“O cidadão tem que fazer a sua parte para evitar a sonegação”

Amanda Menger
Tubarão

Notisul – De que forma a secretaria estadual da fazenda trabalha para evitar a sonegação de impostos?
Pedro Hermínio
– O estado tem adotado diversas estratégias. Nós temos um planejamento e elencamos prioridades. Temos 18 grupos setoriais, são atividades econômicas de maior relevância dentro da arrecadação. Esse número de atividades pode aumentar ou cair, até porque depende da dinâmica da economia, porque um ramo que hoje é importante pode deixar de ser e outros que não têm tanto destaque podem crescer. Esses setores têm um acompanhamento, um monitoramento do seu faturamento. Sempre que é visto uma queda na arrecadação e não há uma explicação convincente, o fisco analisa o que ocorreu. Se for justificável, tudo bem; se não for, buscará as informações nos relatórios, nos livros e documentos fiscais, nos estoques. Se houver sonegação, pode ser convocado a recolher espontaneamente, ou ainda será aberto um termo de fiscalização e aquela empresa é auditada. Após o levantamento, é visto se houve sonegação; se for, é emitido um ato fiscal e aí o empresário tem 30 dias para recolher, contestar, não dar bola – aí os problemas ficam maiores -, ou parcelar se o montante for expressivo. Se ele pagar à vista, tem desconto de 50% na multa. A multa pode chegar a 150%, assim, se ele deve 100, poderá pagar 100 mais 150; à vista, com o desconto, ele poderá ter que pagar 100 mais 75, ou seja, 175, isso em uma multa de 150%. Uma outra forma: é detectado o problema, uma fraude gritante, uma denúncia, o fisco vai à empresa, faz a fiscalização e notifica.

Notisul – Há outros meios de ‘pegar no pulo’ o sonegador?
Pedro Hermínio
– Temos também a modernização da fazenda, com o sistema SAT. Implementa todos os serviços, porque o contribuinte e o contador não precisam vir à repartição, ele pode remeter as informações do seu escritório. No momento em que ele sabe que tem que repassar as informações para nós, ele sabe que está sendo monitorado, que está sendo fiscalizado. O empresário sabe que, se vender um produto e não emitir a nota, e se o destinatário exigir, for pego no trânsito ou em um trabalho de fiscalização, o estoque não fecha, por exemplo, ele se conscientizará de fazer tudo correto. A organização da arrecadação não é só para fiscalizar, mas também para facilitar a vida do contribuinte e isso é bom para o empresário, porque, enquanto ele gasta tempo para vir à repartição e resolver um problema, poderia estar produzindo, ampliando o seu negócio. Há ainda uma equipe de cobrança, que liga para o empresário com o imposto atrasado. Isso deixa o empresário atento, para que ele não deixe de pagar. Temos também os postos de fiscalização, principalmente nas fronteiras, em Joinville, Mafra, Porto União, Chapecó e Passo de Torres. Claro que há as passagens pelo rio Uruguai, que dificultam um pouco a fiscalização, mas não dá para se combater o tráfico só pegando o usuário, tem que pegar o ‘grandão’, o traficante. Existe uma proposta que é a cerca eletrônica, fiscalização eletrônica, mas ainda está em implantação.

Notisul – De que forma é possível conscientizar as pessoas da importância de se pagar corretamente os tributos?
Pedro Hermínio
– Tem um programa que completou dez anos, a educação fiscal. Eu acho isso fundamental, é a mais importante. Porque você começa com a criança, com a formação do cidadão. Para que as pessoas saibam o que são os tributos, impostos, taxas, contribuições. O que se faz, quais as necessidades, para onde vão, quais os resultados desse dinheiro recolhido com os impostos. Ou seja, por que se solicita uma nota fiscal, onde efetivamente é gasto o dinheiro. Quando você tiver na sociedade, crianças que se tornam adolescentes, um jovem, um adulto que sabe pedir a nota fiscal e que fiscaliza os três poderes – executivo, legislativo e judiciário -, as pessoas, que ele tem essa consciência, a arrecadação irá aumentar e isso será revertido para melhorias na sociedade. Ele será um bom professor, um bom empresário, um bom cidadão. Ele saberá que se estiver sonegando não só receberá o castigo, deixará de encaminhar parte deste dinheiro para obras sociais, educação, saúde, segurança, infraestrutura.

