‘Posso afirmar que meu olhar para os profissionais de saúde mudou. Já havia respeito, mas não olhava como vocacionados’

Liliane Dias
Criciúma

 

Desde que o covid-19 entrou literalmente na vida das pessoas tudo precisou ser revisto, não apenas questões ligadas a saúde. A pandemia modificou toda uma estrutura ‘pré-desenhada’ nos mais diversos sentidos e significados. Mas sem dúvida, o que envolve a vida do ser humano, tem maior relevância (ou deveria), em todo esse processo.

Entre as mais diversas histórias, algumas sobressaem por proporcionar esperança e fé à toda uma população desacreditada em vários âmagos. A redação do Portal Notisul, esteve em contato com uma dessas pessoas que pôde, por meio do contato com coronavírus mostrar que tudo é possível quando se tem fé, esperança, família e amigos pedindo por sua recuperação.

Pedro Manoel da Silva, aos 65 anos, teve uma dessas experiências marcantes com o covid-19. Ao mesmo tempo em que vivenciou momentos difíceis, teve a oportunidade e por que não dizer, sensibilidade de resgatar e observar o que de benefício a experiência proporcionaria. Ele esteve internado no Hospital São José, em Criciúma, entre os dias de 24 de março e primeiro de abril. Desses, esteve seis dias na Unidade de Terapia Intensiva (UTI).

Após uma viagem sonhada e planejada com a esposa, Pedro teve os primeiros sintomas que demostravam semelhança com dos de pacientes de covid-19. Eles saíram dia 7 de março e retornaram dia 15. Enquanto retornavam da viagem perceberam que haviam pessoas espirrando, com problema que pareciam respiratórios. “Também não estava me sentindo muito legal”, relembra o aposentado.

No dia seguinte da chegada (16), buscou atendimento emergencial. Ele já estava com tosse, dor no corpo e dor de cabeça. Foi medicado e liberado, mesmo não estando muito disposto, permaneceu com tratamento em casa. “Lá me receitaram o tamiflu e como estava com 38,5 de febre, fizeram baixar, me deram um soro e me mandaram para casa”, detalha.

Pedro ficou uma semana em casa, mas ainda sentindo os efeitos do covid-19. Em sua residência, além da esposa Rosane, de 60 anos, reside a filha mais nova do casal, Eduarda, de 25 anos. Como o pai, a jovem possui comorbidades. Por conta do contato, Eduarda começou a apresentar os sintomas. “A Eduarda tem problema respiratório, mas ficamos na dúvida, se eu peguei e ela pegou também, já a Zane não teve sintoma nenhum até hoje”, pontua.

Mesmo fraco, Pedro levou a filha para a triagem do Hospital São José. Na chegada foi questionado sobre sintomas. O atendente recomendou que entrasse também para efetuar a avaliação. “Resultado, a hora que o médico botou o aparelho no pulmão já disse que estava feio. Que iria me encaminhar para o isolamento, por conta da viagem era um sério candidato a ter o ‘corona’. Minha filha foi para o isolamento em um quarto e eu fiquei no outro”, relembra.

No dia seguinte, após ambos efetuarem exames, a jovem foi liberada para fazer o isolamento em casa. Já o aposentado permaneceu no hospital. “Os exames acusaram problemas no pulmão, fígado, e outras áreas. Me disseram que estava com todos os sintomas do covid e que seria encaminhado para a UTI para ser melhor acompanhado dado meu quadro”, explica.

Naquele momento, ele conta que, apenas pediu para fazer uma ligação, pois precisava avisar a esposa. “Liguei para a Rosane e disse que estava indo para a UTI, que estava bem para ela não se preocupar. Coisa difícil de dizer, mas necessário, foi preciso dar força. Na mesma hora já tirei toda a roupa, deixei o celular e lá fui”, emociona-se.

Pedro conta que o período na UTI foi muito difícil. “Em determinado momento sei que fiquei com pouca respiração. Tiveram que colocar máscara e a médica me perguntou sobre a cloroquina, o que achava. Então pedi a opinião dela. Neste momento ela disse que faria uso na minha situação. Assinei um termo de responsabilidade e tomei a cloroquina mais azitromicina e mais um monte de remédios pesados. Graças a Deus deu tudo certo”, comemora.

O aposentado lembra que foi um período muito difícil. “Não é fácil, passei por alucinações e lutava contra o nada. Não fui entubado, mas foram momentos muito difíceis. Ficava sempre uma enfermeira ali, quase que direto. Depois tiraram a máscara, colocaram outro oxigênio. Assim, verificaram a possibilidade de me liberar para o quarto. Mesmo permanecendo isolado já foi um alivio”, relata.

