Uma investigação da Polícia Federal revelou um esquema bilionário de fraudes em aposentadorias e pensões do INSS, com atuação de associações de fachada entre 2019 e 2024. A operação, chamada “Sem Desconto”, foi deflagrada no dia 23 de abril e apontou o desvio de até R$ 6,3 bilhões. As entidades envolvidas descontavam mensalidades diretamente dos benefícios dos aposentados sem autorização, usando documentos falsos e servidores corrompidos para acessar os sistemas do INSS.
Esquema envolvia propina, laranjas e até viagens internacionais
Segundo a PF e a Controladoria-Geral da União (CGU), as fraudes funcionavam por meio de:
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Associações de fachada criadas e presididas por pessoas vulneráveis, como idosos e aposentados por incapacidade;
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Compra de dados de beneficiários mediante propina a servidores do INSS;
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Uso de assinaturas falsas para autorizar descontos indevidos nos contracheques.
Algumas associações compartilhavam endereços e dirigentes. Uma delas, liderada por Cecília Rodrigues Mota, realizou 33 viagens em menos de um ano, incluindo destinos como Paris, Dubai e Lisboa.
Aposentados eram “associados” sem saber
O golpe se concretizava com o cadastramento forçado de beneficiários, muitas vezes sem que eles soubessem. Em alguns casos, um mesmo idoso foi associado a mais de uma entidade no mesmo dia, com erros de grafia repetidos nas fichas, o que indica fraudes em massa.
Um fator determinante para o crescimento do esquema foi a liberação de descontos em lote, sem a autorização individual dos aposentados.
Cúpula do INSS envolvida e lobista era peça-chave
Entre os suspeitos estão servidores de alto escalão do INSS e lideranças de 11 entidades investigadas. Seis suspeitos foram presos, incluindo:
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Alessandro Stefanutto (presidente do INSS, já demitido);
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Virgílio Oliveira Filho (procurador-geral);
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Giovani Spiecker, Vanderlei Santos, Jacimar Silva e Philipe Coutinho (servidores afastados).
A figura central do esquema seria Antonio Carlos Camilo Antunes, o “Careca do INSS”, que movimentou R$ 24,5 milhões em cinco meses e controlava diversas associações fraudulentas por meio de procurações com plenos poderes.
Alcance do golpe: mais de 6 milhões de atingidos
A fraude atingiu níveis alarmantes. Só no primeiro semestre de 2024, mais de 742 mil aposentados pediram cancelamento de descontos que não autorizaram. O total de beneficiários com algum tipo de desconto associativo supera 6,5 milhões. Veja a evolução dos valores:
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1º semestre de 2023: R$ 639 milhões
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2º semestre de 2023: R$ 1 bilhão
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1º semestre de 2024: R$ 1,63 bilhão
Apesar de alertas feitos em julho de 2024, o INSS não havia suspendido os repasses às associações suspeitas até a operação policial.
Apreensões e resposta do governo
Durante a operação “Sem Desconto”, foram apreendidos:
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R$ 1,7 milhão em espécie;
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61 carros de luxo (avaliados em R$ 34,5 milhões);
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141 joias;
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Obras de arte.
Após a repercussão, o governo federal suspendeu todos os descontos associativos e prometeu devolver os valores indevidos. O ministro da Previdência, Carlos Lupi, admitiu demora nas ações mesmo após ser alertado sobre os descontos irregulares em 2023.