Albertina Berkenbrock: fé, amor e união da comunidade tornam filme realidade

Liliane Dias
Imaruí

Fé, amor e união de toda a comunidade. Assim, foi possível fazer com que um filme que não disponibilizasse recursos, pudesse se transformar em um sonho realizado. Ou melhor, na realização do sonho de muitos fiéis que se engajaram e abraçaram uma história que elevaria o nome da menina que teve a sua vida interrompida em nome da honra.

A ideia que surgiu em 2013, foi amadurecendo, tomando formas e finalmente teve o seu dia de estreia. Por se tratar de um filme religioso, pode-se até pensar em providencia divina, já que a conclusão das gravações ocorreu pouco antes de a pandemia tomar grandes proporções em Santa Catarina.

Falando em pandemia, até a estreia passa a ser atípica. Como de acordo com as crenças religiosas a família deve sempre estar em primeiro lugar, assim, a estreia do filme será dessa forma. Nesta ‘Quinta-feira Santa’ (11), o filme teve a sua estreia por meio da internet. Em entrevista ao Portal Notisul, o cineasta e idealizador do projeto, Luiz Fernando Machado, conta como tudo começou e os passos para a execução do filme.

Ele conta que estava concluindo a sua formação em cinema, precisou fundamentar a sua monografia e estava na busca de um tema para poder produzir um filme por meio dos processos metodológicos. “Fundamentei minha monografia na ‘estética da sopa de pedra’. Ela integra amadores populares da sociedade em uma produção cinematográfica através de processos pedagógicos”, pontua Luiz Fernando.

Para que o filme pudesse ser executado da forma que tinha em mente, precisaria de um tema, que a sociedade o meio onde fosse produzi-lo, tivesse uma ligação muito forte. “Um orgulho e uma energia mobilizassem e que houvesse boa disposição da população com o tema para trabalhar e ajudar na produção”, explica. Para isso, seria necessário identificar um mito, um herói, um santo ou algo (alguém), que as pessoas tivessem orgulho e interesse de trabalhar e assim participar e aprender na prática.

“Foi quando chegou em minhas mãos, ao acaso, um livro do Padre J J Hellman, ‘O que faz aqui está flor’. Foi nesse momento que conheci a história da beata Albertina Berkenbrock e me encantei. Vi que seria perfeito. Isso ocorreu em 2013. Foi muito tempo amadurecendo a ideia e desenvolvendo o projeto”, relembra.

 

Desenvolvimento

Luiz Fernando conta que acabou desenvolvendo muitos outros projetos como este da estética da sopa de pedra. Que trabalha com a pedagogia popular e fez alguns laboratórios antes de finalmente poder contar a história de Albertina. O projeto teve várias etapas e a primeira delas foi a preparação.

“Neste primeiro momento precisei ir a Imaruí, falei com a prefeitura que me acolheu através da secretaria de Educação num primeiro momento. Depois tivemos apoio da secretaria de Infraestrutura e o apoio da Social. Mas o carro chefe sempre foi a secretaria de Educação que nessa fase de preparação viabilizou os alicerces fundamentais do projeto”, detalha o diretor.

Outra prioridade seria falar com representantes da Igreja Católica, no primeiro momento representado pelo padre Sérgio Jeremias e na sequência o padre Auricélio Costa, os quais tornaram-se supervisores do roteiro cinematográfico.

“Padre Sérgio Jeremias indicou o livro de Albi Israel da Silveira para usarmos como base para descrever a história, por ser mais verídico. Inclusive, há um livro no vaticano, no processo de canonização mais histórico, mais documental. Não tem tanto romance”, destaca.

A partir desse livro e de uma pesquisa de campo, com populares, familiares da beata Albertina, foi desenvolvido o roteiro. O processo de roteiro teve início em outubro, paralelo a isso um curso popular de cinema gratuito, também teve início em Imaruí na ‘Escola do Portinho’, para as escolas do ensino público, no contraturno.

Luiz Fernando conta que cerca de 35 crianças tiveram interesse no curso de cinema. Foi disponibilizado material pela plataforma EAD da Produtora Boa Nova Filmes, que já possuía essa estrutura para o curso. “Através da plataforma EAD tiveram a parte teórica a pratica através das aulas presenciais no salão do auditório do Portinho”, explica.

O mesmo curso um pouco mais aprimorado, foi promovido também para os adultos no período noturno. “Nesse processo já pontuamos algumas pessoas para trabalhar diretamente na equipe técnica”, detalha.

Na sequência, iniciaram os testes de elenco. “Foram dois testes de elenco, um em Imaruí e outro em São Luiz e selecionamos 136 atores populares, anônimos que não possuíam experiência para atuar no filme. E depois chamamos também 16 atores profissionais, uns de Porto Alegre, outros de São Paulo, mas a maioria de Florianópolis”, relata o cineasta.

De novembro a janeiro o trabalho foi focado na pré-produção. “Que seria a preparação de atores, através da Técnica de Meisner, conhecida pela técnica da repetição. Trabalhamos os populares que não tinham experiência para os papeis de coadjuvantes secundários, ou seja, os atores que não tem tanta responsabilidade na atuação”, relata.

Em dezembro trabalhou-se com a preparação de atores e com o setor de arte preparando os figurinos e cenários. “Na pré-produção do cenário, não tínhamos recursos de construir uma réplica da casa de Albertina. O projeto custaria em torno de R$ 5 milhões e como fizemos sem dinheiro, buscamos residências antigas com traços históricos da arquitetura”, explica o diretor.

