“É preciso incentivar os cursos técnicos dentro do ensino médio”

Expedito Michels, 50 anos, é casado, tem um filho e uma filha. É o fundador da Faculdade de Capivari de Baixo (Fucap), onde atua como diretor geral. Natural de São Martinho, foi criado em Imaruí, na comunidade de Ponta Grossa, dos 3 aos 13 anos. Sem irmãos ou primos, Expedito brinca com o fato de ter sido neto único. “Meu avô inclusive não me deixou ir ao seminário porque isso acabaria com a raça dele”, conta, aos risos. É formado como tecnólogo em agropecuária, profissão que exerceu durante 15 anos. Hoje, é formado em administração, pós-graduado em economia e mestre em gestão universitária pela Universidade Federal de Santa Catarina. Também atua como presidente do Lions Clube de Capivari de Baixo, da Associação Comercial Industrial e também da Associação das Mantenedoras Particulares de Santa Catarina. Arriscou tudo o que tinha aos 37 anos, quando, desempregado, decidiu investir a herança da família na criação da Fucap, e hoje considera-se um empreendedor realizado.
 
 
Fernando Silva
Tubarão
 
Notisul – Como foi a sua trajetória até fundar a Faculdade de Capivari?
Expedito – Trabalhei na Souza Cruz e trabalhei também em quatro instituições de ensino antes de fundar a faculdade. Essa fundação se deu a partir da LDB, da oportunidade que a lei abriu, e ali fomos buscando agregar, pessoas, políticos, amigos, que foram comungando dessa ideia, porque, a princípio, parecia um pouco estranha, já que na verdade, desde que o Brasil foi descoberto, nós só tínhamos a Acafe, a Federal e a Estadual. Então, o sistema federal de ensino não tinha atingido Santa Catarina. E a partir da regulamentação da LDB, em 1998, o estado recebeu 80 instituições particulares de ensino superior – o grande foco foi a partir de 2000. Mas, para o Ministério da Educação, a Acafe também são tidas como tratadas particulares de ensino, embora se dizem comunitárias, mas juridicamente são particulares. 
 
Notisul – O que o senhor fazia quando criou a Fucap?
Expedito – Na época, eu não estava trabalhando, estava desempregado, e eu fiz um acordo com a família, de forma que a minha esposa ficou responsável em cuidar dos filhos, enquanto eu fiquei responsável por arriscar toda a herança que a família tinha. Mas deu certo, pela persistência e pela credibilidade. A comunidade, quando acredita naquilo que você propõe, e começa a visualizar as possibilidades, fica mais fácil. Ninguém faz nada sozinho. Tem gente que diz que quando se tem um empreendimento você não diz para ninguém. Quando eu fundei a Fucap, eu não segui essa regra. O próprio empreendedor tem que avaliar isso, porque o segredo, às vezes, te impede de buscar parcerias, então, é algo a ser pensado em termos técnicos com mais seriedade.
 
Notisul – Hoje, quantos alunos a Fucap atende?
Expedito – No ensino presencial, temos algo em torno de 700 e, com os novos cursos, devemos chegar a mil. Com a pós-graduação, já devemos estar na casa de 1,5 mil. O ensino à distância já nos dá 2,5 mil alunos. Então, hoje temos uns quatro mil alunos ativos e formados mais de 30 mil alunos, e uns dez mil em cursos de extensão. São números significativos, a nossa participação é grande, em todo o estado de Santa Catarina, em especial na Amurel. O que não temos em ensino presencial hoje procuramos parcerias para atender.
 
Notisul – E como é hoje para abrir uma instituição de ensino? É complicado? O MEC exige muita coisa?
Expedito – É muito difícil. Hoje, o MEC quer qualidade nos que já existem. O ministro está priorizando qualidade no sistema federal, na Acafe e no sistema particular. Federal que me refiro é tanto o setor público quanto o setor privado no qual estamos inclusos. Então, hoje, para iniciar uma instituição nova, é complicado, tanto pelos aspectos de concorrência, pelo mercado, já que o capital estrangeiro atingiu vários grupos educacionais no país. Esse capital fez instituições muito grandes, e se fundindo. Tínhamos previsões de que as pequenas seriam compradas pelas grandes, mas isso não aconteceu. Hoje, os grandes compram os grandes para ficar maiores e os pequenos cumprem com a sua missão de levar qualidade para o interior do estado com características próprias, como tem a Ampesc, ABMS e tantas instituições do ensino particular que são menores. 
 
