“As metas abusivas são nosso maior problema”

 

Armando Machado Filho nasceu em 28 de abril de 1956, é natural de Jaguaruna, tem 56 anos. Casado, tem duas filhas que compartilham da mesma formação, são advogadas. Filho de farmacêutico, sonhava em estudar medicina, entretanto, não passou no vestibular. Cursou administração na PUC, em Porto Alegre, ciências contábeis e, por fim, encontrou-se na área do direito. Trabalhou no Besc, hoje é funcionário do Banco do Brasil. É bancário há 34 anos, e advoga há 24 anos, atua na área civil, criminal e trabalhista. Presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Tubarão e Região, desde 1996. Enfrentou quatro eleições sindicais. Durante a última, mesmo com chapa de oposição, conquistou 90% dos votos dos bancários. Armando ama o trabalho, garante que sempre buscou defender as pessoas, e assume que por isso encontrou no direito a sua realização profissional.   
 
Fernando Silva
Tubarão
 
Notisul – Por que é comemorado o dia do bancário no dia 28 de agosto? 
Armando – Os bancários têm um envolvimento histórico, somos uma categoria muito bem organizada. O dia 28 de agosto, por exemplo, comemora-se o dia do bancário porque em 1951 houve uma greve muito grande no Brasil, durou 69 dias. Essa greve arrancou, além de melhores condições de trabalho, 30% de reajuste na época. Devido a isso, é comemorado o dia em função da maior conquista da categoria até hoje. 
 
Notisul – As greves continuam ainda hoje por que existe a constante luta dos bancários contras os banqueiros?
Armando – Os funcionários do Banco do Brasil tinham altos salários, era como ser empregado federal hoje, tinha estabilidade e bons salários. Era uma boa época para a categoria e, a partir do Collor, com a caça aos marajás, ele acabou centrando essa fúria toda na categoria, especialmente nos funcionários do Banco do Brasil. Então, começou a inflação e os salários não eram ajustados no pagamento, o que causou grandes danos. Houve um declínio muito acentuado para a remuneração dos funcionários.
 
Notisul – No governo de Fernando Henrique Cardoso, houve menos greves. Existia o medo da privatização?
Armando – Com Fernando Henrique no poder, houve muita pressão sobre a questão da privatização de tudo, incluindo a do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal. Eu acredito que ele não o tenha feito por falta de tempo. De qualquer forma, nesse período era muito difícil se fazer a greve. O pessoal vivia com muito temor, pressão e tudo mais. Isso tudo por causa do medo da privatização. Os bancários começaram a decolar novamente no governo Lula, sem fazer apologia ao governo, mas, para os trabalhadores, principalmente os bancários, foi um governo importante. No governo do Fernando Henrique, houve os Planos de Demissão Incentivada (PDI) no Besc, onde eu trabalhava, e na época já fazia parte do sindicato. Com o PDI, o estado comprava os empregos e preparava os funcionários para a privatização, afinal, seria muito difícil arrematar o Besc, já que haviam funcionários com até 30 anos de casa. Era uma conta muito alta. Uma fortuna incalculável. 
 
Notisul – Qual foi a posição do sindicato sobre essa situação de compra de empregos?
Armando – Na época, fomos o único sindicato a assinar esse acordo por pressão, fui inclusive ameaçado de morte, por bancários endividados e que precisavam do dinheiro. O sindicato tentava convencê-los de que não valia a pena realizar aquilo e cerca de oito meses depois foi comprovado que nos tínhamos razão. Hoje, encontram-se muitos funcionários do Besc em situação dificílima, menos aqueles que saíram já aposentados. Teve gente que ganhou cerca de R$ 400 mil, o que é um bom dinheiro, mas depois enfrentaram dificuldades. Lembro que na época realizamos assembleias com muito mais de 200 bancários presentes, e sempre combatemos que não deveriam vender a estabilidade de seus empregos.
 
