“A quantidade de leitos não supre mais a nossa necessidade”

Zahyra Mattar
Tubarão

Notisul – Como foi a vinda da senhora para Tubarão?
Irmã Jacira
– Antes de vir para cá, minha atribuição na Congregação Divina Providência era a de diretora da área de medicina alternativa. Com a eleição da Irmã Enedina para presidir a Sociedade Divina Providência e integrar a coordenação da Província do Coração de Jesus, ela foi para Florianópolis e me perguntou se eu não poderia vir. Eu aceitei. É um desafio. Fui diretora, por cinco anos, do Hospital e Maternidade São José, em Jaraguá do Sul, hoje já de médio porte, mas nunca tinha me visto à frente de algo tão imenso como o HNSC. São 405 leitos para pacientes do Sistema Único da Saúde, o que nos dá o status de ser o maior em número de leitos pelo SUS em Santa Catarina, e 908 colaboradores. É muito grande, muita gente (risos).

Notisul – Como está sendo esta experiência? É muito diferente das anteriores?
Irmã Jacira
– Tem algumas diferentes, sim. O HNSC é uma instituição de alta complexidade e um hospital realmente complexo. Nos hospitais por onde passei, por exemplo, não tinha tido muito contato com a medicina nuclear. Aqui, tem serviços diferenciados dos nossos outros hospitais. O de Tijucas (Hospital São José e Maternidade Chiquinha Gallotti), por exemplo, é bem pequeno, básico. Há apenas procedimentos básicos: internação e pronto socorro. O (hospital) Santa Isabel (em Blumenau), onde comecei, já se diferencia por ser muito voltado para os transplantes. Já aqui, encontrei uma instituição de alto nível, com equipamentos de ponta e uma equipe inacreditavelmente excelente e comprometida. No fim, tirei a sorte grande.

Notisul – O HNSC é uma instituição movimentada o dia inteiro, mesmo porque tem caráter regional. Isto não a surpreendeu em comparação com as outras instituições da congregação?
Irmã Jacira
– Muito. Assim que cheguei, percebi a importância do HNSC para a cidade e para a região. Concluí isso justamente pelo movimento em todos os setores, especialmente na emergência. Costumo brincar, mas é uma realidade, o HNSC parece um ponto turístico (risos).

Notisul – Hoje, a senhora sente-se um pouco melhor adaptada?
Irmã Jacira
– Sim, cada dia melhor. Quando cheguei, aventurei-me a fazer uma visita pelo hospital sozinha. Chegou um momento que eu não sabia mais por onde tinha passado. Pensei comigo: vou é embora, porque vai que já passei por aqui e vão achar que esta irmã está é maluca, rodando pelo mesmo lugar sem parar (risos). Agora, já consigo andar por todo o hospital sem me perder. Mas ainda tem lugares que ainda não fui conhecer, como o centro cirúrgico, por exemplo. Já sei quem é paciente e quem é colaborador (risos).

Notisul – Irmã Enedina, antes de sair, deixou alguma recomendação à senhora?
Irmã Jacira
– Não deu muito tempo. Ela já estava em Florianópolis quando cheguei aqui. Eu estava em Passo Fundo (Rio Grande do Sul), em um curso de férias. Então, a gente se desencontrou. Ela começou lá em janeiro e eu cheguei em fevereiro. Dia 13 (de fevereiro), ela veio para me empossar e me entregou as chaves do hospital e uma série de listas com todos os colaboradores, divididos por setores, e disse: “Aqui estão. A partir daqui, você vai vendo quem são, vai fazendo as reuniões, vai procurando se achar e boa sorte” (risos).