Notisul – E como está o combate à pirataria?
Pedro Hermínio
– Está nas comissões da assembleia legislativa a proposta de lei complementar que cria o Conselho Estadual de Combate à Pirataria e Defesa da Ética Concorrencial (Cecop). A proposta foi discutida exaustivamente com entidades governamentais e não governamentais e espelha-se no Conselho Nacional. Santa Catarina é conhecida por sua capacidade produtiva, recursos naturais, diversidade étnica, criatividade e vocação empresarial. O que contribui para a criação de inúmeros produtos e marcas comercializados em outros estados e no exterior. Destacam-se: vestuário, alimentos e produtos de hardware e software, que sofrem com a falsificação, imitação e contrafação, o que denominamos pirataria, causando enormes prejuízos aos cofres públicos e à sociedade catarinense. Os produtos piratas advêm de ilícitos como descaminho, contrabando e falsificação; sua comercialização leva ao desemprego, provoca concorrência desleal, desestimula o comércio formal, prejudica a arrecadação de tributos, descrédito frente ao comércio internacional, graves riscos à saúde pública, poluição visual causados pelos camelódromos.

Notisul – Quais são as ideias a serem implantadas?
Pedro Hermínio
– Um deles é a Força tarefa ao combate repressivo, com atuação da Polícia Federal e Rodoviária Federal, Civil, Militar e Militar Rodoviária, secretarias de segurança pública e fazenda. O outro é o Programa Antipirataria, que contará com o apoio do Cecopi, secretarias da fazenda, segurança pública e educação, além de prefeituras e promotorias públicas.

Notisul – Você acredita que as pessoas que sonegam não têm noção de que estão deixando de contribuir com a sociedade?
Pedro Hermínio
– Até pode ser que tenham noção, mas não têm isso enraizado. É como um católico, que faz a primeira comunhão, sabe que é importante, mas depois abandona as práticas e só volta quando está velhinho. Ele pode ter os seus motivos para sonegar, mas é concorrência desleal, porque, se estás trabalhando corretamente e o teu vizinho não, fica difícil. Mas não se justifica que ele trabalhe incorretamente, porque depois terá que arcar com o castigo, com as multas, com o pagamento dos atrasados.

Notisul – Como está a troca de informações entre os estados? Isso também ajuda a fiscalizar?
Pedro Hermínio
– Estamos evoluindo neste sentido também. Alguém que vende produtos para São Paulo, por exemplo, e camufla o valor das mercadorias – na primeira nota coloca R$ 100,00 e na segunda R$ 10,00 -, quando a empresa destinatária for fiscalizada e detectarem algum problema, perguntarão onde o empresário comprou aquela mercadoria e acabarão fiscalizando a empresa que vendeu, e aí confrontam os valores e descobrem a sonegação de R$ 90,00. Essa é uma outra forma de pegar o sonegador, pela troca de informações entre os fiscos estaduais e também entre a Receita Federal. E o trabalho não morre aqui. Vai para a procuradoria. Se o contribuinte não pagar, vai para o judiciário, é inscrito em dívida ativa, tem execução fiscal. São formas de trabalho que seguem em outros órgãos.

Notisul – Pedir a nota fiscal é a maior forma do cidadão contribuir para evitar a sonegação?
Pedro Hermínio
– Comprar e vender com nota fiscal é praticar o bom comércio. Às vezes, ele não quer nota porque está com pressa, porque tem vergonha, porque é um amigo. Mas isso não justifica. Se ele não solicitar, está prejudicando a si próprio e a sua cidade, porque, a grosso modo, 25% do valor arrecadado com o Imposto Sobre Circulação de Mercadoria e Serviços (ICMS) fica no município dele. Claro que tem a proporcionalidade, porque, se for só os 25%, uma cidade pequena quebraria e outra grande, como Joinville, ficaria bilionária, então o Fundo de Participação dos Municípios serve para ratear melhor os recursos.

