sustentá-los; e desde que eles não sejam católicos chineses.
 
Há quem diga que se os católicos fizerem menos filhos os muçulmanos dominarão o mundo. Bem, em primeiro lugar os muçulmanos são meus amigos, nossos amigos, e o islamismo é uma bela religião. Depois, eles também alugam ou compram apartamentos de um ou dois quartos, o que condiciona radicalmente a liberdade de procriação.