Moro e Dallagnol trocaram informação sobre casos da Lava Jato, diz site

Uma série de reportagens publicadas hoje pelo site The Intercept mostra que o ex-juiz federal e hoje ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, teria trocado informações com o procurador da República Deltan Dallagnol, coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato em Curitiba, durante as investigações da Lava Jato.

O The Intercept pertence ao jornalista norte-americano Glenn Greenwald, que assina a matéria. Ele ficou conhecido mundialmente após ajudar o ex-analista de sistemas Edward Snowden a revelar informações secretas obtidas pela Agência de Segurança Nacional (NSA, na sigla em inglês) dos Estados Unidos.

Nas supostas conversas, ao longo de dois anos, Moro sugeriu que o procurador trocasse a ordem de fases da Lava Jato, deu conselhos e pistas informais de investigação e antecipou uma decisão que ele ainda daria.

As mensagens também mostram que Moro teria criticado e sugerido recursos ao Ministério Público.

O Ministério Público Federal do Paraná confirmou em nota que houve vazamento de mensagens de procuradores após um ataque hacker. Segundo o órgão, as mensagens não mostram nenhuma ilegalidade.

O ministro Sergio Moro e a Justiça Federal do Paraná foram procurados pelo UOL às 19h e não enviaram resposta até a publicação desta reportagem. As respostas serão incluídas assim que chegarem.

A Constituição de 1988 determina que não haja vínculos entre o juiz e as partes em um processo judicial. Para que haja isenção, o juiz e a parte acusadora –neste caso, o Ministério Público– não devem trocar informações nem atuar fora de audiências.

Em uma das supostas mensagens, em 21 de fevereiro de 2016, Moro teria sugerido a Dallagnol que fosse invertida a ordem de duas operações da Lava Jato. O procurador afirmou que haveria problemas logísticos para que isso acontecesse. No dia seguinte, ocorreu a 23ª fase da Lava Jato, a Operação Acarajé.

Em uma suposta conversa de 27 de fevereiro, Moro teria perguntado a Dallagnol: “O que acha dessas notas malucas do diretório nacional do PT? Deveríamos rebater oficialmente? Ou pela Ajufe [Associação dos Juízes Federais do Brasil]?”.

Em meio a manifestações de rua contra o governo da ex-presidente Dilma Rousseff, o então juiz teria declarado o desejo de “limpar o Congresso”, depois de ser parabenizado pelo procurador devido “ao imenso apoio público”.

“Fiz uma manifestação oficial. Parabéns a todos nós. Ainda desconfio muito de nossa capacidade institucional de limpar o Congresso. O melhor seria o Congresso se autolimpar mas isso não está no horizonte. Eu não sei se o STF (Supremo Tribunal Federal) tem força suficiente para processar e condenar tantos e tão poderosos”, diz a suposta mensagem.

Três dias depois, quando Dilma tentou nomear Lula para a Casa Civil, Moro divulgou uma conversa gravada entre os petistas. A estratégia de divulgação dos áudios foi conversa entre procurador e juiz.

“A decisão de abrir está mantida mesmo com a nomeação, confirma?”, questionou Dallagnol. Moro rebateu, perguntando qual era a posição do Ministério Público Federal, ao que o coordenador da Lava Jato em Curitiba respondeu que era “abrir” e levar a público.

Seis dias depois, com fortes críticas ao vazamento dos áudios, os dois ainda teriam discutido o assunto. Dallagnol defendeu a liberação dos grampos telefônicos e chamou de “ato de defesa.

“Não me arrependo do levantamento do sigilo. Era a melhor decisão. Mas a reação está ruim”, escreveu Moro.

Uma semana depois da conversa, o atual ministro veio a público pedir desculpas pela decisão.

Outro lado

Em nota, a força-tarefa da Lava Jato falou em “ataque criminoso” ao lembrar o ataque de hackers ao celular do ministro Sérgio Moro.

Segundo o documento, os procuradores “mantiveram, ao longo dos últimos cinco anos, discussões em grupos de mensagens, sobre diversos temas, alguns complexos, em paralelo a reuniões pessoais que lhes dão contexto”.

Esses procuradores seriam amigos próximos e, “nesse ambiente, são comuns desabafos e brincadeiras”. “Muitas conversas, sem o devido contexto, podem dar margem para interpretações equivocadas.

Por fim, “a força-tarefa lamenta profundamente pelo desconforto daqueles que eventualmente tenham se sentido atingidos”, mas reitera que nenhum pedido de esclarecimento ocorreu antes das publicações, “o que surpreende e contraria as melhores práticas jornalísticas”.

“De todo modo, eventuais críticas feitas pela opinião pública sobre as mensagens trocadas por seus integrantes serão recebidas como uma oportunidade para a reflexão e o aperfeiçoamento dos trabalhos da força-tarefa”, completou a nota.

Segundo o The Intercept, o site não entrou em contato com procuradores e outros envolvidos nas reportagens “para evitar que eles atuassem para impedir sua publicação e porque os documentos falam por si”. “Entramos em contato com as partes mencionadas imediatamente após publicarmos as matérias”, explicou o veículo.

O site UOL entrou em contato com o ministro Sérgio Moro, mas ainda não obteve resposta.

Depois da publicação da matéria, a hashtag #VazaJato chegou ao primeiro lugar dos Trending Topics do Twitter.