Pé da serra: traço de união ou linha de fronteira? (fim)

Para finalizar nossa discussão sobre a oportunidade de uma nova associação municipal no sul de Santa Catarina, gostaria agora de compartilhar com o leitor, em três ou quatro traços sintéticos, algumas lições tradicionais, tanto empíricas – A experiência é a madre de todas as cousas, dizia o polígrafo renascentista Pedro Nunes -, como do domínio geoestratégico das ciências sociais, em face de situações de fragmentação territorial:
– A primeira, é que uma partição territorial só faz sentido se o povo dessa região apresentar características absolutamente distintas – étnicas, culturais, religiosas, linguísticas – das que lhe ficam no entorno. Não existe coisa pior que um povo oprimido por outro que não lhe respeita a língua, os costumes, as crenças, as tradições. Esse não é, definitivamente, o caso dos municípios candidatos à nova associação.

– Segunda: ou o fragmento territorial que aspira à independência possui suficiente força econômica e cultural para se afirmar num contexto de diversidade e de equilíbrio entre pares, ou ele será obrigado a orbitar em torno de um centro de gravidade maior, com uma independência apenas virtual. Como se diz popularmente, pior a emenda que o soneto.
– Terceira: num processo de fragmentação de território, embora o povo seja conduzido a acreditar que os mentores do movimento são heróis puros, impolutos e esclarecidos, unidos e indivisíveis, quase divinos, o que ocorre quase sempre logo após a independência é a fragmentação dos líderes em contendas separatistas, tomados pelo contraideal político do poder pessoal ou partidário, ou até por fatores publicamente inconfessáveis.

– E quarta, uma divisão desse tipo não é um fenômeno isolado, que permanecerá estático como num sistema fechado: pelo contrário, num sistema social cada vez mais aberto e interativo, dotado de informação instantânea por via tecnológica, a turbulência criada por semelhante processo mexe intensamente com as áreas contíguas, alongando-se em sucessivas ondas concêntricas de instabilidade que, conforme o curso dos acontecimentos, disseminam-se rapidamente pela região e poderão retornar com um cunho adverso, por vezes com intensidade redobrada e sem piedade, sobre a própria região que iniciou o processo.

Em conclusão, acredito firmemente que a estreita faixa do pé da serra, estritamente falando, está muito mais vocacionada para ser um traço de união, do que uma linha de fronteira: uma linha de união entre litoral e planalto serrano, entre sul e norte do estado. Uma linha de integração simbiótica, sem a qual nossa região não será, com toda a certeza, nem mais livre, nem mais forte, nem terá melhor qualidade de vida. O processo iniciado com o projeto Prosperidade Sul Catarinense possui, justamente, essa tônica integradora e articuladora das potencialidades municipais, constituindo uma oportunidade única para que todos os municípios possam contribuir os demais em cooperação, e receber, em retorno, um valor agregado nessa simbiose coletiva. Para tal, nossa região não poderá sujeitar-se à turbulência e instabilidade que viriam com a criação de uma nova potência municipal, à custa do consequente esvaziamento da Amurel e da Amrec.

O processo de integração e desenvolvimento sul catarinense exige também, por outro lado, que as vacas sagradas afastem-se do pasto e que todos os municípios sejam respeitados e considerados como iguais em direitos e deveres, com a queda das relações feudais, sejam elas locais ou pessoais. Assim sopram os ventos da história, aqui e em todo o lugar.