Câmara Criminal confirma pena de um ano de reclusão para diretora que negou matrícula a aluno com deficiência

Quando o aluno não apresenta deficiência cognitiva nem psicológica, somente física, não há motivo algum para que ele não possa frequentar a rede regular de ensino, sendo estabelecido nada menos do que pela Constituição Federal que as pessoas com deficiência serão educadas preferencialmente nesta, e não em rede especial, norma essa aplicável não só às escolas públicas, mas também às privadas.

Com base neste entendimento, a Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça (TJSC) negou provimento a apelação interposta por uma diretora de escola condenada a um ano de reclusão, em regime aberto, mais pagamento de multa, por negar matrícula a um estudante portador de severa perda auditiva.

De acordo com os autos, o aluno cursou todo o ensino fundamental na instituição, mas teve a matrícula recusada quando foi se inscrever para o primeiro ano do ensino médio. Depois de três tentativas junto à escola, a mãe procurou o Ministério Público. As informações deram origem a um inquérito policial, que embasou a denúncia oferecida à Justiça.

Em primeira instância a diretora foi condenada por ofensa ao art. 8º, I, da Lei 7.853/89., que dispõe sobre o apoio às pessoas portadoras de deficiência, sua integração social.

Ela, então, apelou ao TJSC. Ao analisar o caso, o relator do recurso, desembargador Sérgio Rizelo, afastou todos os argumento da ré e foi contundente nas palavras:

[…] Com razão, apoiado até mesmo por convenção internacional, não ratifica o Estado a exclusão e a segregação dos alunos com deficiência, seja em escola pública ou privada, quanto menos (e isso se diz apenas para que fique clara a gravidade do caso em mesa) se as necessidades educacionais especiais do estudante resumem-se à contratação de professor auxiliar, porque seu desenvolvimento mental é congruente com sua idade física e, logo, igual ao dos demais estudantes da classe.

Nesse trilho, se foi apresentada por Carlos (nome fictício) dificuldade na assimilação dos conteúdos, por não ter sido adequadamente alfabetizado, é certo que isso não se deu pela sua surdez, mas pela inadmissível incompetência da própria instituição de ensino em prover ao aluno os mecanismos necessários ao seu aprendizado, de avaliá-lo de forma condizente com a sua evolução escolar (considerando que nunca teve que repetir o ano na escola, porque, presume-se, seu desempenho sempre foi julgado adequado), e de garantir que ele acompanhasse o currículo disciplinar. Não é dado à instituição e, por óbvio, tampouco à Apelante, então, “punir” o aluno, negando-lhe matrícula, por sua própria falha no processo educacional.

Prossegue o relator:

“É oportuno consignar que seria lamentável se não fosse trágica a opção da Recorrente de não aperfeiçoar a escola que comandava em favor de todos os alunos e de negar adotar educação inclusiva a quem possui necessidade especial no ensino regular. A convivência e o respeito das singularidades de Carlos seguramente contribuiriam para o amadurecimento de todos os integrantes da comunidade escolar, pois é papel da instituição formar e transformar a realidade, com a ousadia de rever concepções e paradigmas e superar limitações. O que dizer da exclusão imposta ao Adolescente, negando-lhe acessibilidade de comunicação com colegas com quem estudava há cerca de 10 anos e de desenvolver suas potencialidades, respeitando suas necessidades?

Incompreensível também é a decisão da Apelante se for considerado que lhe era permitido diluir a “despesa” com a contratação de um professor auxiliar (a Testemunha E. da S. C. esclareceu que apenas ele era acometido da moléstia) entre todos os alunos do Colégio, via mensalidade, o que aumentaria a mensalidade de cada um em valor praticamente irrisório. De mais a mais, dita o art. 205 da Constituição Federal que ‘A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho’”.

A votação pelo desprovimento do apelo foi unânime. Participaram do julgamento os desembargadores Volnei Celso Tomazini e Norival Acácio Engel.