“Os recursos devem ser para investimento, não para custeio”

Priscila Loch

Tudo – Como podemos resumir a sua atual gestão na presidência da Assembleia Legislativa?
Gelson Merisio –
O ano de 2015 foi bastante difícil no que diz respeito ao conteúdo dos termos que foram tratados, especialmente nas questões administrativas, problemas que historicamente vinham sendo postergados e encontraram agora a solução. Seja pela participação efetiva do Tribunal de Contas, seja pelo Ministério Público, evoluímos, e na questão legislativa aprovamos projetos importantes para o estado, projetos contundentes, que vão se mostrar relevantes nos próximos anos.

Tudo – O que gostaria de ter feito que ainda não tempo ou não foi possível em decorrência de outros motivos?
Merisio –
Temos um calendário de votação que muitas vezes não é da vontade do parlamentar, impõe-se pela constituição de maioria na casa e também do ambiente que está posto. Nós precisamos evoluir na questão de enxugamento do estado, na transformação de processos que historicamente consomem muito recurso, para que o estado volte a ter capacidade de investimento. Por exemplo, eu gostaria de ter visto as secretarias regionais extintas. Não foi possível porque o governo entendeu que deveriam ser transformadas em agências de desenvolvimento. Agora, para o futuro, na minha compreensão, elas devem ser extintas.

Tudo – Acredita que a transformação das SDRs em agências trará resultados positivos?
Merisio –
Da forma como foi feita, não. A extinção sim. Porque permite ao estado, quando não tiver mais as regionais, fazer a relação direta com a prefeitura e o município. Aliás, o município é onde já existe todo o aparato administrativo, da Câmara de Vereadores para fiscalizar, do engenheiro para fazer o projeto, do advogado para fazer a questão jurídica. Existe uma estrutura formada. As agências vão servir apenas como atividade de meio na construção do relacionamento entre governo estadual e município, que na minha opinião já não é mais necessária.

Tudo – Neste sentido, o senhor avalia que as SDRs acabam funcionando como cabide de emprego?
Merisio –
Não se trata de cabide de emprego, até porque o número de cargos comissionados é pequeno, 340. O que ocorre é que temos ainda 2,3 mil servidores do estado à disposição das regionais. Na prática, produz pouco resultado para as pessoas. Poderiam utilizar estas funções na saúde, na educação, na segurança pública como um todo. Como é que faz isso? Faz como fizemos na Assembleia: estamos extinguindo 411 cargos efetivos. Conforme forem ocorrendo as aposentadorias, esses cargos serão extintos. No caso das SDRs, é a mesma coisa. Quem está tem direito adquirido, tem estabilidade funcional. Se eles não estão em suas funções de origem, há espaço para os cargos serem extintos e possibilitar que outros sejam criados.

Tudo – E a descentralização?
Merisio –
A descentralização efetiva se faz com os municípios. Quando foram criadas, as SDRs tiveram esse condão, mostraram a importância da descentralização. O Fundam agora é a demonstração clara de uma ferramenta administrativa que faz com que o estado e o município tenham uma relação direta, para investimentos, sem necessidade de intermediação, com legislação transparente e clara. Tivemos diversas obras feitas quase que simultaneamente em todos os municípios do estado. O Fundam substituirá com certeza as SDRs, porque não foi preciso SDR para intermediação dos recursos do Fundam, que ocorreram de forma natural. Para quem mora na cidade, não importa se a obra é do município, do estado ou da União. Ela quer o serviço, ela quer a obra, o resultado do recurso que ela paga, independente de qual instância do governo.

Tudo – Até porque as SDRs nem sempre cumprem com esse objetivo, já que os prefeitos acabam tendo que sair de suas cidades e ir até a capital para poder negociar a liberação de determinados recursos.
Merisio –
Isso é um modelo que permanece em vigor e vai permanecer por muito tempo. O que nós temos que criar é legislação horizontal, como é o Fundam, que permita que o estado e o município tenham uma relação direta, institucional, sem a questão político-partidária. O Fundam teve critérios objetivos que independem de que partido o prefeito é.

