Laércio Menegaz Júnior: “O atual modelo eleitoral é um estímulo à corrupção”

Consultor político credenciado pela Associação Brasileira de Consultores Políticos do Brasil (Abcop), o tubaronense Laércio Menegaz Júnior atuou na coordenação de várias campanhas eleitorais no estado, para vereador, prefeito, deputado estadual e federal, e também de algumas cooperativas. Participou também do mandato do então deputado Joares Ponticelli (PP) na Assembleia Legislativa e do deputado federal Jorge Boeira (PP), em Brasília. Desenvolveu atividades nas áreas de coordenação e operacionalização, consultoria de marketing, planejamento estratégico, análise de pesquisas, seminários e eventos. Acompanhou a delegação brasileira no Seminário em Washington, durante a eleição presidencial americana em 2012, na Argentina em 2011 e, neste ano, ampliou sua experiência na Angola, viagem da qual acabou de retornar.

Priscila Loch
Tubarão

 

Notisul – Você acabou de retornar da Angola, onde desde o início de junho prestou consultoria visando às eleições que ocorrem em agosto. Na prática, como foi esse trabalho?
Laércio – Foi especial demais. Uma experiência incrível. Foi minha terceira eleição presidencial internacional, porém, a primeira na qual tive a oportunidade de trabalhar. Estive em Buenos Aires, em 2011, e participei da eleição argentina. Depois veio a eleição americana, em 2012, e agora as eleições em Angola. Trago na bagagem muito aprendizado, muita experiência. Foi uma participação pequena, contudo, marcante na minha vida. Pude conhecer toda a história da Angola e de boa parte da África. Na prática, fazíamos o treinamento dos cabos eleitorais partidários, levando a mensagem e o conceito da campanha em cinco províncias de Angola. Preparávamos a militança, fazíamos palestras e análise de algumas pesquisas nos estados/províncias.

Notisul – Como funciona a eleição por lá?
Laércio – A Constituição angolana, aprovada em 2010, prevê a realização de eleições gerais a cada cinco anos, elegendo 130 deputados pelo círculo nacional e mais cinco deputados pelas 18 províncias do país. Somados, são 90. Portanto, são 220 deputados no geral. A eleição funciona da seguinte maneira: é voto único. Cada partido apresenta sua lista. O cabeça de lista pelo círculo nacional do partido ou coligação de partidos mais votado é, automaticamente, eleito presidente da República e chefe do executivo, elegendo majoritariamente também sua lista de deputados. Os outros partidos elegem deputados mediante a proporção da sua votação. Os candidatos a deputado na lista geralmente são grandes lideranças regionais ou de segmentos (religiosos, esportivos, etc.).

Notisul – Foi tranquila a adaptação à cultura e à gastronomia de lá?
Laércio – Foi tranquila. Aproveitei minha ida para iniciar uma dieta. Comi bastante peixe, frango e salada. A comida é boa, com bastante influência portuguesa. Tem uns pratos típicos maravilhosos. Um chamado muamba, que é feito de pedaços de galinha com um molho que traz óleo de dendê, alho, abóbora, entre outros ingredientes. É muito gostoso. O povo também expressa sua cultura de maneira muito forte. Os trajes típicos da Angola são aqueles bem coloridos, cheios de vida, – gostam de acessórios grandes, como brincos e colares, que chamem a atenção. Os homens usam calças coloridas e um tipo de bata, e são muito educados.

Notisul – E com relação às eleições dos Estados Unidos, há muitas diferenças?
Laércio – Muita diferença! Para mim, pessoalmente, e também eleitoral. Nos Estados Unidos, eu fiquei dentro da universidade para estudar. Nessa ida à África, foi a trabalho. Além disso, não dá para comparar uma democracia forte e consolidada como a dos EUA, com a Angola. Angola só teve dois presidentes em toda sua história. Teve uma guerra civil que durou de 1975 até 2002. O país sofreu muito com a guerra civil. Desde o fim da guerra civil, em 2002, a Angola conheceu a paz, e agora traça o caminho do desenvolvimento, na tentativa de se estabilizar economicamente.

