Ação previdenciária: um direito, um crime…

Ultimamente, temos acompanhado a avalanche de notificações emitidas pela Receita Federal contra segurados do INSS que receberam valores decorrentes das chamadas ações previdenciárias, reconhecidas no âmbito da justiça federal. Tudo se origina quando um segurado, depois de anos de trabalho ou de contribuição em situação específica, tem o seu direito negado nas agências do INSS.

Para reaver seu beneficio, não lhe resta alternativa senão entrar com ação na justiça federal, onde corre a grande maioria destes processos previdenciários. Após anos de tramitação do processo, a justiça finalmente lhe reconhece o direito, fazendo a merecida justiça, tão sonhada pelos segurados da previdência. Enfim, o dinheiro é recebido em uma única vez e engloba todos os meses devidos ao segurado, desde o protocolo administrativo. E essa alegria transforma-se em tristeza, com a entrada em ação da Receita Federal.

Sim, porque quando do pagamento feito pela Caixa Econômica é retido 3% do seu dinheiro. Percentual, aliás, que nem faz parte da tabela do imposto de renda, mas que só serve para um objetivo: delação tributária. Pois a CEF informa à Receita o valor total recebido.
E aí começa o calvário do segurado da previdência. Refiro-me aqui em pessoas humildes, simples, gente de bem, da cidade, do interior e que nem sabe destas coisas, destas armadilhas fiscais criadas por legisladores que nem sabem o que fazem e só os computadores sabem. Algum tempo depois, chega a notificação da Receita Federal, cobrando quase o total daquilo que ele levou anos para receber.

Para que se tenha uma idéia de valores, fiz um recurso de uma pessoa que recebeu, em 2005, quase R$ 43 mil e a notificação foi de R$ 27.550,00, ou seja, 64%. Sem querer entrar no mérito da legislação fiscal, regulamento do imposto de renda, rendas tributadas, prescrição, base de cálculo, alíquotas, etc., falo de um valor acumulado de vários meses passados recebidos de uma única vez, não por culpa do segurado que foi atrás do seu direito, ou da previdência, que lhe negou o direito, ou da justiça, que lhe deu o direito, mas do uso abusivo da Receita Federal, pois essa notificação poderá resultar em ação penal, com consequências imprevisíveis.

Trato de pessoas que nunca ganharam salários para declarar imposto de renda, que nunca declararam imposto de renda, que nem sabem o que seja isso, que apenas um dia na vida receberam aquele atrasado pago pela Caixa Econômica. E que nunca mais vão declarar imposto de renda, pois seu benefício é, na grande maioria, de dois salários mínimos. Que quando receberam o valor, ninguém avisou sobre lei do imposto de renda, da obrigatoriedade de prestar contas a Receita Federal, nem o advogado que entrou com a ação, nem a justiça que lhe deu o direito, muito menos a Caixa que pagou. Enfim, ninguém falou nada quando lhe foi pago. O cidadão recebeu e foi se governar na vida.

Quando perguntei a algumas dessas pessoas sobre imposto de renda, declaração anual, ajuste, etc., a maioria respondeu que nada sabia, que achava que o que recebeu não precisava mais nada, alguns sequer sabiam que já havia tido um desconto de imposto de renda. E, quando chega notificação, o cidadão certamente já não tem mais todo aquele dinheiro e agora se vê apavorado diante do valor absurdo que lhe é imposto pela Receita Federal.
Ainda ocorre que muitos não sabem da famigerada notificação, pois moram em lugar ermo ou em zonas rurais, não são encontrados pelos Correios e só ficam sabendo quando um oficial de justiça chega para fazer a citação, penhorar seus bens, pois o governo já entrou com ação de execução fiscal. (Continua amanhã).