O sino de Frei Rogério

E m Frei Rogério, uma pequena comunidade de descendentes das vítimas da bomba atômica, reza-se, todos os dias, para que nunca mais ocorra, em lugar nenhum do mundo, um outro genocídio como o que matou 180 mil pessoas inocentes em Hiroshima e Nagasaki, ao fim da Segunda Guerra Mundial.

As duas bombas lançadas pelo Enola Gay (nome jocoso e sarcástico que o comandante do B29 deu a seu avião) não caíram sobre nenhuma estrutura militar, mas, simplesmente, sobre uma população impotente, desarmada e inocente.
Um outro conflito – o do Contestado – marca a história do município, cujo nome evoca a figura lendária de um grande sacerdote, o padre franciscano alemão Rogério Neuhaus, que atuou de forma solidária e diplomática na solução daquela outra sangrenta conflagração.

Ali foi construído, sob a liderança de Kasumi Ogawa (sobrevivente daquela estúpida hecatombe), o Parque da Paz, que tem a forma de Tsuru, o belo pássaro japonês. Ali – neste dia 9 de agosto, a data fatídica – será realizada a cerimônia da batida do sino resgatado de um templo destruído por aquela explosão nuclear.

Destruído o templo, sobraram três sinos. Um está em Hiroshima; outro veio para Frei Rogério e o terceiro está na sede da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York. O governo japonês atribui tanta importância à comunidade de Frei Rogério que lhe doou aquele sino, dos três que restaram da tragédia. Aliás, na inauguração da pavimentação da rodovia de acesso, tive o prazer de dividir o palanque com o próprio embaixador do Japão.

Nesta segunda-feira, completam-se 65 anos daquela tragédia. Mas, o mundo não esqueceu nem esquecerá, jamais, daquela brutalidade, cujos efeitos se manifestam até hoje nas pessoas e no meio ambiente. Como sempre, as maiores vítimas são as crianças. Para lembrá-las, e homenagear a comunidade nipônica de Frei Rogério, busco os versos de Vinícius de Moraes:
“Pensem nas crianças mudas telepáticas;
Pensem nas meninas cegas inexatas;
Pensem nas mulheres rotas alteradas;
Pensem nas feridas como rosas cálidas;
Mas, oh não se esqueçam da rosa, da rosa;
Da rosa de Hiroshima, a rosa hereditária
A rosa radioativa, estúpida inválida;
A rosa com cirrose;
A anti-rosa atômica, sem cor, sem perfume. sem rosa, sem nada”.