Notisul – Mas e para aqueles que optaram em manter o emprego e acabaram incorporados no Banco do Brasil, como foi?
Armando – Como eu tinha uma postura sindical de não aderir ao PDI, não poderia como bancário aceitar a proposta. Optei pela carreira no banco e hoje fico muito contente de ter tomado essa decisão.
 
Notisul – Voltando para a questão das greves, hoje os bancários então buscam o que perderam durante o governo Collor, já que não foi possível reivindicar isso no governo FHC?
Armando – Exatamente. Nós estamos a passos lentos recuperando isso, mas a cada ano que passa isso vem melhorando. A partir do governo Lula, nós estamos conseguindo a cada negociação, de 2% a 3% de reajuste sobre a inflação. Apesar de ainda acharmos o piso salarial baixo, achatado, com relação ao que era o do Banco do Brasil antigamente, estamos nos fortalecendo. 
 
Notisul – Que outros fatores influenciaram no desemprego da categoria?
Armando – A informatização caiu como uma faca de dois gumes, gerou muito desemprego. Hoje, existem agências bancárias do interior, agências pequenas, com três funcionários. Como em Jaguaruna, por exemplo. Uma função que vem sido substituída nos bancos é a dos caixas. O bancário tem que estar preparado para novos tempos, as pessoas hoje utilizam muito o auto-atendimento, como o internet banking. As pessoas estão se acostumando com não precisar do auxilio para realizar as operações. 
 
Notisul – As operações internas dos processos bancários também contam com menos funcionários, mas isso facilitou a jornada de trabalho. Qual era a jornada de trabalho antiga?
Armando – Não há dúvidas de que a tecnologia teve um papel muito importante, e ainda tem, entretanto, o rumo que se tem tomado é o de não aliar tecnologia ao atendimento humanizado. O ponto positivo foi o de que antes o bancário entrava na agência e não sabia a hora em que poderia ir para casa. A jornada era irregular, amanhecia e às vezes dormia no banco quase. O volume de empregados era muito maior. Hoje uma série desses atendimentos as pessoas acabam realizando sozinhas pela internet ou auto-atendimento.
 
Notisul – Durante as greves, muitas pessoas recorrem às agencias lotéricas e pontos cadastrados para pagar contas. Ainda existe uma certa dificuldade com o auto-atendimento. Como você avalia a questão desses estabelecimentos?
Armando – Hoje, os bancos são voltados para as grandes operações, e estas continuam. Existe uma série de questões que deve ser revista sobre esse caso. As pessoas que trabalham ali realizam as mesmas tarefas que os bancários, recebem menos, e é uma verdadeira exploração de mão de obra. Não conseguimos ainda incluir esses funcionários na condição de bancários.
 
Notisul – O que falta para incluir esses trabalhadores?
Armando – Primeiro, teríamos que fazer a mudança de todos os estatutos dos sindicatos de bancários para incluir esse pessoal. Existe outra força buscando criar um sindicato para essas pessoas. 
 
Notisul – Você comentou sobre o horário de trabalho dos bancários, as pessoas acreditam que o bancário começa a trabalhar às 11 horas e saem às 16 horas…
Armando – Após o horário de atendimento ao público, ainda precisa-se finalizar as transações, completar os serviços. O bancário trabalha antes e depois. Felizmente, hoje, devido a algumas ações que fizemos, o funcionário bate o ponto e recebe a hora extra, mas ainda há casos onde se bate o ponto, continua-se trabalhando e não se recebe essas horas adicionais de trabalho.
 
Notisul – Além da questão salarial, os bancários constantemente entregam diversas reivindicações durante as greves. Qual seria a principal luta hoje, além do reajuste salarial?
Armando – Os bancários sofrem na pele com as metas abusivas. A cada mês, os bancos estipulam metas e serviços, e você tem que  atingir essas metas. Só que o bancário não consegue, é humanamente impossível. Sempre há novas metas. Temos bancários que preferem não ter o reajuste, do que as metas abusivas. Metas são importantes para o desenvolvimento de um trabalho. Mas a forma como são feitas é errônea. Isso nós lamentamos profundamente e estamos tentando combater com muita seriedade.
 
