“Faltou agressividade para evitar o surto da gripe A”

Rogério Sobroza de Mello é médico formado na Universidade Federal do Paraná (UFP), em Curitiba, e fez especialização em infectologia e residência médica no Instituto Emílio Ribas, em São Paulo. Rogério está há 12 anos em Tubarão e escolheu a cidade por questões profissionais, considera que o município tem um bom perfil na área da saúde. É casado com Simone Arezio de Mello e tem duas filhas, Laura e Sofia. Atualmente, trabalha na Clínica e Consultoria de doenças infecciosas, é professor da Universidade do Sul de Santa Catarina (Unisul), atende pacientes internados nos hospitais Socimed e Nossa Senhora da Conceição (HNSC), e também faz parte da equipe de do programa DST/Aids da prefeitura de Tubarão.

Eduardo Zabot
Tubarão

Notisul – Que experiência o surto da gripe H1N1 deixou para Tubarão?
Rogério
– Na verdade, não só para Tubarão, mas uma experiência no mundo inteiro, porque havia uma grande preparação para um surto da influenza, havia um plano estabelecido e isso não deu certo. Houve uma falha terrível na época, porque o plano era para não deixar se espalhar pelos países a gripe. E, mesmo depois que a gripe chegou, demorava muito para se ter um diagnóstico.

Notisul – E como isso se refletiu em Tubarão?
Rogério
– Na época, se pensava em não causar pânico nas pessoas, mas a propagação do vírus é muito rápida, e hoje, se olharmos para trás, percebemos que os casos de propagação foram em alguns dias. Então, levasse-se uma semana para tomar atitudes, e isso acabou sendo tempo demais. Esse foi um reflexo da influenza em Tubarão.

Notisul – Por que houve falha?
Rogério
– Porque fomos pouco agressivos. O plano de contenção deveria ter sido maior, não causar pânico, discriminação, ou seja, quando a gripe estava em um país, o ideal era bloquear a vinda de qualquer pessoa e não só pessoas que estavam com a gripe. Muitas pessoas não sentiam a influenza, mas acabaram espalhando o vírus.

Notisul – E foi assim também nas cidades?
Rogério
– Nas cidades, faltou a prevenção, ou seja, as recomendações de evitar aglomerações, por exemplo, deveria ter sido mais precoce. Quando apareceram os primeiros casos, já deveria ter uma estrutura montada para fazer a detecção rapidamente para tomar mais medidas agressivas para evitar que o vírus se espalhasse tão rápido.

Notisul – As pessoas não levaram a gripe A, a sério?
Rogério
– A maioria das pessoas tomou atitudes positivas em relação à transmissão. Até hoje, é possível ver o uso do álcool em gel para higienizar as mãos. Mas infelizmente outras não se importaram e isso também contribui, sim, para o vírus se espalhar.

Notisul – E o vírus da influenza H1N1 está extinto?
Rogério
– O que ocorreu com ele é que aos poucos o vírus vai se integrando dentro da cepa sazonal da influenza, ou seja, a maior parte das pessoas já contraiu ou já se vacinou, então, já tem um pouco de imunidade. Assim, o vírus não tende a causar doenças tão graves. Todo vírus influenza sofre mutações ao longo dos anos, então, é esperado que em alguns anos não sabemos precisar, pode ser 20, 40 anos, podemos ter outra cepa pandêmica de influenza. E é bom planejar, quando tiver, o que vamos fazer. As autoridades de saúde no mundo devem pensar e planejar para ser mais agressivo contra o vírus, se vier.

Notisul – Tomar a vacina contra a gripe é importante?
Rogério
– A vacinação contra a gripe hoje é o principal da prevenção do influenza, é muito eficaz. O problema é que muitas vezes ela é usada muita tarde, ou seja, uma vacina contra influenza demora 15 dias para começar a agir no organismo da pessoa. Então, se ela tomar a vacina hoje e tiver contato com a influenza daqui uma semana, a pessoa vai pegar gripe. O período ideal para tomar a vacina é março, até 15 de abril.

Notisul – Os cuidados devem continuar?
Rogério
– Sim, esses cuidados são não só para evitar a influenza, mas é muito comum as doenças de pele e viroses. São vários os tipos de doenças que podemos pegar pelas mãos, então, esses cuidados de higienizar com álcool gel, lavar bem com sabonete, são fundamentais.

Notisul – Falando um pouco sobre Aids, os números da doença são preocupantes em Tubarão?
Rogério
– Sim, em Tubarão existem duas doenças que preocupam bastante, a Aids e a tuberculose. O município está entre as 50 cidades do país com número alto dessas doenças.

