Uma história de amor e dedicação aos caimãs latirostris

Foi um presente que durou oito anos com a visita de um pescador da Baía da Babitonga. Trazia num saco de ráfia quatro jacarés do papo amarelo. Peso médio de cada um: 500 gramas. Disse-me: “Trouxe para um dentista que quer ‘empalhá-los’. Não posso fazer tal crueldade com os bichinhos. Quero deixá-los com o senhor. Não custará nada. É um presente. Sei que gosta dos animais silvestres. Sei também que salvou um urubu, gaivotas, gavião, coruja, entre outros”.

Uma bacia azul, onde cabiam dez litros de água, serviu de espaço aquático aos répteis. Mais tarde construí um espaço maior, equipado com tanque de água, renovada a cada chuva que caía. A área telada impedia que pessoas se aproximassem. Tratava-se de risco iminente de acidentes. Os caimãs não domesticam. Salvo raríssimas exceções, tomam feição pelo domador, que utiliza técnicas não recomendadas.
Depois que tomei fama, não parou de chegar gente pedindo para deixar os bichos. No meu espaço de dois mil metros quadrados, no bairro Floresta, em Joinville, permanecem exemplares da Mata Atlântica.

Foi o mínimo que podia fazer diante da precariedade e dos parcos recursos para sustentar a família tão numerosa. Assim, tornei-me criador de jacarés. Reconhecendo essa condição, o Ibama de Santa Catarina credenciou-me, sem burocracia, como fiel depositário de jacarés. Alguns passaram temporadas com minha família. Outros foram levados para o zoobotânico de Joinville. Alguns escaparam de lá e hoje vivem no rio Cachoeira.

Os anos passaram. Os jacarés cresceram. A população flutuava entre quatro e sete animais. Depois de oito anos, calculei que tinham comido 3.250 quilos de peixes, misturas que comprava e ganhava da peixaria da Barra, no Floresta, em Joinville. Por quatro vezes, recebi a visita de Sergio Murad – Beto Carrero. Estava construindo na Penha um parque temático. Vinha visitar os jacarés. Pedia insistentemente os animais para levá-los para o Mundo de Beto Carrero.

A área destinada aos répteis, que tinham atingido mais de 30 quilos cada, ficara pequena demais. Passaram a brigar entre si na disputa de uma das fêmeas. Acidentes poderiam ocorrer, tanto com humanos quanto com os animais. Na última visita, Beto Carrero me fez uma proposta: “Desenhe um projeto detalhado para acolhê-los com todo o conforto”.

O projeto de mais de um hectare, com lago, praia e mata foi executado e os jacarés receberam um novo habitat natural. Foi o mais importante presente que já havia dado a um amigo. Libertei-os pessoalmente nas confortáveis e amplas instalações. Por diversas vezes estive com os caimãs. Vinham para as margens reluzentes e gordos me cumprimentar. Eram muito bem tratados.

A paz interior tomou conta de mim ao saber que muitos humanos os iriam admirá-los em segurança. Beto Carrero continua entre nós e os caimãs continuarão a dar o testemunho do quanto esse brasileiro, amigo dos animais, os amava. Essa é uma das histórias que tenho sobre os animais silvestres que passaram pela minha vida. Sempre me proporcionaram ricos conhecimentos, muitas alegrias e satisfação.