Notisul – Esse estresse gerado por uma cobrança todos os meses causa algum tipo de problema de saúde aos funcionários?
Armando – Sim. Hoje temos bancários com sérios problemas de saúde, como depressão, e nos combatemos muito esse assédio moral. Esse assédio por questão de hierarquia acaba caindo no gerente, que por sua vez exerce sobre os seus subordinados. Isso é uma loucura e é o que mais se enfrenta hoje. Acaba se criando uma bola de neve e que causa uma grande diversidade de problemas de saúde relacionados ao estresse. Trabalha-se sobre ameaça de transferência, de demissão, e alguns gerentes não têm a sensibilidade de filtrar isso, recebem a cobrança muito forte,  e passam da mesma forma para os funcionários, criando um pânico. Muita gente sofre com isso. Na rede privada, é mais grave essa questão.
 
Notisul – E a questão de segurança? Existem muitos riscos relacionados aos bancos, entre eles os assaltos. Como você avalia essa situação?
Armando – Quem usa o auto-atendimento hoje, por exemplo, é o principal alvo de bandidos. Do primeiro ao quinto dia útil, para receber o salário, você vai sacar no caixa automático e encontra-se no meio de um aglomero de pessoas, e você fica desprotegido. Claro que nos preocupa a questão do bancário, mas é ainda mais preocupante a questão das pessoas que usam o auto atendimento. Elas não têm nenhuma segurança. As portas giratórias são formas de inibir ações criminosas, criam uma dificuldade ainda maior, mas os terminais ficam todos do lado de fora das portas giratórias. Quem fica mais vulnerável é o idoso, o pequeno portador. Colocou o pé fora do banco o cidadão é uma vítima em potencial. 
 
Notisul – Existe uma grande divergência de opiniões sobre a questão das portas giratórias, muitas pessoas não concordam com ter que passar essa dificuldade em entrar na agência.
Armando – Sim, inicialmente também houve uma resistência dos bancos em pôr as portas. As pessoas que não concordam ou aceitam nunca passaram por uma situação onde a porta giratória inibiu a ação criminosa. Eu fico muito satisfeito e me sinto seguro quando atravesso o detector de metais e sou bloqueado por uma moeda ou um celular no bolso. É a prova de que o sistema funciona.
 
Notisul – O cumprimento de uma lei municipal que obriga manter vigias em bancos durante o funcionamento do caixa automático tem sido cobrada. Qual a sua opinião sobre isso? 
Armando – O vigia está orientado para não reagir. A segurança é responsabilidade do estado. O vigia não sai do banco para impedir um assalto. Isso é obrigação da polícia. O vigia, na realidade, está ali para acalmar a situação e permitir que tudo ocorra de maneira tranquila e sem grandes perdas. Acredito que ele não deva reagir em momento algum. Claro, as câmeras, os vigias e as portas giratórias são todos fatores importantes, eles inibem os assaltos, reduzem os assaltos. Isso é comprovado. Sobre o horário de atendimento, nós advertimos e pedimos para que as pessoas evitem utilizar o saque automático já após as 18 horas. Não é recomendado. Elas estão desprotegidas. Tendo o vigia ou não.
 
Armando por Armando
Deus – É o meu norte.
Família – A estrutura.
Trabalho – Dignidade.
Passado – Saudade.
Presente – Projeto para dias melhores.
Futuro – A deus pertence.
 
"Há 20 anos, quando eu vim para o sindicato, nós tínhamos associados aqui mais ou menos 1,3 mil".
 
"As agências abrem às 11 e fecham às 16 horas, mas o funcionário continua lá dentro. As pessoas não se dão conta disso.”