Os macacos boca preta

Conta-nos uma lenda que existe ou existiu em algum canto de nossas florestas um bando conhecido como “macacos boca preta”. Traz-nos a narrativa que este bando de primatas tinha um problema e que, talvez, nunca conseguiram resolver. O problema maior e mais grave era arrumar um tempo e disposição para fugir da chuva e do rio nos dias de tempestade. Os macacos boca preta eram conhecidos como preguiçosos, malandros e vadios, pois a maior parte do tempo eles passavam em cima das copas das árvores, pulando de galho em galho, divertindo-se ao sabor dos banquetes das doces bananas nos dias ensolarados.

Mas, repentinamente, vinha a tempestade com fortes chuvas e ventos e surpreendia a todos nas copas e árvores. Então, lembravam-se: “Não construímos nossas casas. Mas amanhã faremos”. Esta história poderá hoje nos servir como plano de fundo, de inspiração e merecedor de um aprofundado estudo para nós, que vivenciamos uma realidade muito séria.

Observem se não existe uma semelhança entre a ficção com algumas pessoas da nossa realidade. Sim, pois: Amanhã faremos. Amanhã eu ligo. Amanhã eu aviso. Amanhã fiscalizo aquela obra. Amanhã passarei a gastar menos água. E tudo fica para o amanhã, que nunca chega. Podemos afirmar com autoridade que os macacos boca preta lembram nossos homens públicos, que hoje estão à frente da nossa administração pública, tanto nas esferas municipais, estaduais e federal.

Venho, respeitosamente, dirigir-me aos nossos vereadores e também àquelas pessoas que receberam o dever e a responsabilidade pública de procurar menos seguros e construir um município que possa oferecer segurança física a todos. Aos 18 anos, fui testemunha da grande enchente que quase afundou com a nossa cidade, em 1974. Além das vidas que foram tragadas pelas águas revoltosas e escuras. E outras que perderam tudo, ou quase tudo.

Porém, com a força da solidariedade dos municípios vizinhos, e também das igrejas, a cidade voltou a respirar e crescer. Estamos às vésperas de completar quatro décadas desde aquele terrível acontecimento. Nove administradores do executivo (prefeitos) e 153 vereadores foram eleitos e passaram pelas pastas públicas. É a água que mais uma vez podemos nos identificar com os macacos boca preta. Muito tempo passou por diante destas pessoas e elas não perceberam. Quem sabe, os raios ofuscantes daqueles dias ensolarados ofuscaram nossos representantes públicos, que não tiveram tempo e disposição para monitorar o crescimento populacional e geográfico.

A verdade é que de lá para cá não tivemos uma administração empreendedora que estivesse voltada aos interesses coletivos. Não pensaram em construir um saneamento básico eficiente para escoar toda a água de casas, prédios e empresas, e também das fortes chuvas. A solução, foi: vamos contaminar o rio. Este rio que nos banhávamos durante o verão e servia como bebida para matar a sede. Ao contrário de hoje, que você tem que comprar uma garrafa de água mineral para beber. Ou procurar outras fontes alternativas.

Geograficamente, Tubarão foi interceptado pela mesquinhez do capital e pela falta de competência. Mas é assim mesmo! Enquanto tudo parecia estar muito bem. Enquanto naquela época o sol de verão e o frio do inverno cumpriam rigorosamente o calendário anual e suas estações. Diferente de hoje que já não temos mais certeza de que época climática vivemos. Quarenta anos poluindo o ar, produzindo lixo em abundância e sem saber o que fazer, destruindo a camada de ozônio, destruindo matas, montanhas e poluindo rios e mares.

Então, assim como a tempestade chegou para os macacos boca preta, também haveria de vir sobre nós. Por conta do aquecimento global e suas consequências somos invadidos por águas e águas. Uma vem do alto com toda a força e a outra que parece brotar do chão, deixando ruas, avenidas alagadas. E deixando uma população aterrorizada pelo medo provocado pelos ventos em fúria que atravessam a nossa cidade, escoando pelas orlas do rio Tubarão. Transformando aquele jardim de árvores desorganizadas em abanadores furiosos, causando tamanha destruição, registrado mais uma vez por mim e pelos jornais locais.

Senhores, temos que admitir. Tempo e dinheiro desperdiçado com planos falíveis e sem resultado algum. Antes tivéssemos comprado tudo de bananas e distribuído pelas nossas escolas, às crianças carentes. Pois banana contém ferro e potássio. E, com isso, eliminaríamos algumas doenças do nosso meio. Até nisso deixamos de pensar. Quem sabe, pular, brincar é mais importante sobre os dias ardentes do verão. Mas, cuidado, uma nova tempestade aproxima-se. Cadê as botas?