Foram selecionadas cerca de 12 casas por meio de pesquisa de campo. As famílias davam autorização para que suas residências fossem utilizadas. Algumas transformações foram feitas como arrancar poste, tirar cerca de ferro e colocar cerca de madeira, tapar ar condicionado, tirar antena parabólica, tirar tomadas. Moveis que eram contemporâneos foram substituídos pelos moveis organizado no salão comunitário que serviu de base cinematográfica.

“Deixamos tudo pronto até o final do mês e no dia três de janeiro, oficialmente, abrimos as câmeras iniciando as gravações. Diariamente os atores de Imaruí vinham de ônibus com o transporte logístico escolar oferecido pela prefeitura e tínhamos um cronograma muito apertado. Terminamos as gravações pelo dia 10 de fevereiro. Foram exatamente 37 dias de gravações”, relembra.

 

Protagonistas

Jhulieny Espíndola, de 13 anos, e Suieny Espíndola, de 9 anos, foram as escolhidas para fazer o papel de Albertina Berkenbrock nas duas fases da vida. Seja por destino ou ação divina, a família das duas meninas, já alcançou graças por intermédio da beata.

A mãe das jovens atrizes, Vanessa Tavares Espíndola Francelina, de 29 anos, conta que não consegue descrever o momento vivenciado pela família por meio das meninas. Ela acredita que a beata tenha concedido a oportunidade de agradecer as bênçãos concedidas.

“Acredito que Albertina escolheu elas, pois passamos por momentos que só com a ajuda dos médicos não teríamos superado algumas das dificuldades que enfrentamos”, relata.
Quando mais nova, a sua filha mais velha teve problemas com a visão e a família acredita que recuperação se deu por conta da intercessão da Beata Albertina. “O médico na época disse se eu acreditasse em milagre, poderia acreditar que tinha recebido um. Não foi por acaso que as duas foram escolhidas para o papel”, emociona-se.

Para as meninas foi um prazer e uma honra ter a oportunidade de atuar como Albertina. Jhulieny diz que foi muito gratificante atuar no filme, principalmente porque a família acompanha e conhece bem a história da beata. “Achei que não ia dar conta de fazer tudo, foi uma responsabilidade muito grande e é uma história muito emocionante. Valeu apena e sou muito grata ao Fernando e a Boa Nova Filmes pela oportunidade”, cita.

Já Suieny, disse que o filme significou muito para ela, além disso, fizeram grandes amizades. “Vou levar cada uma dessas novas amizades no meu coração para a vida inteira”, alegra-se. Questionadas sobre outras oportunidades, ambas afirmaram que caso haja um novo convite para atuar, certamente aceitarão.

“Foi uma experiência incrível, mudou minha forma de pensar e se colocar no lugar do personagem é muito emocionante”, acrescenta Jhulieny, que afirma ter sido fundamental o apoio do familiares e amigos.

 

‘Sopa de pedra’

A sopa de pedra é caracterizada pela integração de populares da comunidade do meio e também do comercio, das empresas, das indústrias, é um grande movimento artístico de mobilização social. Luiz Fernando explica que a estética da sopa de pedras entendida pela Boa Nova Filmes, foi o que proporcionou essa mobilização e viabilizou o projeto nas gravações.

 

O filme

No dia 28 de fevereiro Luiz Fernando seguiu para Bolívia, onde montou um laboratório de montagem. Lá foi definida uma tonalidade para o filme. “Por se tratar de um filme de época, optamos em fazê-lo em preto e branco”, detalha.

O cineasta afirma que é preciso salientar o reforço da própria comunidade que trabalhou diretamente ali com cerca de 50 pessoas, todas voluntárias. “Muito trabalho no setor de som, foto, produção arte, voluntários fazendo comida, era café da manhã, almoço, café da tarde e jantar no salão comunitário. Muitas pousadas, restaurantes, mercados, postos de gasolina, materiais de construção, todos eles apoiaram e viabilizaram os serviços”, pontua.

Além repercussão que se espera com o filme, na época, mais de duas mil pessoas estiveram envolvidas diretamente. “Porque no curso foram umas 70 pessoas. Na capacitação para compor a equipe técnica foram mais de 60 pessoas diretamente integradas, mais 130 atores e chegou a 200”, avalia Luiz Fernando.

Sem contar as residências cedidas em que as pessoas acabavam se tornando ‘produtoras de sete’. “Elas informavam onde que as pessoas podiam usar banheiro, onde podiam estacionar, cuidavam do silencio dos vizinhos, então, automaticamente mudavam a sua rotina a casa passava a ser extensão do projeto mantendo uma interação direta”, afirma.

“Teve sena em Rio Fortuna, que teve mais de 500 pessoas, na cena do Corpus Christi, em Imaruí, foram mais de 200 pessoas. Sem contar as que se comprometiam a ir. Doavam alimentos toda a semana da Vargem do Cedro, das associações. Direta e indiretamente, um pouco mais de 2 mil pessoas envolvidas”, avalia.

 

Streaming

A estreia ocorre nesta quinta-feira por meio da internet. Para Luiz Fernando, o streaming em si, não é apenas a exibição do filme Albertina, é muito mais. “Nesse momento em que temos que conviver com a pandemia, as pessoas têm que reinventar seu modo de vida, evitando sair de casa, cuidando de si dos parentes de pessoas mais próximas”, explica.

Assim, esta passa a ser uma oportunidade de se reinventar uma estreia de cinema. “Esse ano não vai ser possível fazer o momento de confraternização pública e religiosa, estamos proporcionando esse evento no dia de Corpus Christi como uma alternativa de comunhão em família, as pessoas poderem curtir e conhecer a história da Albertina em casa”, finaliza.

Para assistir ao trailer do filme acesse o endereço https://vimeo.com/412698125. Já para comprar o filme e assistir em casa acesse https://site.blueticket.com.br/evento/28095.