Notisul – Hoje, que áreas de pós-graduação estão mais voltadas para necessidades do país?
Expedito – Nós temos hoje uma pós-graduação de transportes multimodal para o porto de Imbituba. Para integrar os transportes rodoviário, ferroviário e marítimo. O Brasil entrou em um caos na questão dos transportes e necessita de uma política de melhorias nas redes ferroviárias e naval. As políticas públicas do governo federal já apontam nesse sentido. Portos e ferrovias são discussões constantes na câmara dos deputados, e o governo federal vai mudar a legislação, a exploração, a operacionalização dos portos brasileiros vai sofrer mudanças radicais para se preparar para o futuro do país, que passa pela competitividade e alta produção. Portanto, nós precisamos transportar grandes volumes de estoques do interior do país para o litoral, onde estão os portos, ligando todo mundo. Da mesma forma pela ferrovia. Sei que em breve, além da ferrovia de Imbituba até Jaraguá do Sul, em um segundo momento teremos uma ferrovia que vem de Itajaí, até Dionísio Cerqueira, ligando com a Argentina e com o Pacífico. Então, cabe às instituições de ensino, junto com as associações industriais, os deputados e o governo, unirem-se em pró desses projetos para dar resposta ao desenvolvimento da nação.
 
Notisul – Como está a situação do Enem hoje?
Expedito – Bateram um recorde de inscrições. Porque o Enem é a porta para o sistema federal atingir Tubarão, Capivari e toda a Amurel. O governo federal não tem instituições federais aqui na região. Mas o governo federal, com as suas políticas públicas atente a comunidade cedendo bolsas de estudos para os alunos na região estudarem no sistema federal privado. É uma forma do governo atender a sociedade. Quando o governo não tem instituições próprias na região passa a ter sim as bolsas do ProUni, que se conquista pelo Enem. Daí tamanha demanda para os alunos e as pessoas interessadas no ensino superior fazerem o Enem, e é por isso. Para participarem das bolsas de 50% ou 100% do sistema federal de ensino que, na nossa região, é representada pela Faculdade de Capivari.
 
Notisul – Em outros anos teve vazamento do gabarito de provas do Enem. Na sua visão, isso diminui a credibilidade do Enem?
Expedito – Erros de  pessoas despreparadas que às vezes são contratadas. Isso acontece com nós mesmos e, principalmente, pelo governo. Eu entendo que foi  fraqueza de pessoas que às vezes arranham o sistema, mas não tenho dúvidas que o governo federal, junto com suas políticas e no caminho da busca por credibilidade, resolva a situação imediatamente. Não vejo como um problema, foi um episódio de fraqueza humana e que não pode continuar.
 
Notisul – A respeito do incentivo do governo com as bolsas de ensino, houve cortes?
Expedito – As bolsas são distribuídas pela quantidade de alunos que as instituições têm. No nosso caso, quando tivermos mil alunos, serão 200 bolsas. O governo federal tem uma fórmula enorme, mas é como se cerca de 20% dos alunos do ensino privado cursassem com bolsas do governo federal. O governo do estado também tem os artigos 170 e 171, como forma de incentivo da constituição estadual, e que vem cumprindo com as suas políticas e recursos, hora mais folgado, hora mais escasso – esse ano é escasso, mas esperamos que ano que vem os artigos atendam também a comunidade  estudantil do ensino superior. Agora, é importante ressaltar que nem todos os alunos conseguem as bolsas e, às vezes, nem todos têm o dinheiro para pagar, nem sempre a família consegue bancar os estudos. Mas é importante o financiamento pelo Fies. O aluno paga R$ 50,00 de juro a cada três meses. E pode pagar depois de formado. Quando se forma, tem 30 dias para liquidar tudo com 50% de desconto; se não, com suaves prestações à altura do seu bolso. 
 
Notisul – Hoje, o que é necessário para o aluno conseguir o Fies?
Expedito – Precisa fazer o Enem. Porque, se o aluno não participa das políticas públicas fazendo o Enem, ele não pode fazê-lo. A não ser que tenha se formado de 2000 para trás. Agora, quem se formou recentemente é obrigatório a fazer o Enem, e ter uma renda composta. Comprovar tudo certinho. Para dentro de certos limites, de cada comprovação,  e também tem que tirar boa nota no Enem. É importante que o jovem, lá no segundo ano do ensino médio, se esforce. Façam cursos técnicos durante o ensino médio.
 