Notisul – Existem motivos específicos para isso?
Rogério
– Os fatores que causam essas doenças são semelhantes. Um dos principais fatores é o uso de drogas ilícitas, especialmente o crack e a cocaína, porque as pessoas perdem a noção do que estão fazendo, ou seja, praticam sexo sem preservativo, não se alimentam e ficam desnutridos e em contado com as pessoas aumentam a transmissão da Aids e da tuberculose.

Notisul – Que ações podem ser tomadas para evitar o aumento do contágio?
Rogério
– Hoje, já existem várias ações para tentar controlar a Aids, em relação ao uso de drogas, por exemplo. Programas em alguns municípios de Santa Catarina, como Itajaí e Balneário Camboriú, de troca de seringas, fazem com que o cidadão receba novas seringas para consumir a droga e evita estar passando um para o outro. Isso não diminui o uso de drogas, mas diminui a transmissão do HIV.

Notisul – Muitas pessoas acreditam que esse tipo de programa não incentiva o uso de drogas?
Rogério
– Esse fator isoladamente não aumentou o número de usuários de droga em local nenhum, não é proibitivo de ser fazer isso, mas penso que é uma medida auxiliar, paliativa. Mas a medida mais importante é você conseguir fazer com que se use menos as drogas ilícitas.

Notisul – Os números de pessoas com câncer também estão crescentes. Qual o motivo?
Rogério
– O câncer é uma doença que tem fatores ambientais associados. O câncer de pele vai depender mais da exposição solar e pessoas com pele clara têm uma tendência maior para a doença. Outra situação é a condição de trabalho em contato com substâncias cancerígenas e as condições regionais, aqui especialmente em relação à produção do carvão. Outro fator da doença é genético. Tem algumas formas de controle. Até câncer do colo do útero, que é causado pelo HPV, é preocupante.

Notisul – Podemos acreditar na cura para o câncer?
Rogério
– Eu acredito que a cura de grande parte dos cânceres esteja bem próxima. Hoje, nós dispomos de muita tecnologia para o tratamento do câncer e o entendimento de como funciona a doença está cada vez maior. E por isso acredito que dentro das próximas décadas nós teremos grande parte da doença curável.

Notisul – E a cura da Aids?
Rogério
– Nós tivemos um anúncio recente de uma criança que, ao nascer, foi iniciado o esquema antiviral para ela e conseguiu eliminar o vírus, mesmo já tendo contraído a doença. Então, numa fase muito precoce da infecção pelo HIV, algumas pessoas que são menos sucetíveis à transmissão de uma célula para outra do vírus elas poderiam até contrair e não se estabelecer a infecção. Tem outro caso anterior de uma pessoa que fez um transplante de medula óssea, mas esses casos não nos dizem que podemos esses métodos para curar uma pessoa, mas esclarece muita coisa em relação ao modo que o HIV age no organismo e essas pistas vão levar os pesquisadores à cura da doença no futuro.

Notisul – Quem está mais doente hoje, o homem ou a mulher?
Rogério
– Infelizmente, os homens têm menos cuidado com a saúde do que as mulheres. Então, a gente vê que elas têm uma longevidade maior e também uma qualidade de vida melhor. As mulheres estão menos expostas ao uso do cigarro e da bebida. Quando chegam na terceira idade, é notável a melhor condição da mulher em relação ao homem.
Notisul – Muitas doenças poderiam ser evitadas se tivéssemos uma melhor prevenção?
Rogério – Existem muitas coisas hoje em relação à prevenção e que a gente deve sempre pensar que o dinheiro que nós investimos em tratamento fosse usado na prevenção, com vacinas em dia, boa alimentação, exercício físico, que são muito baratos e você estaria prevenido e evitaria transtornos com doenças que a pessoa não precisaria ter.

"Todo vírus influenza sofre mutações ao longo dos anos, então, é esperado que em alguns anos, não sabemos precisar, pode ser 20, 40 anos, podemos ter outra cepa pandêmica de influenza. E é bom planejar. Quando tiver, o que vamos fazer? As autoridades de saúde no mundo devem pensar e planejar para ser mais agressivo contra o vírus, se vier."

"Devemos investir mais em prevenção, exercícios, boa alimentação, vacinas em dia. Tudo isso pode evitar doenças no futuro”.

“Já temos experiências positivas, que esclarecem muita coisa em relação ao modo que o HIV age no organismo, e essas pistas vão levar os pesquisadores à cura da doença no futuro”.

Rogério por Rogério

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