Pai nega que menor seja mentor de massacre em Suzano: ‘Meu filho não participou’

O portão branco de pedestre passa despercebido na rua de intenso comércio no Jardim Imperador, em Suzano. Na casa encurralada pelas lojas, vive o organizador de eventos Wellington Luiz de Oliveira, de 46 anos. Ele é pai de quatro filhos, entre eles o adolescente de 17 anos, apreendido na terça-feira (19), acusado pela Polícia Civil de São Paulo de ser o mentor do massacre na Escola Estadual Raul Brasil.

A chacina ocorreu no último dia 13. Dez pessoas morreram, incluindo outro rapaz de 17 anos e um adulto de 25, que executaram o plano traçado em conjunto com o adolescente apreendido.

Com o filho detido há dois dias, Wellington resolver desabafar em um depoimento inédito. Em entrevista exclusiva ao Metrópoles, ele nega a participação do filho na chacina, reclama das acusações dos investigadores e confirma a amizade do menor com o atirador Guilherme Taucci, 17. Na conversa, que se estendeu por pouco mais de meia hora, o homem não se emocionou. Sereno, disse que o maior desejo é ver o primogênito em liberdade.

Dois irmãos do adolescente – uma menina de 15 anos e um menino de 12 – estudam na Raul Brasil. Foi um deles que avisou a família da tragédia no colégio: cinco estudantes e duas servidoras foram assassinados pelos dois ex-alunos que invadiram a escola e também morreram ali.

O celular tocou e minha menina avisou o que tinha rolado. Peguei o carro e a minha esposa e fomos para lá. Quando cheguei, vi os corpos no chão. Tinha acabado de acontecer. Só pensava em encontrar a minha filha”

Naquele momento, o organizador de eventos nem desconfiava que o menino que viu crescer na companhia de seu filho era um dos autores do massacre. “O Taucci vivia aqui em casa. A amizade entre eles é desde criança, estudaram juntos. Houve um momento de afastamento, por causa de uma garota, mas eles voltaram a se falar no ano passado”, revelou Wellington. “Quantas vezes eu levei o Taucci em casa porque havia ficado tarde e ele ainda estava aqui…”, completa. As casas dos atiradores, a de Wellington e a escola são próximas.

Para a Polícia Civil de São Paulo, a relação entre os jovens não era apenas amizade, mas sim, uma cumplicidade para o planejamento do ataque. Segundo as investigações, o filho de Wellington é um dos mentores intelectuais do crime e ajudou na compra do armamento usado na chacina. Ele é acusado de participação nos homicídios e está apreendido preventivamente por 45 dias. Na manhã do ataque, contudo, não esteve no colégio.

O pai do suspeito refuta qualquer participação do filho. “Ele ficou em choque, tremendo quando soube [do crime]. Não acreditava. Ele me falou que não está envolvido. Ele jamais imaginou que o amigo faria isso. Meu filho disse que Taucci fazia umas perguntas de terrorismo, mas que nunca teria coragem de fazer [um atentado]. Meu filho era o melhor amigo do Taucci, mas não participou”, garante.

Na última terça-feira (19/3), Wellington e sua esposa, Kelly, de 42 anos, participaram da audiência de apresentação do adolescente no Fórum de Suzano. Por recomendação do advogado de defesa do suspeito, Marcelo Feller, os três permaneceram em silêncio. “Tinha um pouco de esperança de sair de lá com meu filho”, admite. Era a segunda vez que a família estava ali. Na sexta-feira passada (15/3), o menor prestou depoimento por quase três horas e acabou liberado por falta de provas.

Wellington diz nunca ter ouvido os meninos conversando sobre o ataque. “Se eu soubesse, iria falar ao avô do Taucci [o aposentado Benedito Luiz Cardoso, de 57 anos] para dar uma revista na casa deles e avisar a polícia para evitar”, afirma.

Provas “robustas”

Diferentemente da versão sustentada pelo pai do suspeito, a polícia apresentou ao menos 10 provas do envolvimento do menor na chacina, entre materiais apreendidos e mensagens de celular. No decorrer da investigação, mais de 30 pessoas foram ouvidas. Entre as ações planejadas pelo trio, segundo as investigações, estavam a matança de namorados de meninas da escola, estupros coletivos e esfaqueamentos em massa.

Um comportamento desconhecido para Wellington. “Meu filho sempre foi educado, calado, tranquilo, não desrespeita a gente”, destaca. Segundo o pai, o jovem frequentava a Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias, dos mórmons. “Ele treinava para ser missionário. Na semana retrasada, passou uns dias em São Roque (SP), com as pessoas da igreja. Por isso, não acredito que esteja envolvido nisso”, reforça.

O homem reclama das acusações feitas pela polícia e da repercussão do caso. Comerciantes vizinhos pararam de falar com ele e seus familiares. “Nunca imaginei passar por isso. Dói ele estar lá [na internação]. Eu sou meio bruto, não tenho muito sentimento, mas estou sentindo falta. Tudo que eu não tive na idade dele, tentei proporcionar”, diz. “Não foi meu filho que elaborou esse plano. A polícia o pegou para mostrar à sociedade que resolveu o crime”, acusa o organizador de eventos.

Wellington também nega que o suspeito tenha ajudado na compra do armamento usado na chacina. Contudo, o jovem sabia da compra do machado usado para ferir o estudante José Vitor Ramos Lemos, 18, que correu com a arma cravada no ombro até o hospital. “O Taucci tinha contado que havia comprado a machadinha. Meu filho perguntou para quê. Ele disse que deixaria de enfeite pendurado na parede”, diz o pai do adolescente apreendido.

Guilherme Taucci esteve cerca de 10 dias antes do crime na casa de Wellington. Ele não percebeu nenhuma anormalidade no comportamento do garoto, que atirou a sangue frio contra estudantes e funcionárias da escola onde estudou até o ano passado. “Se não tivesse acontecido tudo isso, diria que ele jamais faria uma coisa dessas. O moleque não abria a boca para nada. Ninguém diria que ele tinha essas ideias tortas”, comenta o homem.

Sem represálias

Apesar da repercussão negativa, a família não pensa em deixar a cidade. “Não tenho medo de represálias e também não acredito que farão mal ao meu filho durante a internação. A assistente social me falou que ele está no convívio com os demais internos. Comeu, dormiu e está participando das atividades”, disse Wellington.

A avó do menino, de 66 anos, que é muito apegada ao jovem, está sob efeitos de medicamentos. A mãe dele tenta assimilar a tragédia e passa a maior parte do tempo chorando. Os filhos matriculados na Raul Brasil pretendem voltar ao colégio. “Conversei com eles, estão normais. Eu ainda não consegui ir trabalhar. Vou precisar de uns dias”, admite o organizador de eventos.

Dos sonhos do filho, o pai só conhece um: o desejo de deixar o país. “Queria morar na Espanha ou na Rússia. Gosta do frio e admira o exército russo. Perguntei por que, e respondeu que lá eles têm mais poderio de fogo para proteger as pessoas”, revela, encerrando a conversa.