Os efeitos (defeitos) da Lei Seca

Nos bares e rodas de amigos, comenta-se muito a respeito da Lei Seca. As pessoas ficam assustadas com a possibilidade de caírem nas garras da lei e acabam adotando medidas preventivas para que isso não ocorra. Regulam a quantidade de álcool que irão beber (se a lei é seca, não adianta regular), procuram levar pessoas que não bebem para dirigir no final da noitada, casais revezam “hoje eu bebo, amanhã você”.

São muitas as alternativas que as pessoas encontraram para se livrar de uma possível punição. Tudo isso por medo da suposta rigidez da Lei Seca. Não beber antes de dirigir é, com certeza, uma decisão sábia. Porém, as pessoas deveriam conscientizar-se não pelo medo da punição, mas sim pelo fato de estarem desrespeitando a lei. Precisamos analisar cautelosamente. A Lei Seca veio para punir com mais rigor ou para facilitar a vida do infrator?

Existem duas esferas onde o cidadão poderá ser punido por estar dirigindo ébrio. Na esfera administrativa, se você for pego ao volante por um guarda municipal ou policial, será autuado de acordo com o Código de Trânsito Brasileiro, em seu Art.165. Para isso, no caso de recusa do infrator em submeter-se a teste com aparelho etilômetro (bafômetro), basta apenas a constatação de provas acerca dos sinais notórios de embriaguez, excitação ou torpor, resultantes do consumo de álcool ou entorpecentes. Nessa esfera, praticamente nada mudou.

Na esfera penal, na minha opinião, a lei ficou mais branda, pois rezava a antiga lei que: “Art 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, sob a influência de álcool ou substâncias de efeitos análogos, expondo a dano potencial a incolumidade de outrem: Penas -detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor”.

Sendo desta forma, para efeitos penais, a comprovação poderia ser concretizada com o bafômetro, exame clínico, exame de sangue ou prova testemunhal. Bastava apenas a comprovação de que o condutor estava sob influência de álcool ou substância de efeitos análogos, sem mencionar quantidade. É o que dizia a lei.

A nova redação: “Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”. (Redação dada pela lei n° 11.705, de 2008).

Sendo exposto desta maneira, não resta dúvida que somente a comprovação da referida concentração por meio testes legalmente previstos confirmará a responsabilidade criminal. Isso se o suspeito livremente colaborar para que se realize os testes. O exame pericial médico clínico fica inviável, pois não é possível aferir o grau de concentração de álcool no sangue, indispensável para que seja lavrado o flagrante. O exame de sangue seria uma alternativa, porém, esses exames costumam levar alguns dias para que se obtenha o resultado, e o flagrante quebra-se em 24 horas. Portanto, resta apenas o exame com aparelho etilômetro (bafômetro), cujo resultado é imediato.

Como guarda municipal e cidadão, tenho convicção de que a Lei Seca somente ficou mais rígida na esfera administrativa. Mexendo no bolso do infrator, o que é plausível. Porém, deixou a desejar na esfera penal, visto que, para ser lavrado o flagrante, precisa ser comprovado concentração de álcool por litro de sangue igual ou superior a seis decigramas. Ninguém poderá ser compelido a fazer o tal exame. Portanto, somente será preso em flagrante aquele que quiser. Apesar do nome Lei Seca, existe de acordo com o decreto 6.488/08, uma tolerância de dois decigramas de álcool por litro de sangue. Quantidade insignificante. Então, neste final de ano, se for sair de casa de carro, não vá comer aquele bombom de amarula. Ele pode custar muito caro.