Páscoa é tempo de recordar a Ressurreição. Não é momento para chorar a morte do Filho de Deus, que aconteceu há mais de dois mil anos. Ele ressuscitou. Lágrimas devem ser derramadas (no sentido de se sensibilizar e agir em favor) sobre aqueles que “morrem” hoje – vítimas de diversas formas de crucificação. Jesus mesmo disse: “Filhas de Jerusalém, não choreis por mim; chorai, antes, por vós mesmas e por vossos filhos!” (Lc 23,28).
Os crucificados da Terra estão em todas as nações. Mas os brasileiros estão crucificados com cinco cravos, cinco chagas, cinco feridas bem caracterizadas, como já sugeriu Dom Orlando Brandes, num texto há alguns anos publicado e que agora serve de pilar para a reflexão que se segue.
O primeiro cravo é o da dívida externa e interna. Como numa hemorragia, os recursos esvaem-se no pagamento das altas taxas dessas dívidas. Com isso, só pode aumentar a pobreza e a miséria, e com elas a violência. Os banqueiros internacionais governam de fato o mundo. A dívida é um mal crônico, endêmico, canceroso. Quem sai perdendo é o povo, que não contraiu a dívida, mas deve pagá-la com impostos e altas taxas; pior, pagá-la com a exclusão, a marginalização, o empobrecimento. Eis a matriz geradora de violências e sequestros. Percebe-se assim que maior que a dívida externa é a dívida interna, não em dinheiro, mas em aplicações sociais que o governo não realiza, porque precisa pagar a dívida externa.
O segundo cravo é o da concentração da renda e da terra. Os ricos ficam mais ricos, enquanto isso, desemprego, fome, êxodo rural é o que sobra para o povo. O sistema neoliberal, para se sustentar, criou a globalização, mas os sinais dessa opção, de certo modo, não são bons para o povo, e sim para os detentores do poder econômico. A economia e a política devem ser pensadas de um modo diferente. O mundo não precisa ser assim como está. Existem outras opções na esperança de uma terra sem males.
O terceiro cravo é o da corrupção, dos desvios de recursos, da maracutaia pessoal e corporativa, sem o mínimo de ética e de respeito pela vida do povo. Quase metade de nossos noticiários cotidianos aponta para fatos de vergonhosa desonestidade. Já os profetas, denunciavam o enriquecimento ilícito, balança falsa, as mentiras oficiais, a manipulação dos pequenos. A corrupção tornou-se uma cultura, algo normal, uma virtude: a da esperteza. Essa chaga que parece incurável será superada com educação, ética e honestidade. Hoje, sangra a corrupção policial.
O quarto cravo é o da destruição do meio ambiente, especialmente da Amazônia, não esquecendo a seca do nordeste, o problema da energia elétrica, a poluição e contaminação ambiental, as famosas queimadas e lixo nos rios comprometendo a vida e a segurança da vida. O ser humano cria o princípio de sua autodestruição e sua casa e mãe comum, a terra, além de mal repartida, está contaminada. A Campanha da Fraternidade em favor da segurança do povo brasileiro quer, ao mesmo tempo, defender os seus direitos sociais.
O quinto cravo da cruz social são as drogas e o narcotráfico. O primeiro lugar cabe ao alcoolismo, forte sinal de carência afetiva, de família fracassada, de desemprego, de falta de perspectiva social. As quedas dos valores, a ausência de Deus, o descrédito em relação à política, enfim, um conjunto de causas faz do povo brasileiro um povo crucificado e chagado pelo flagelo das drogas, Aids e do narcotráfico. A situação torna-se alarmante com o aumento da violência, a corrupção policial e o sistema carcerário precário. Quando virá a tão esperada reforma do sistema judiciário?
Essas cinco chagas evocam cinco esperanças fundamentais para o povo. Antes de tudo, educação com qualidade; nova política alicerçada no bem comum e conscientização popular; reabilitação da família e dos valores éticos numa parceria entre escola, igreja, política e família; terra para todos; e, por fim, um projeto alternativo de sociedade. As chagas podem ser curadas e transformadas em pérolas preciosas. Espera-se na utopia de uma “terra sem males”, ou então uma “terra com menos males”. O Brasil, maior país cristão do mundo, tem obrigações de ser uma nação justa, fraterna e solidária.