Notisul – Mesmo que seja por um curto período, qual a importância desse trabalho para o seu currículo?
Laércio – Foi diferente porque nunca tinha trabalhado como consultor. Sempre me envolvi como militante e com candidatos apenas do PP, misturando a liderança política com conhecimentos técnicos. Lá, eu era apenas consultor, um observador. Falo sempre para minha esposa Kércia e para os mais próximos que eu não tenho ex-partido, não tenho ex-amigos e não tenho ex-mulher – espero que a Kércia não me mande embora (gargalhadas). Mas, brincadeiras à parte, é uma coisa que eu preciso me acostumar: votar cada vez mais em pessoas e projetos do que em partidos. Infelizmente, nosso sistema eleitoral no Brasil é atrasado, viciado e tem maculado a democracia. Precisamos da reforma política. O PP em Tubarão e em Santa Catarina dá orgulho, porém, alguns nomes nacionais acabam com tudo. Todos os partidos têm os bons e os ruins.

Notisul – Há algum momento marcante da viagem que mereça destaque?
Laércio – Dois momentos me marcaram muito. A alegria daquele povo, desde o momento que cheguei em Luanda, foi um deles. Mesmo enfrentando vários problemas, eles têm prazer de viver. Um momento que me marcou negativamente foi quando um jornalista português me perguntou no hotel se eu não tinha vergonha de ajudar um governo corrupto e de compadres. Expliquei a ele que não estava ali por convicção ou abraçando uma causa, e sim prestando consultoria e um treinamento, de forma técnica. Ele não gostou muito, mas, mesmo assim, passou a me tratar melhor. Quando via pessoas passando necessidades, as dificuldades diárias daquele povo, refletia e pedia perdão a Deus por às vezes reclamar da vida. Quando cheguei em casa, tive uma sensação de dever cumprido. Na vida, sempre procuramos nos sentir seguros, porém, de vez em quando encaramos desafios novos. Dá um gosto de “vida” na boca e traz novas motivações. Além da experiência profissional, te garanto que volto um ser humano melhor.

Notisul – Quantos eleitores têm e quem deve ganhar a eleição?
Laércio – A Angola contará com mais de nove milhões de eleitores e seis candidatos a presidentes, com seus devidos deputados: MPLA (governista) e cinco frentes de oposição: o FNLA, Unita, CASA-CE, PRS e APN. Acredito na vitória do candidato governista João Lourenço, do MPLA. A estrutura de governo é forte, senti isso no dia a dia da campanha. Além disso, em que pese todas as dificuldades vividas pelos países da África, o atual governo consegue avançar. Existe uma significativa redução de despesas públicas e no ajuste no orçamento do país. A oposição terá dificuldades de vencer. Fica desproporcional a força e a organização. Uma vitória do governo é bem provável, mas também me disseram que Hillary Clinton ganharia as presidenciais nos EUA (risos). Gostei muito da plataforma de trabalho do Unita. Um projeto chamado “Angola 2030” prevê um desenvolvimento sustentável em longo prazo para o país com renda, trabalho. O MPL e o Unita são como Grêmio e Inter no futebol. Aliás, toda guerra civil de 75 a 2002, na Angola, teve os dois partidos como protagonistas. Também destaque é o partido  CASA-CE, tendo como candidato a presidente Abel Chivu. Ele apresentou um caderno de metas, elencando 20 motivos para mudanças no país. Documento também interessante.

Notisul – Você acredita que o processo eleitoral de é democrático? 
Laércio – Me pareceu que sim. Evidente que vi muito pouco para afirmar isso com precisão. Existiam muitos observadores internacionais lá. Acredito que o governo de Angola vai querer mostrar transparência, organização e lisura. O processo democrático reto é fundamental para o desenvolvimento e também no relacionamento com outros países. Mas é evidente que o Estado tem a capacidade de controlar a eleição.

Notisul – Com o retorno para Tubarão, você volta à chefia de gabinete da prefeitura?
Laércio – Não sei o que o prefeito pensa a respeito disso. Ainda não deu tempo de conversarmos e eu cheguei e ele está em São Paulo (a entrevista foi feita quinta-feira). Estou à disposição para ajudá-lo e ajudar o governo, da melhor maneira possível. Vou conversar com o prefeito na semana que vem e retornar aos trabalhos dia 30 de maio. Foi isso que conversarmos, rapidamente, por telefone. Estou nesse projeto por convicção, porque acredito no prefeito Joares e na equipe qualificada que ele montou.

