Ou vai à luta, ou te conforma

Má-fé é uma expressão cara para os existencialistas. Significa a não assunção da responsabilidade em ter responsabilidade. Ninguém está isento do encargo de escolher nem das consequências das escolhas.

Posso escolher não escolher. Com essa decisão resta decidido que tudo o que me envolve permanece no estado de coisas vigente. Aí, má-fé: atribuição de culpa a outro pela conjuntura que não me agrada.

Qualquer outro é culpado; sou apenas um ausente. Mas minha culpa é exatamente essa: a ausência. Os ausentes envolvem a Sociedade nas consequências de suas escolhas, ainda que sejam não escolhas.

O Brasil é resultado, principalmente, de ações e omissões dos brasileiros. A França (e o mundo) é consequência, entre outras coisas, do ativismo político do existencialista mais engajado e combativo de todos: Sartre.

Jean-Paul Sartre foi professor, filósofo, escritor, teatrólogo, e crítico. Mas foi sobretudo um militante. Defendia e praticava que especialmente os intelectuais estavam obrigados a desempenhar um papel ativo na Sociedade.

Dado que a existência precede a essência, o humano não nasce com determinações nem conteúdos, então, lutar pela qualidade da vida pública é contribuir para que se tenha melhor existência, logo, melhor essência.

A História não limita categoricamente o indivíduo, mas ela produz contingências, ou propiciadoras, ou adversas. Um povo pode “herdar” um país em desordem moral, mas esse povo pode conduzi-lo para outra condição.

A História não renuncia aos seus agentes. A tradição cristã, porém, crê em vontade divina. A mentalidade cristã brasileira de direita e de esquerda não compreende nada sobre a constituição material da realidade.

Não temos o costume de nos arriscar na tarefa de pelejar com a História. Não somos agentes da nossa vida pública. Somos crentes. Acreditamos, à esquerda e à direita, em divindades e em salvadores políticos.

Sigmund Freud: “Qual sua responsabilidade na desordem da qual você se queixa?”. Seja: na lamentação da nossa triste situação política e moral, não teríamos nós, brasileiros, algum consentimento ou responsabilidade?

Não obstante a recente História, uma direita vingativa pede o retorno de facínoras da Ditadura Militar de 1964. Apesar de fatos evidentes, uma esquerda ressentida resguarda um líder demagogo populista e ladrão.

No meio disso, para muitos brasileiros, pouco se lhes dá o rumo do Brasil: declaram-se com nojo de políticos, o que é compreensível; dizem-se desinteressados por política, o que é uma alienação voluntária.

Nos afastamos da res publica, tornando-nos estranhos a ela, desconhecendo as formas de produção de sua realidade, então, o que nela sucede adquire conformações independentes e antagônicas ao nosso interesse.

O mundo político ficou encistado; vive de si para si, à parte do Brasil. O Brasil xinga o mundo político. Os astuciosos da política capitalizam as circunstâncias. Forma-se um nazismo à direita. Forma-se um fascismo à esquerda.

Direita é saudosista do passado macabro: autoritarismo, disciplina social, repressão policial. Esquerda inconformada com a perda do poder: acusa conspiração, desabona a Justiça, desqualifica o “inimigo”; “ou nós, ou eles”.

Os brasileiros podemos mais que isso, mas não haverá solução advinda de meros queixumes. Se queremos outra coisa, a militância se impõe. As eleições estão aí: Incumbe empenho, participação, apoio, candidatura.

Não haverá outros políticos se não houver outros candidatos. Procura a vida política, as atividades de partido. Ou sartreana, ou freudiana, assume responsabilidade. Ou vai à luta e faz hora, ou espera acontecer e te conforma.