Tudo – Voltando à questão do enxugamento da máquina, como colocar em prática?
Merisio –
Da mesma forma que fizemos na Assembleia.  Construir o modelo, o tamanho ideal do estado. E, depois desse tamanho definido, construir as avenidas para chegar nisso. De que forma? Identificar aquelas funções que foram sobrepostas, que não precisam mais porque forma substituídas pela tecnologia ou porque foram contratadas lá atrás sem necessidade, e extinguir os cargos à medida que as aposentadorias vão ocorrendo. Não é uma medida de curto prazo, é de médio prazo, mas que tem um efeito brutal no resultado que o estado vai ter nos próximos dez anos.

Tudo – Santa Catarina, em um contexto geral, não foi tão afetada pela crise quanto o restante do país. Por que nosso estado conseguiu manter-se nesse patamar superior?
Merisio –
Por algumas características peculiares de Santa Catarina. Primeiro, pelo modelo econômico descentralizado, com cinco regiões distintas, por ser um estado exportador e se valer da mudança do câmbio, da valorização do dólar para poder aumentar o seu valor de exportação. E também porque tem um governo que fez a sua responsabilidade fiscal efetiva, e está podendo investir em momento de crise. O investimento público hoje em Santa Catarina vai corresponder a 1% do PIB em seu crescimento. Isso é muito para a economia de um estado. Tudo isso somado faz sermos o último a sentir os efeitos da crise. Evidente que os efeitos também chegaram aqui, mas, havendo uma retomada, como se imagina que vai haver, em 2017, 2018, o estado também será o primeiro a poder reagir, até porque, nesse momento de crise, está conseguindo ultrapassar sem aumentar impostos, sem aumentar o custo para as empresas. No momento subsequente à crise, vai ter uma grande competitividade e vai ser o principal destino de investimento do Brasil, com certeza.

Tudo – Que caminho é preciso seguir para continuar a ser promissor, um estado eficiente?
Merisio –
Primeiro, enfrentar os tempos difíceis, como estamos fazendo agora na questão da previdência. Hoje, temos 60 mil aposentados e pensionistas que geram aos cofres do estado um déficit anual de R$ 3 bilhões. No mesmo período, a saúde de seis milhões de catarinenses é subsidiada com R$ 2,8 bilhões. Isso não está correto. Temos que encontrar formas de enfrentar a questão previdenciária de frente, como estamos fazendo, criando uma aposentadoria complementar para os novos ingressos no serviço público, aumentando a contribuição dos atuais servidores, para que o estado possa ter perenidade, a segurança que o servidor vai ter os seus direitos garantidos, e, acima de tudo, enxugar a máquina pública. Temos que reduzir a atividade administrativa, fundindo órgãos e construindo um ambiente onde os recursos possam ser destinados para investimento, não para custeio.

Tudo – Mas existe resistência com relação a essa previdência complementar…
Merisio –
Há resistência do servidor. Na minha visão, uma resistência equivocada, porque o que está se buscando é a garantia do seu direito. Nada adianta ter um direito ideal inexequível por falta de quem pague, que é o que está acontecendo no Rio Grande do Sul e em outros estados brasileiros que tomaram a atitude que estamos tomando agora, quando deveriam ter tomado antes. E por isso mesmo estamos solventes, a expectativa de direito é boa se tiver horizonte de capacidade de pagamento. O que estamos fazendo é garantir o direito dos atuais servidores e construir uma geração dentro de uma nova legislação. Em 2020, esse déficit da previdência vai ser de R$ 7 bilhões. Temos um processo irreversível. Ou se muda agora, criam-se condições de alongamento desse perfil, ou não adianta ter aposentadoria ideal e não ter quem pague porque o estado quebrou. Temos países que passaram por isso. Aqui, temos um buraco aberto, mas ainda há como buscar formas de regularização, de entendermos o tamanho do que precisa ser feito de ajustes.

Tudo – Voltando a falar sobre o futuro de Santa Catarina, como o senhor avalia a importância das parcerias com a iniciativa privada?
Merisio –
Santa Catarina tem um empresariado empreendedor, tem grandes empresa exportadoras, tem um sistema portuário que é único no Brasil – temos seis grandes portos que têm os cinco melhores índices de resposta em tempo, prazo e despacho de mercadorias. Isso tudo nos dá vantagem competitiva perante os demais estados, fruto do empresário, da mão de obra, da cultura catarinense.

