“De novo o Hulk?”, pensei, ao ler na página de cinema do Notisul que ele estava em cartaz. O Hulk de alguns anos atrás foi uma lástima e até imaginei que ele tivesse voltado em 2008. Porém, quando fui ao Farol Shopping (não é publicidade oculta) para dar uma olhada nas novidades da livraria Nobel (não é merchandising), notei o nome de Edward Norton no cartaz que anunciava o filme. Ora, Edward Norton é um daqueles atores que me levam ao cinema independentemente do título do filme.
Se ele era o Hulk, então estava decidido: ao Hulk iria, mesmo não simpatizando com o homenzinho verde.
O Hulk do Edward Norton não decepcionou: filme belíssimo, com enredo interessante e ótimas interpretações. E até pela favela da Rocinha, o Hulk do Norton passou, coisa para lá de surreal, estilo Federico Fellini.
Impressionante a semelhança entre o Hulk do Norton e o Homem de Ferro, outro belíssimo filme dessa temporada. Os dois não gostam do poder, mas se servem dele por razões de utilidade (e necessidade) pública.
No Homem de Ferro, um cientista-empresário, agora prisioneiro, ex-forte, agora fraco, preso numa masmorra, é obrigado a inventar uma arma para os seus algozes. Mas ele usa sua inteligência e conhecimentos para criar uma armadura de ferro que o proteja. O ex-forte, agora fraco, torna-se de novo forte. E usa a nova força que descobriu durante a fraqueza para combater a força (imoral) de antes, que ele mesmo criara quando cientista-empresário numa fábrica de armamentos.
Hulk também rejeita a força que criou e quer voltar a ser fraco, para ser normal.
Lembrei-me imediatamente de Paulo, aquele fariseu do Novo Testamento que perseguia os cristãos, e depois se converteu, tornando-se um dos discípulos mais apaixonados de Cristo.
Paulo ensinou várias vezes que os cristãos deveriam reconhecer as próprias fraquezas, as próprias fragilidades, mas não para continuarem fracos. A força da fraqueza: quando alguém admite a verdade, ou seja, a própria fraqueza, e dirige-se ao Pai, atrai a força de Deus, a força da graça de Deus. O fraco, em Deus, segundo Paulo, torna-se forte, moralmente forte, mesmo se perseguido, preso e assassinado. Mas são falsas derrotas, aparentes. A vida plena (já na cidade terrestre) é o destino definitivo dos fracos que se tornam fortes em Deus.
Os cristãos assemelham ao Hulk e Homem de Ferro: criaturas fracas, amantes da ética que, por reconhecerem humildemente a própria condição, encontram a possibilidade de serem fortes, mas não para si, para o serviço à comunidade.
Na ordem do saber, o erro precede o acerto; e, na ordem cristã do poder, o reconhecimento sincero da fraqueza precede a força. A fraqueza é humana. A força é divina, e dela participa somente quem reconhece humildemente tal verdade e quem faz de tudo para trocar a lei de Gérson (levar vantagem) pela lei de Deus (serviço público).
E qual a relação disso tudo com o antigo filme brasileiro (1977) de Hector Babenco onde Reginaldo Faria interpreta o bandido Lúcio Flávio, o passageiro da agonia? É que Lúcio Flávio talvez consiga expressar melhor (pela interpretação de Reginaldo Faria) nossa condição de criaturas assustadas e incapazes. Somos todos como Lúcio Flávio, passageiros da agonia, mas podemos mudar caso permitamos que a força da ética (Deus é ética) transforme a nossa vida moral (ou imoral).
Afinal, a força não está nos super-heróis das revistinhas em quadrinhos, mas, no coração poderoso de um carpinteiro simples, que viveu numa pequena e distante cidade chamada Nazaré.