“Escapamos!”. Da paralisação à solidariedade

Resido em Tubarão há 12 anos e também pratico o “esporte” municipal de dias de chuva intensa: monitorar as águas do rio observando o medidor nas imediações dos fundos do Farol Shopping.
Sábado, estávamos preocupados. Domingo pela manhã, respiramos mais aliviados, pois o rio iniciou sua descida em direção à normalidade.

“Escapamos!”, disse-me um senhor que também monitorava o rio domingo passado. Voltando para casa, encontrei uma amiga, irmãzinha da Divina Providência: “Fabio, aqui melhorou, mas no norte a situação está crítica”. Em casa, iniciei a tomar conhecimento da tragédia no norte do estado. Sinceramente, pensava que a região sob perigo fosse a de Tubarão. O temor vigilante deu lugar ao alívio; o alívio foi substituído pelo estupor, pelas notícias vindas do norte; o estupor gerou paralisação. Alívio e paralisação se misturaram. Lembrei-me de alguns colegas de universidade, em Roma, que, de retorno, após as férias, narravam tristes histórias. Um colega do Oriente Médio encontrou a sua residência destruída pelas infindas guerras e/ou bombardeios em tempos de paz. Outro colega, africano, teve a família assassinada pelas bárbaras guerras étnicas.

A tragédia nos anestesia, paralisa, deixa sem ação. A ficha custa a cair, mas cai. Agora, é o momento de agir (já o é faz dias, mas não para a maioria). Passar da paralisação à solidariedade é questão de responsabilidade e sinal de maturidade. O realismo é bom quando favorece a ação, e não quando é usado para justificar omissão: “A culpa é disso, dele, daquele ou daquilo”. Não interessa, agora, saber de quem é a culpa (como já disse outras vezes, é do sistema, é culpa compartilhada). Interessa, agora, agir. A prática da solidariedade, além de ajudar quem necessita, reforça os vínculos societários, gera consenso social, ingrediente substancial, unificador segundo as análises sociológicas brilhantes de Émile Durkheim e Pitirin Sorokin.

O governador do estado de Santa Catarina afirmou que se trata da pior tragédia climática do estado de Santa Catarina. Em número de mortos, não é a pior. Em 1974, morreram 199 pessoas em Tubarão e região. Em 2008, morreram 97 pessoas até o momento em que escrevo este artigo. A tragédia do norte foi tremenda, pelas mortes e extensão dos danos. Mas a pior, pelo número de mortos, continua sendo a do sul. Não quero dizer com isso que o governador seja mais sensível às dores do norte do que às dores do sul. Faço tal ponderação não para competir na macabra concorrência da dor, mas por amor à precisão, aos dados, à “verdade efetiva da coisa”, para usar expressão clássica do italiano Niccolò Machiavelli.

Podemos ajudar de muitas formas. Em primeiro lugar, não sentindo tal problema como se fosse dos outros. Não é. É problema meu, teu, nosso. Como escrevi sexta, para a edição de sábado passado do Notisul – quando ainda não sabíamos do desastre humano e ambiental do norte – somos todos da mesma família, pois há vínculos mais profundos entre os seres humanos que os vínculos de sangue. Por isso, o problema do norte é problema nosso. Depois de tal tomada de consciência necessária para ser evitar distâncias descabidas (assistencialismo), cabe fazer o que a criatividade do amor sugerir.

Dentre os vários grupos que estão trabalhando em Tubarão e região para aliviar o sofrimento dos nossos irmãos do norte, a Unisul também está fazendo a sua parte. Você pode dirigir-se ao Espaço Integrado de Artes (EIA – a popular Bolha) para doar seu ato de amor em forma de alimentos não perecíveis; água mineral; material para higiene pessoal; material para limpeza de casas; etc. No futuro, constará na memória do seu coração não o círculo vicioso da indiferença, da omissão, mas o círculo virtuoso da solidariedade que você ajudou a expandir no mundo por meio de atos concretos de amor.