Notisul – Quais os setores com mais problemas para fornecer a nota fiscal, que as pessoas deixam de pedir a nota?
Pedro Hermínio
– O varejo em geral. Não dá para mensurar o varejo em si. Você já deve ter almoçado fora e dificilmente alguém te entregou a nota fiscal. Eu almocei com a minha esposa em uma churrascaria no Rio Grande do Sul e nos deram um recibo, porque a nota estava com o contador, a nota tem que ficar no estabelecimento. E tem ainda o emissor de cupom fiscal, que é uma forma de inibir a sonegação.

Notisul – A tecnologia realmente ajudou o fisco a ser mais eficiente?
Pedro Hermínio
– Sim. Para ter uma ideia, no Imposto de Transmissão sobre Causa Mortes e Doações (ITCMD), se antes arrecadávamos um, hoje estamos arrecadando 300% em cima deste valor. Com a informatização, achávamos que iriam reduzir porque saíam as pessoas que analisavam os processos. Só que amarrou o seguinte, de forma que todos os processos que você fizesse que o imóvel vale R$ 100,00 e você colocava por R$ 10,00, hoje o fisco pode olhar não só o valor, mas também a metragem, a localização do bem e verificar que há problemas, então assim as pessoas estão mais cautelosas, passaram a dizer que vale R$ 80,00. Aumentou a arrecadação e isso nos colocou em evidência no Brasil, porque nós somos modelo de eficiência. Até em Minas Gerais, onde o choque de gestão do governador Aécio Neves (PSDB) é copiado no país inteiro, interessaram-se em conhecer o nosso modelo de ITCMD, o Espírito Santo também gostou. Aquilo que é bom tem que ser copiado. A informatização também desburocratizou o processo, o contador não precisa mais vir à repartição pública com tanta frequência. Hoje, ele vem por outros motivos. Eu digo que ele não é um mero preenchedor de formulários, mas um consultor.

Notisul – Na questão de modernização do fisco, de que forma a nota fiscal eletrônica encaixa-se neste processo?
Pedro Hermínio
– É mais uma ferramenta para evitar a sonegação. Primeiramente, está atendendo as empresas de maior faturamento. Agora em abril, mais setores serão obrigados a se adaptar. A nota fiscal pode não evitar 100% da sonegação, mas você vai emitir o documento e eu terei que ao receber a mercadoria, confirmar os valores, aí o fisco tem todo o banco de dados. Ele não poderá emitir uma nota com dois valores diferentes, ele poderá até subfaturar, mas, dependendo do que ele reduzir, porque poderá passar por uma auditoria, uma fiscalização, terá que ter um outro documento por fora para pagar a diferença. Assim, até que ponto vale sonegar se você precisa do crédito do imposto? A nota fiscal eletrônica veio para facilitar. Quem gerencia o sistema não é a secretaria da fazenda de Santa Catarina e sim do Rio Grande do Sul, mas nós temos especialistas neste setor e os empresários que estão trabalhando com a nota fiscal eletrônica estão muito satisfeitos. Daqui a pouco, a tendência é não termos nada em papel, inclusive os livros-caixa.

Notisul – E como está essa implantação, já que em Tubarão, por exemplo, a prefeitura não tem ainda convênio com o estado para permitir que as notas que recolhem ICMS e ISS sejam expedidas de forma eletrônica?
Pedro Hermínio
– As prefeituras também terão que se modernizar, entrar neste ritmo. Nada contra os municípios pequenos, mas aqueles que têm empresas que precisam deste tipo de nota terão que se adequar, porque senão essas empresas deixam de vender para outras maiores que exigem a nota fiscal eletrônica. Sem estruturas como essa, a cidade deixa de ser atrativa, são empregos que se perdem, fora os recursos de ISS, que deixam de ser recolhidos se o negócio não é concretizado ou se a empresa vai embora. É uma quebra de paradigmas, não dá para fazer de um dia para o outro, mas é preciso agilidade, isso é um processo sem volta.

