“Dejeto não é um problema. É solução!”

Wagner da Silva
Tubarão

Notisul – Quando você passou a se interessar pelo reaproveitamento de dejetos?
Bora
– Em Concórdia, região de maior produção de suínos do estado, quando pouco se falava em poluição, questões ambientais, fiscalização. Não acredito que tinha esta consciência, e as granjas eram construídas próximo a rios. Investíamos no tratamento deste problema e tínhamos o projeto das bioesterqueiras. Eram dois tanques cobertos, onde o dejeto fermentava por cerca de 120 dias e depois era distribuído na pastagem. Outro sistema era o biodigestor, usado pelos indianos há milênios, mas possuía pouca capacidade de produção de gás, e que não emplacou na época.

Notisul – O que você viu nos dejetos que te motivou a trabalhar com isso?
Bora
– O dejeto suíno é considerado um dos principais poluidores das águas, mas também uma poderosa fonte de adubo orgânico, principalmente se levarmos em conta o plantel catarinense e brasileiro de suínos. Ele pode transformar-se na maior fonte de adubo orgânico do Brasil, a custo relativamente barato para os produtores, já que o insumo encontra-se nas propriedades, substituindo o adubo mineral NPK com muito mais eficiência, já que possuem muito dos micronutrientes que as plantas precisam.

Notisul – Por que o dejeto causa tanto desconforto às pessoas?
Bora
– O problema não é o dejeto, mas a maneira como é trabalhado. Ele é uma alternativa de adubação barata. Nossa região produz cerca de três mil metros cúbicos de rejeito, mas 70% disso é água. Os outros 30% são formados por sais minerais, restos não digeridos de milho e soja. Temos que reduzir ao máximo a quantidade de água desperdiçada, reduzir a água nas granjas em 50 %

Notisul – Como se faz isso?
Bora
– Através do uso de bebedouros racionais, evitar a lavação de granja com esguicho, não deixar vazamentos, nem torneiras abertas. Com isso, o consumo de água cai para algo próximo de quatro litros/dia/suíno. A economia em utilizar os dejetos como adubo pode dar ao produtor um carro zero por ano, dependendo de seu plantel. E olha que a legislação só permite o lançamento na lavoura após 120 dias de fermentação.

Notisul – O dejeto suíno também pode gerar energia e aquecimento, como andam os projetos neste sentido?
Bora
– O dejeto pode ser praticamente 100% reutilizado. Antes da adubação, ele pode ser usado em usinas de biomassa, biogás e ser purificado, como combustível veicular. A compostagem também foi testada e, apesar de seu custo, pode agregar valor aos dejetos na propriedade.

Notisul – Houve algumas ações para tentar implantar algumas usinas para reaproveitamento. Por que não funcionaram?
Bora
– A meu ver, faltou interesse. Em 2001, implantamos um sistema de biogás em Orleans, na propriedade de Valério Mazzon, a primeira a produzir energia e jogar na rede comum. Mas a cooperativa de eletrificação não quis, pois, em vez de consumir, eles tinham que pagar ao produtor. Hoje, é vista de forma diferente. Se tiver nos parâmetros exigidos pela Anatel, pode ser estudada. Outro que não foi à frente ocorreu em Braço do Norte. A Epagri, em parceria com uma empresa do interior paulista, tentou implantar há alguns anos uma usina de biomassa. Com o dejeto, ela produziria óleo e carvão que seria utilizado nas caldeiras para gerar energia. O projeto era bom, mas o poder público não deu atenção. São Ludgero ficou interessado, mas o proprietário do terreno supervalorizou as terras e não foi possível levar adiante.

Notisul – A Epagri possui alguma projeção neste sentido?
Bora
– Sim. Voltamos às negociações para a usina de biomassa. A prefeitura de Grão-Pará mostrou interesse, mas a conversa ainda precisa evoluir. Se todo o dejeto e outros resíduos, da indústria madeireira, plástico, florestais da região fosse recolhido, hoje teríamos uma produção de 12 a 28 megawatts de energia. Isso representa praticamente o consumo das duas maiores cidades do Vale.

Notisul – Qual o motivo que o leva a acreditar tanto na produção de energia e fertilizante através do lixo e dejeto?
Bora
– Temos a característica de ser um povo trabalhador, somos ricos em dimensão e em recursos naturais, mas há questões ambientais a serem resolvidas. Ele pode ser utilizado em usinas de biomassa, biogás e compostagem, além da bioesterqueira, e da adubação orgânica, que ajuda a agricultura e a pecuária. Além de usar o dejeto para adubar a terra e gerar energia, ele mostrou ser uma importante alternativa na piscicultura. Temos tecnologia, mas não incentivo para executar os projetos que conhecemos, implantar e avaliar seus resultados.