CPI dos respiradores: testemunha diz que governador ‘faltou com a verdade’

Marcia Pauli conversa com um dos advogados que a acompanhava no depoimento à CPI

A ex-superintendente de gestão administrativa da Saúde Marcia Regina Geremias Pauli abriu os depoimentos desta terça-feira (2) da comissão parlamentar de inquérito (CPI) que investiga a compra de 200 respiradores pelo governo de Santa Catarina. Durante as três horas e 47 minutos em que respondeu aos questionamentos dos deputados estaduais ela repetiu as afirmações que já fizera à Polícia Civil e ao Ministério Público, apontando o ex-secretário de Estado da Saúde Helton Zeferino como o responsável pela definição da aquisição dos equipamentos da empresa Veigamed.

“No meu ponto de vista a decisão foi do secretário levando em conta o prazo de entrega para o período entre 5 a 7 de abril”, respondeu quando questionada pelo relator da CPI, deputado Ivan Naatz (PL). Mais tarde, quando o deputado João Amin (PP) voltou a perguntar sobre a responsabilidade da compra, Marcia foi novamente taxativa. “A negociação foi fechada dia 26 de março pelo secretário Helton, que presidia o Coes [Centro de Operações de Emergência em Saúde]”, reafirmou. Ao deputado Fabiano da Luz (PT), ela respondeu que a definição da quantidade e as especificações sobre os respiradores vieram do então secretário-adjunto André Motta Ribeiro.

A testemunha relatou ainda que “foi um erro” a estratégia de gerir a crise do coronavírus no Coes. “Existia uma tensão alta, um temor de que a propagação [da doença] fosse de modo muito rápido e que não estaríamos preparados, fazendo com que as decisões fossem alteradas diariamente”, lembrou. De acordo com ela, já na primeira reunião do grupo, no dia 12 de março, os participantes teriam ouvido tanto do ex-secretário quanto de Motta Ribeiro – que atualmente atende também como titular da Secretaria de Saúde – que “vai morrer muita gente” e que era preciso ter “os equipamentos corretos”.

“O Coes foi um erro gravíssimo e repetíamos isso para o secretário Helton”, citou ao contar que despachava as decisões com três diretorias por whattsapp. “Fomos bombardeados por ordens de gabinetes e de fornecedores, que durante duas semanas e meia circulavam no segundo andar [da sede da Defesa Civil, onde foi instalado o Coes e onde ficava o setor de compras]”, comentou. Marcia chegou a citar que Motta Ribeiro a questionava, via aplicativo de conversa, por qual motivo ela não atendia os fornecedores. “Pedi para impedirem isso [a presença dos representantes de empresas] até dia 2 ou 3 de abril. Aí ganhamos uma sala fechada”, citou.

“O comportamento na segunda quinzena de março foi de velocidade no fazer. Muito ao contrário de uma linha de procedimento padrão”, criticou. Indagada pelos deputados ser houve algum sinal por parte do governo sobre como operar em tais condições, Marcia disse não ter recebido nenhuma orientação.

Outro questionamento feito pelo relator da CPI foi como a proposta da Veigamed chegou até ela. “Recebemos pelo whatsapp do secretário da Casa Civil, Douglas Borba”, respondeu a testemunha. De acordo com ela, o então secretário, que “sempre falava em nome do governador”, passava dados sobre várias empresas deste modo. “Eram fornecedores de testes rápidos, de móveis para UTI, eram várias propostas”, disse ela.

Naatz questionou se havia pressão por parte de Borba. “Para nós, no Coes, vinha no e-mail a orientação para observar que o pedido era do Douglas. Lembro de algumas frases como ‘é decisão de governo, você tem até o meio-dia para atender’ e ‘vocês estão com excesso de preciosismo’”, relatou Marcia. Ainda conforme o depoimento da servidora pública, a intermediação com os fornecedores era feita pelo advogado Leandro Barros, que não tinha nenhuma ligação com o governo, mas teria sido destacado para a função pelo ex-chefe da Casa Civil.]

A testemunha surpreendeu os integrantes da comissão também ao afirmar que o governador do Estado mentiu quando disse, em entrevista à imprensa, que não sabia como funcionava o processo de compra dos equipamentos. “Ele faltou com a verdade”, argumentou. Segundo ela, todos sabiam como era o procedimento. A partir de 12 de março as reuniões eram diárias, com os superintendentes ligados à Secretaria da Saúde, os representantes dos Conselhos de Municípios, e de outras áreas. Todas ações eram discutidas e dali saiam as bases para as ações. E, segundo Marcia, o governador tinha total conhecimento de tudo.

 

Sem coação

Os deputados Kennedy Nunes (PP) e Valdir Cobalchini (MDB) demonstraram preocupação com o que leram nos depoimentos de Marcia para o Ministério Público e para a Polícia Civil. Na ocasião, a testemunha relatou que recebeu ligação de um parlamentar buscando informações sobre a demora para a liberação de um passaporte especial para Onofre Neto, CEO da empresa Exxomed, que iria à China tentar negociar a liberação dos respiradores.

Naatz perguntou se ela viu isso como uma tentativa de coação. Marcia respondeu que em momento algum se sentiu pressionada. “A pergunta era apenas no sentido de saber qual o motivo. Mas eu não tinha como emitir o documento, pois não era minha função”, explicou antes de alegar que passou a situação para a Consultoria Jurídica da secretaria. Como ela afirmou não lembrar quem teria sido o autor da ligação, o presidente da CPI, deputado Sargento Lima (PSL), pediu que a assessoria entre em contato com os 40 parlamentares. “Assim não ficarão dúvidas”.

 

Fonte: Alesc