Notisul – O Conselho de Contribuintes é um diferencial?
Pedro Hermínio
– É, está bastante célere, porque antes era demorado, muitos diziam “ah, vou reclamar, vai para o conselho e eu vou dormir”. Agora não dá para dormir, eles estão trabalhando muito. Com a informatização, a coisa anda mais rápido também. Eu sei que o próprio Conselho de Contribuintes tem duas câmaras, e eles têm um trabalho eficiente, porque o trabalho do fiscal é mais eficiente. Se o fiscal faz um ato correto, dentro da lei, sem vícios, a análise no conselho é mais rápida; quando há questões de interpretação da legislação, aí é um pouco mais lento. Ele não evita que o contribuinte apele para o judiciário, mas é mais uma opção para resolver os problemas.

Notisul – O sistema tributário brasileiro é realmente complicado?
Pedro Hermínio
– É complexo. O Sindicato dos Fiscais da Fazenda de Santa Catarina, ligado à Federação Nacional, à Fenafisco, tem uma proposta de reforma tributária, porque não concorda com diversos pontos do texto apreciado no congresso. Eles dizem que a carga tributária não diminuirá, não acabará com a guerra fiscal, que é um outro problema, aliás, vai acirrar a guerra. Os grandes tributaristas dizem que este não é o momento para aprovar do jeito, porque não trará o resultado que se espera. Vamos ver o caminhar, se as sugestões da Fenafisco serão acatadas. Por outro lado, não adianta também fazer a reforma e não cortar gastos, tem que haver uma contenção. E aí passa pelo bom gestor. Não adianta eleger um prefeito, um governador ou colocar um gerente se ele não tem conhecimento, ética, se não tem preocupação com a redução dos custos. E reduzir custo não é não comprar equipamentos, não ter estrutura, não ter qualidade, é não gastar com excedente.

Notisul – Quais os pontos a Fenafisco não está de acordo?
Pedro Hermínio
– Não irá reduzir a carga tributária, ao contrário, pode ainda aumentar. A Fenafisco alerta que, com a criação do IVA-F – imposto de valor agregado federal -, se utilizará uma nova base de cálculo, inédita, que ultrapassa em muito a somatória das bases do ICMS e do ISS. Everaldo Maciel, ex-secretário da fazenda, diz que haverá intensas batalhas entre empresários e entes federados na justiça, por problemas de interpretação. Osíris Lopes Filho, que faleceu recentemente, dizia que o IVA unifica vários tributos, mas deixou de fora o IPI, ISS e ICMS, esses impostos também serão cobrados junto com o IVA-F. A proposta já foi discutida à exaustão, mas pode ainda ser melhorada.

Notisul – Quais as novidades para os contribuintes e contadores que vierem à sede da regional da secretaria da fazenda?
Pedro Hermínio
– Vamos implantar uma sala vip de atendimento, os nossos clientes, quando chegarem, serão atendidos por um funcionário, que tentará solucionar os problemas sem ter que passar para outros servidores. Além disso, haverá computadores à disposição dos contribuintes para fazerem consultas e tirarem dúvidas. Isso será feito em Joinville, Florianópolis e Tubarão, que foram escolhidas para testar essa nova forma de atendimento. O prédio também passará por uma reforma com pintura e colocação de novas placas de indicação, porque a procuradoria funciona junto. Nós teremos uma reunião aqui em Tubarão com o secretário estadual da fazenda e os gerentes regionais, daqui a 60, 70 dias, e veremos se ele poderá reinaugurar o prédio na oportunidade, mas queremos dispor desta sala de atendimento antes disso. Queremos ainda marcar uma palestra com os empresários e o secretário.