 

Datas e resultados

A saída para o Cruzeiro ocorreu dia 7, no dia 8, embarcaram para o Porto de Santos. O retorno da viagem ocorreu no dia 14, novamente no Porto de Santos. “Entramos no ônibus e chegamos em casa dia 15. Dia 16 a tarde já estava em no atendimento emergencial”, cita.

Medicado, o aposentado permaneceu em casa até dia 24, quando levou a filha para a triagem. Ficaram uma noite no isolamento e no dia 25, ele foi encaminhado para a UTI. Dia 30 teve alta da Unidade e retornou para a enfermagem. A alta definitiva ocorreu no dia primeiro de abril.

O primeiro resultado do exame o idoso afirma que veio negativo. Mas um segundo teste foi realizado e neste foi positivo. “Fiz novamente o exame e confirmou que estive infectado pelo coronavírus, mas graças a Deus hoje estou imune”, celebra.

 

Agilidade

Uma das ações mais marcantes para o aposentado, foi a postura que adotou mesmo sem o diagnóstico confirmado. “Eles não esperaram o resultado do covid, eles fizeram os exames de pulmão, de sangue, deu o mesmo da doença e já trataram como covid. Isso foi a minha sorte”, afirma.

Para ele, caso tivessem demorado mais para entrar com o medicamento adequado o quadro poderia ter agravado. “Muitas pessoas da nossa turma tiveram covid também, mas talvez tenha sido mais tarde, um, inclusive chegou a falecer, já minha esposa não apresentou sintoma algum”, observa.

 

Momentos marcantes

Pedro conta que nos últimos dois dias de internação, autorizaram o contato com a família por meio de videoconferência, com um tablet. “Por mais que tenham contato com os médicos todos os dias, quando você está na UTI não sabe direito o que a família está pensando. Além disso, o fato de estar muito debilitado e fraco abala emocionalmente”, reflete.

Ele conta que gestos que para muitos parecem ‘bobos’, foram fundamentais para que os dias fossem menos difíceis. “As enfermeiras todos os dias quando chegavam de manhã, faziam aquele coraçãozinho com a mão, escreviam coisas, colocavam incentivos no vidro, faziam caretas, riam, levantavam o nosso astral, isso foi muito bacana”, assegura.

Outra situação que marcou para o aposentado foi no momento em que tiraram o oxigênio e colocaram a máscara. “Ao colocar a máscara, como eu já estava há três dias com problemas, ela cresceu mais ainda. A enfermeira veio e perguntou se tinha em meus pertences algo que pudesse fazer a barba. Ela fez a minha barba ali, um gesto de carinho, de vocação. Coisas desse tipo não se vê todos os dias”, orgulha-se.

É importante ressaltar que a pessoa que se encontra ali, sensível, um gesto de carinho, um gesto de amor faz toda a diferença. “Posso afirmar que meu olhar para os profissionais de saúde mudou. Já havia respeito, mas não olhava como vocacionados. Hoje olho para um profissional de saúde com diferença, até pelo que vivenciei”, pontua.

 

A força da oração

“Acredito sim que houve um milagre”, afirma Pedro. Ele explica que todas as ações, ocorreram para que ele estivesse no local certo e na hora certa. “Todas as ações, desde o momento em que o hospital não esperou o resultado, para começar a tratar como coronavírus. Porque uma ‘vacilada’ já era. A mão de Deus está em todo o lugar”, reforça.

Para ele, aos que creem em tudo é possível ver a mão de Deus. Membro atuante por muitos anos da Renovação Carismática Católica e com parentes também ligados, vários pedidos de oração pela saúde de Pedro ocorreram em todo o Estado.

“A renovação aqui da diocese de Criciúma postou pedido de oração a nível diocesano. A vice coordenadora da RCC Nacional, que é daqui também postou pedido de oração para o Brasil inteiro. Então foi um exército de pessoas rezando. Inclusive por ter sido coordenador estadual da RCC, também já conhecia muitas pessoas de fé”, acrescenta.

“Mas foi isso mesmo, fui na hora certa e nem foi por mim, porque já estava para baixo, fui mais para levar a Eduarda, mas o médico me perguntou… ‘e o senhor não tem nada? ’. Falei que estive em viagem e já me mandaram entrar no local”, conta.

 

Aprendizado

Em toda essa experiência, Pedro afirma que foi possível tirar um grande aprendizado. “Além da fé, ele explica que se aprende muito sobre a importância da família e de todo amor envolvido. Jamais deixar de ter fé em Deus e sempre encarar o problema. Não deixe para amanhã as coisas que podem ser feitas hoje, se você está com algum problema, resolva. Procure o médico. E no final seja grato a Deus por ter passado por tudo aquilo e hoje poder contar a sua história”, finaliza.