Lei Menino Bernardo

Depois de oito anos para avançar no Congresso Nacional, a Lei da Palmada foi aprovada pelo Senado e sancionada em 27 de junho deste ano pela presidência. Agora, denominada Lei Menino Bernardo, traz grande discussão, inclusive quanto ao futuro do país.

Sim, porque muitos defendem a necessidade de palmadas e outros castigos físicos às crianças para que estas se desenvolvam e tornem-se adultos educados, equilibrados, justos e cumpridores das leis.

Vale destacar que o poder familiar no Brasil, traduz-se em um conjunto de responsabilidades e direitos que envolvem a relação entre pais e filhos, mas não se traduz em direito de propriedade daqueles sobre estes. Os pais, segundo a Constituição e o Código Civil – têm o dever de assistência, auxílio, educação, guarda, representação e respeito mútuo.

Mesmo antes da nova Lei Menino Bernardo, a criança já tinha a proteção do estado contra qualquer tipo de violência por meio do Estatuto da Criança e do Adolescente, uma lei de 1990. Então, não há que se falar em novidade o fato de que o “estado intervém na família”… 

A nova lei não pune os pais pelas palmadas distribuídas ou castigos físicos de toda ordem, mas autoriza que o Conselho Tutelar aja no sentido de acompanhar a família, encaminhar para ajuda psicológica ou cursos no sentido de educar para uma mudança de paradigmas. Se for o caso, pode o estado intervir com as medidas protetivas do menor (tais medidas já existem antes da lei! Talvez só funcionasse para casos de violência muito severa onde a vida da criança estivesse em risco, mas, muitas vezes a intervenção é tardia e os danos são grandes). A lei estabelece como conceito de castigo físico qualquer ação disciplinar ou punitiva com o uso da força e que resulte em sofrimento ou lesão, e o significado de tratamento cruel como conduta humilhante ou que ridicularize a criança. É subjetiva a análise do sofrimento, lesão. Infelizmente é… Mas existem diversos estudos científicos pelo mundo que apontam que palmadas à violência física não é construtiva na educação de adultos valorosos, que afeta o desenvolvimento intelectual das crianças e jovens, sem mencionar o emocional. De acordo com estudos realizados por 20 anos no Canadá, “a palmada pode reduzir a massa cinzenta do cérebro e o tecido conjuntivo entre as células cerebrais. A matéria cinzenta é uma parte integrante do sistema nervoso central e influencia nos testes de inteligência e na capacidade de aprendizagem”. É o que se quer para as futuras gerações?
Jargões utilizados como “bato agora para que meu filho não apanhe da polícia depois” ou “eu apanhei e sobrevivi”, não justificam a resistência para mudar. Outros países onde a violência doméstica é mais combatida pelo estado, nas ruas é menor. Ainda, a verdade é que nenhum de nós saiu ileso das surras, palmadas ou ofensas sofridas na infância em nome da boa educação. O que nos salvou foi o amor de nossos pais ou cuidadores. Difícil é admitir isso! Difícil sair do círculo de violência! Pessoalmente, acho bem complicado…

Não queremos uma sociedade de sobreviventes, de jovens limitados pela violência. Não queremos uma sociedade na qual os jovens aprenderam que bater é válido em momentos de raiva, ou para bem conduzir outra pessoa. Talvez seja essa a razão da violência social, contra a mulher (unido ao fato de que ainda existe a crença de que esta pertence ao companheiro, mantenedor, estado, etc.) – já parou para pensar? Quem defende tal lei não guarda a permissividade. Não defende a omissão dos pais. Até porque ainda continua a obrigação legal destes a conduzir a educação e a saúde de seus filhos, garantido-lhes bem-estar físico, e como diz o Código Civil: “exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios de sua idade e condição”. Defende-se que os pais busquem outros recursos educativos, que utilizem não de violência, mas de pedagogia, amorosidade, acolhimento, expectativas reais, entre outras ferramentas para criar e educar seus filhos. Não acredito, como advogada, que leis mudem a sociedade, mas essa lei vem de uma mudança que já existe, de parte desta sociedade que não tolera mais a violência instalada em nossas ruas e casas. 

Tal lei tem possibilitado – inclusive para mim – uma discussão real sobre o problema e talvez possibilite autocrítica, autoconhecimento, busca de novos saberes, busca de educação emocional pelos pais e educadores, para que, encarem sua própria infância, superem-na e melhorem como pessoas e como pais, merecendo o respeito de seus filhos e não o medo.

Como mãe, essa lei trouxe a esperança de que o mundo realmente seja melhor e mais respeitoso para os adultos que se formam lá em casa…