Notisul – Falando do cargo de chefe de gabinete, como foram os cinco primeiros meses de governo?
Laércio – A cidade estava destruída. Joares Ponticelli encarou o maior desafio da sua vida. Uma prefeitura com dívidas, que passam de R$ 200 milhões, estrutura física, como postos de saúde e escolas caindo, servidor público desmotivado, desrespeitado… E o pior: não existia um caminho a ser seguido, um planejamento. Penso que o Projeto Tubarão 180º conseguiu criar um conceito, um planejamento de desenvolvimento sustentável para nossa cidade. Digo sempre que quem planeja tem futuro, quem não planeja tem destino. Afinal, para quem não sabe para onde ir, qualquer vento serve. O prefeito é muito trabalhador, está buscando recursos financeiros para nossa cidade, em Florianópolis e Brasília. Está fazendo uma gestão de enfrentamento de problemas históricos, como a sede, cortando cargos, gerando economia. A cobrança da população vai aumentar com o passar do tempo e penso que o desafio agora é arrumar recursos financeiros para executar com eficiência aquilo que foi planejado pelo prefeito e secretários.

Notisul – Você é um dos nomes cogitados para candidato a deputado estadual pelo PP. Ao mesmo tempo, é visto como essencial em uma campanha, em decorrência da sua capacidade e experiência em articulação política. Como você avalia essa situação?
Laércio – Meu nome continua à disposição do partido, porém, tenho me dedicado muito ao governo municipal. Acho que eu e o Deka May temos menos possibilidade, porque estamos de cabeça, ajudando o prefeito no dia a dia da cidade. Enquanto isso, Pepê Collaço e Gelson Bento estão trabalhando muito. Fico sabendo sempre do trabalho de ambos, em vários bairros da nossa cidade e em outros municípios da região. São nomes que nos orgulham. Pepê faz uma gestão como presidente de uma câmara moderna e a mais econômica de Santa Catarina, e o vereador Gelson Bento faz uma gestão elogiada e premiada, nacionalmente, frente à Cergal. Este é um problema bom para o partido resolver, afinal, que sigla não quer quatro nomes assim para fazer Tubarão voltar a ter um deputado? Qualquer que seja o candidato, caminharei junto e dentro do time. O eleitor precisa votar em gente daqui, de Tubarão e região, independente dos partidos que pertencem. Ter representação política é fundamental para nos desenvolvermos.

Notisul – Como você avalia o atual momento do país e qual a expectativa para as eleições de 2018?
Laércio – O Brasil dava sinais de melhoras na economia este ano. Porém, com as novas delações da JBS, o país mergulhou novamente num momento caótico. Mas vai superar, tenho certeza disso. Para 2018, quando teremos eleição, precisamos urgente de uma reforma política. O nosso atual modelo eleitoral brasileiro é um estímulo à corrupção. Temos 35 partidos. A maioria criada para receber dinheiro público do fundo partidário. Na eleição, vendem seus tempos de televisão e rádio, e fazem coligações nas proporcionais. O velho modelo ainda não acabou e o novo não começou. Agora não sei qual será a nova democracia. Será sem partidos? Serão as redes sociais? Serão candidaturas avulsas? A reforma política precisa ser feita urgente. E espero que a população também possa estar atenta na hora de votar. Entre outras mudanças, no mínimo a redução de partidos e o fim das coligações já ajudariam bastante. O prazo do Congresso para essas mudanças é setembro, tendo validade para o próximo ano. Vamos acompanhar.

Notisul – A população pode fazer a sua parte…
Laércio – No meu entender, existem três maneiras. Primeiro, acompanhando o mandato, fiscalizando, utilizando com responsabilidade as redes sociais. Segundo, exercendo o voto de maneira correta, justa e estudando os melhores candidatos e projetos. Tem gente séria envolvida com política sim e tem muita gente nova que precisa entrar. Se os bons não participarem, os ruins tomam conta. E, terceiro, exercer na prática boas ações no dia a dia. Não furar fila, não jogar xepa de cigarro na rua, não jogar o lixo na rua ou no rio de sua cidade, ajudar o próximo de alguma maneira, não dirigir de forma agressiva e irresponsável. Devemos cobrar a conduta de nossos políticos sim, cada vez mais. Eu concordo e incentivo. Porém, devemos fazer a nossa parte também, não podemos apenas terceirizar a ética. A Lava-Jato começa por cima, mas deve levar todos nós, cidadãos, a uma reflexão. Afinal, como diz o ditado popular, o uso do cachimbo faz a boca ficar torta.