Mulheres, e o Legislativo?

Nada! Nas discussões sobre os poderes da República, coisa nenhuma se diz dos candidatos ao Senado ou à Câmara dos Deputados. Todas as energias centraram-se na disputa pela Presidência, como se mais não houvesse.

Há, entretanto. E o Legislativo – Câmara Alta e Câmara Baixa – tem importância equivalente à da Presidência. Todos sabemos, mas, talvez pela emoção da disputa presidencial, não estejamos levando assaz em conta o poder de legislar.

O Legislativo brasileiro tem sido campo de uma disputa ideológica importante. Grupos conservadores, alcunhados BBB, têm se articulado e abiscoitado cada vez mais cadeiras, sobretudo na Câmara dos Deputados.

Bíblia, Boi, Bala, ou Religião, Ruralismo, Repressão. Comunicados por interesses que representam retrocessos em direitos e garantias sociais e nos costumes, essa frente conservadora formou uma aliança ideológica bastante ativa.

Usualmente os políticos que a compõem discursam, atuam e votam em conjunto, com pauta que banca moralismo e retrocesso, derrotando propostas que significam avanços, lutando para reverter conquistas assentadas.

Defendem a família restrita, a redução da maioridade penal, a relativização do direito dos indígenas a seu território, a mitigação da descriminalização do aborto, mesmo em caso de estupro, a imposição de princípios religiosos.

Não há Estado laico para a BBB, então, para os congressistas que a compõem, vale aula de religião, controle do corpo da mulher que “peca”, cura gay, o que seja que lhes pareça que deus lhes “orientou” a votar contra ou favor.

Não almejam o apaziguamento social, pedem uma mão repressora que oprima física e simbolicamente, que imponha ordem a todo custo, muitos justificando execuções sumárias de suspeitos com a máxima “bandido bom é bandido morto”.

De fato, há senadores e deputados que se elegem com esses discursos, que legislam fundados em discursos tais quais esses. Sim, há parlamentares que, honestamente até, acreditam que esses discursos são o melhor para o Brasil.

Religiosos e autoritários, regra geral, não aceitam a diversidade humana, os conflitos de classe, as variadas compreensões de mundo. Querem um humano padronizado, enquadrado nos “bons” costumes, socialmente hierarquizado.

A moldura tacanha em que os conservadores desejam manter a Sociedade, forçando como paradigma os costumes herdados de um patriarcado que já não cabe, atenta, sobretudo, contra a liberdade que as mulheres conquistaram.

Por sua condição insuspeita, trago dados da Exame (https://abr.ai/2McAu7V). Colho da matéria Bíblia, boi e bala: um raio-x das bancadas da Câmara alguns dados. “Para mostrar quais parlamentares defendem quais interesses, a Pública levantou a composição de onze das bancadas mais atuantes.

Além dos ruralistas, que contam com 207 deputados, mapeamos outras gigantes da Câmara: a evangélica (197), a empresarial (208), a das empreiteiras e construtoras (226) e a dos parentes (238), o maior agrupamento da Casa – confirmando a tendência de aumento do número de deputados com familiares políticos.

Adicionamos ainda as bancadas da mineração e da bola, respectivamente com 23 e 14 deputados federais. Também pequenas mas igualmente fortes, pelo teor dos conteúdos que defendem, mapeamos a composição das bancadas da bala (35), dos direitos humanos (23) e da saúde (21)”.

A Frente Parlamentar da Agropecuária, os ruralistas, detém 40% da Câmara. Ela tem viés radicalmente conservador e, em alguns casos, postula seus interesses com tons de ódio, no entender da publicação.

As bancadas da bala e da Bíblia, que efetivamente correm juntas, somadas, alcançam 45,5% da Câmara. Defendem a redução da maioridade penal, o aumento de penas e, principalmente, a revisão do Estatuto do Desarmamento.

Exame destaca ainda, e nesse destaque está o “argumento” com o qual objetivo sensibilizar as mulheres: “Pequenos, mas aguerridos: Diametralmente oposta às bancadas da Bíblia e da bala, está a turma dos direitos humanos.

Apesar do reduzido número de deputados que militam diariamente no combate da opressão às mulheres, à população LGBT, aos índios e populações tradicionais, do racismo e da violência estatal, a mobilização de setores da sociedade e da militância de causas específicas rendeu-lhes algumas vitórias parciais importantes ao longo dos últimos anos, mesmo com somente 23 parlamentares no seu núcleo duro”.

Eis o cerne da questão: deputados que têm agenda com pauta avançada, que têm comportamento congressual avançado, que têm ideologia e trajetória política avançadas. Eles existem e são identificáveis pelas suas votações.

É imperioso que as mulheres se preocupem com o Legislativo. É lá que se debatem temas essenciais para as liberdades públicas. E lá que se engendram legislações libertárias, cruciais para a agenda do feminismo.

Políticos aguerridos também carecem de voto, ou já não estarão no Parlamento. A histórica campanha que as mulheres lideram contra o atraso deve ser completada com o amparo eleitoral aos que auxiliam a construir um melhor futuro.