Notisul – Em sua opinião, o curso técnico é uma vantagem para o aluno do ensino médio?
Expedito – Sim. Veja bem, os cursos técnicos deveriam ser feitos na faixa dos 14 aos 18 anos. Passou dos 18 anos, deveria ser proibido. Porque se mede a educação de um país pela quantidade de jovens de 18 a 24 anos na faculdade. Os organismos internacionais, e o próprio MEC, o Plano Nacional de Educação (PNE), todos eles consideram a idade ideal na faculdade de 18 a 24 anos. Eu fico muito triste quando vejo jovens nessa faixa etária fazendo curso técnico. Eles não fazem isso por falta de orientação e informação. O culpado sou eu mesmo, por não ter dito isso antes. Não é culpa nem do pai e nem da mamãe. É a própria estrutura social de levar a informação para a família. Esse é o grande problema. 
 
Notisul – Falando em ensino médio, nas últimas semanas todos acompanharam a luta de professores e alunos para evitar que o governo junte turmas. Como o senhor avalia essa questão?
Expedito – Na minha opinião, o governo deve realmente juntar as turmas. Quando estudei, eram turmas grandes. O MEC, quando autoriza vaga nas escolas, é para turmas de 50 e mais 10% para o ProUni. Não tem nenhum problema. Olha, na minha época, no terceirão e pré-vestibular, as aulas eram feitas em turmas de mais de 200. E era um pré-vestibular concorridíssimo, e eu aprendi. Então por que só se aprende com 25 alunos, se eu fui um dos muitos que aprenderam com 200 colegas? Na missa, o padre ensina com 200, 300 pessoas dentro da igreja, e eles aprendem. Então, o governo deve unir as turmas, para economizar professores, para que esses professores ensinem cursos técnicos. Não adianta termos muitos professores ensinando poucas matérias. Vamos pegar esses mesmos professores colocar 70% para a educação geral e os outros 30% treinar, fazer os cursos técnicos dentro dos próprios colégios estaduais. Claro, os professores estão corretos ao defender seus empregos, porque não têm ainda segurança do que o governo vai fazer. É bom ponderar isso para não me entenderem mal, mas esta é a realidade. 
 
Notisul – Como o senhor avalia a questão do governo federal importar médicos de Cuba, e dar a especialização necessária para atuarem no país?
Expedito – Esse assunto tem duas saídas. Primeiro, sabemos que faltam no país engenheiros e médicos. É o que mais falta no Brasil. Existem muitas áreas que não têm médicos, ou tem falta deles. Então, para atender a sociedade, você cria mais escolas de medicina, ou importa médicos. Os conselhos profissionais de direito e medicina tiveram restrições para a abertura de novos cursos. Portanto, se não dá para criar e formar mais médicos aqui, o governo importa para atender a necessidade da população. E a sociedade precisa de bons profissionais. Portanto, eles precisam das especializações para atender melhor as pessoas. Eu sou a favor. É mais gente cuidado da vida do brasileiro. Mas o ideal seria o governo abrir, sim, novas escolas, ou dar mais oportunidades das escolas existentes de formar mais profissionais.
 
Notisul – Em outros estados, a situação é semelhante?
Expedito – A política que coloco de PNE é federal, mas nos outros estados o brasileiro ainda tem dificuldade de fazer cursos técnicos nessa faixa etária do ensino médio. Não é algo exclusivo de Santa Catarina. É um problema nacional.  
 
Notisul – Você considera-se um homem de sucesso?
Expedito – No meu ver, o Expedito é um empresário, pobre, mas de uma empresa estruturada. Às vezes, temos empresários, ricos, com a empresa com dificuldade. Aqui não é assim, nós reinvestimos todo o resultado no crescimento e a manutenção da atividade, consciente de que tudo isso não cabe no meu caixão quando eu morrer, e que ficará sempre à disposição da comunidade. O ser humano é passageiro, mas a instituição de educação precisar ser estruturada para ser perene. Tem que durar. Foi feita desde a sua fundação desta forma. Eu confesso que a Fucap cresceu em um ritmo correto. Porque, se cresce muito rápido, fica mole como um broto de bambu; se cresce muito lento, não atende às necessidades sociais. Então, a Fucap foi crescendo e solidificando a cada passo que deu. Isso que nos deu credibilidade. Não está nem mais nem menos do que foi planejada.
 
Expedito por Expedito
Deus – Tudo. Vida e vontade de fazer e criar
Família – É a base para tudo.
Trabalho – Não é castigo.
Passado – Uma referência.
Presente – É um presente de Deus, uma oportunidade.
Futuro – A Deus pertence, mas vence quem se prepara para ele.
 
"Os cursos técnicos têm que atingir e buscar os jovens dos 14 aos 18 anos. Depois disso, os estudantes têm 
que entrar em um curso superior”.
 
“Falta ao governo dar as condições, de, durante o ensino médio, o aluno ter a possibilidade de se capacitar profissionalmente como tecnólogo”.