Tudo – Um de seus projetos mais defendidos é sobre a súmula vinculante. O que representará na prática?
Merisio –
O Brasil hoje tem 110 milhões de processos tramitando. O grau de recursos que ocorrem hoje em uma decisão judicial é imenso. Precisamos construir legislação que diminua o tempo entre a primeira sentença e a execução das penas. E mais do que isso, que permita que se tenha racionalidade dos processos. Por exemplo, um processo que se estabelece a distribuição de medicamentos. São todos iguais. Se construir uma súmula que julgue um e aplique no primeiro grau a mesma sentença, no Tribunal de Justiça se cria uma economicidade brutal de processos. Isso resultaria em menos tempo, para que os processos pudessem ser julgados, e economizaria muito recurso. Tem um estudo que diz que só na questão de medicamento 30% do volume gasto com saúde é de custo com processos judiciais. A súmula vinculante, depois de debatida e estruturada, racionalizaria a questão jurídica, procurando dar formas para ser mais séria e, portanto, mais justa. O projeto tramita nas comissões e acreditamos que seja votado até o início de 2016.

Tudo – Ainda sobre os tempos difíceis, temos visto os prefeitos reclamarem muito que a distribuição da arrecadação entre os governos federal, estaduais e municipais não é justa e, por consequência, estão no vermelho. Na sua opinião, essa é a realidade ou há um pouco de exagero?
Merisio –
São as duas coisas. Há um desequilíbrio na atribuição de responsabilidade aos municípios, sem a correspondente redistribuição dos recursos arrecadados. Isso vem ocorrendo nos últimos dez anos. De outro lado, há também de se entender que os municípios incharam as suas estruturas administrativas. Temos hoje pequenos municípios com 100 cargos comissionados, 600 servidores. As ferramentas tecnológicas em gestão que se tem hoje permitem que se tenha menos servidores na parte administrativa. Os municípios terão que passar por esse ajuste. Agora, professor, soldado, médico, enfermeiros, entre outros, são atividades fim, que têm que aumentar. Quanto mais serviço prestado, melhor. Fazer essa transição entendendo que os recursos não podem ser só para atividades administrativas é a resposta para o cidadão, que todos procuram e esperam.

Tudo – Mas essa redução de cargos não esbarra nos interesses políticos?
Merisio –
Isso é coisa do passado. Hoje, temos uma ferramenta tão forte, as redes sociais, que permite que a sociedade esteja organizada e informada de forma plena. No passado, as estruturas públicas eram o único canal de comunicação do candidato com o eleitor. Por isso mesmo, tem que se levar em conta o servidor público, que presta um serviço muito importante à população, e também os 95% da população que não são servidores públicos e que precisam ser tratados com respeito.

Tudo – Falando em política, como o senhor avalia o cenário político catarinense hoje?
Merisio –
Em transição. Temos uma geração que está concluindo sua gestão, e essa transição permite que todos tenham oportunidades no futuro para construir o início de um novo momento, o qual eu me incluo.

Tudo – O senhor já falou em outras oportunidades que pretende ser candidato a governador. Quais os encaminhamentos para isso?
Merisio –
Eleição para o governo não pode ser um projeto pessoal, tem que ser uma construção de grupo, uma consideração de ideias. É evidente que quem tem essa vontade – e eu tenho – precisa preparar-se para isso, do ponto de vista pessoal, do ponto de vista de conhecimento do estado, conhecer as estruturas públicas. Estou fazendo tudo que é possível no meu dia a dia. E aguardar que os demais companheiros de partido, de coligação, de aliança possam entender que é projeto viável. Isso se dará com o tempo e no momento oportuno, que será em 2018.

Tudo – Quais os seus planos para 2016?
Merisio –
Em 2016, será feita a elaboração definitiva de um projeto para 2018. A construção de 2018 vai ser feita muito em função do resultado que podemos construir em termos de pensamento de futuro, de boas administrações, de novos quadros, que possam, somadas, resultar em um projeto para o governo de 2018. Por isso que nosso trabalho, nosso esforço será o de estimular, preparar e ter uma visão clara de que precisamos fazer uma grande eleição. Não apenas pelo resultado do dia seguinte, mas pelo resultado da administração que vem a ser feita nos próximos dois anos, que vão ser indicadores de que caminhos devem ser seguidos.