Notisul – Apesar de toda a luta da comunidade hospitalar, o setor de emergência sempre foi complicado. O que a senhora pretende fazer para melhorar esta área?
Irmã Jacira
– Desde o primeiro dia que cheguei, logo depois que assumi, o setor de emergência já se tornou uma preocupação e uma meta. A primeira coisa é melhorar o atendimento às pessoas. Coloco-me no lugar do cidadão, também posso precisar de uma emergência e quero ser atendida. Quero que as pessoas que procurem o HNSC, não importa se é SUS, particular ou convênio, saiam daqui satisfeitos, recebam o melhor. Aos poucos, fui percebendo as dificuldades. Além disso, quando cheguei, já sabia do problema, então meus olhos já se voltaram para isso. A primeira coisa que fiz foi retirar a entrada de visitas pela emergência. Agora, todos entram pela recepção. Isto já diminuiu um pouco o fluxo de pessoas que circulam por lá (pela emergência) e trouxe novo fôlego para quem trabalha e para quem precisa de atendimento. A outra medida foi contratar mais um médico na emergência para dinamizar o atendimento. Quando digo que contratamos mais um médico, não se trata de apenas um profissional. É um (médico) para cada horário do plantão. Então, são mais pessoas.

Notisul – A contratação de mais um médico não onerou ainda mais o setor?
Irmã Jacira
– Teoricamente, não. Na prática, sim. Na verdade, fomos até a prefeitura e pedimos ajuda para cobrir este investimento. Já temos um convênio, o que solicitamos foi uma verba maior. O secretário de saúde (Roger Augusto Vieira e Silva) me pareceu um profissional de primeira. Foi muito solícito. Não veio com a historinha do “vamos ver”. Expôs logo a realidade do município e falou que algo seria possível, quem sabe não o que pedimos, mas o município iria ajudar. Isto é importante, sermos abertos e sinceros. A partir desta sinalização positiva, deste comprometimento tanto do secretário quanto do prefeito (Manoel Bertoncini – PSDB) já contratamos o profissional. Até agora, não recebemos nada da prefeitura, mas tenho certeza que eles já se organizam para colaborar. Sentimos verdadeiro comprometimento. Por isso, tomamos a frente. A população merece.

Notisul – E já surtir resultado?
Irmã Jacira
– Foi praticamente imediato. Esta era uma necessidade visível e urgente. Como ninguém me conhece muito ainda, eu aproveitei e fui até lá. Falei com os profissionais, com os pacientes. Ainda há o que mudar, mas todos falaram que já melhorou. Tanto na rapidez do atendimento quanto na humanização.

Notisul – Já houve um momento que a então diretora-geral, irmã Enedina Sacheti, chegou ao ponto de ter que pensar em fechar o setor de emergência ou restringir o atendimento por conta da alta dívida do setor. Isto ainda pode ocorrer?
Irmã Jacira
– Esperamos não precisar tomar nenhuma atitude drástica. Hoje, a situação é difícil, mas está muito mais controlada. Hoje, fazemos uma triagem. Ainda há muita falta de conscientização. Muitos nos procuram para conseguir exames com maior facilidade, para tirar um atestado médico, para fazer procedimentos que não precisariam nem do posto de saúde do município, como um corte superficial no dedo.

Notisul – Mas o déficit da emergência continua?
Irmã Jacira
– Sim. E esta é uma questão que não diz respeito à quantidade de procedimentos somente. A tabela do SUS, aquilo que recebemos do governo federal pelos procedimentos que realizamos, é muito inferior ao realmente gasto. Infinitamente inferior. Em muitos casos, não cobre um terço do procedimento. No caso de uma pneumonia, por exemplo, o SUS paga ao hospital apenas três dias de internação, mas o antibiótico leva no mínimo sete dias para reagir. Estes quatro dias a mais são pagos pelo hospital. Por isso que a dívida é sempre alta e crescente.

Notisul – Esta questão da revisão das tabelas do SUS é antiga. A senhora credita que isso ocorra em breve?
Irmã Jacira
– Preciso acreditar. Recentemente, os hospitais de caráter filantrópico, como é o caso do HNSC, tiveram uma reunião com o ministro (da saúde), José Gomes Temporão, para que haja esta revisão das tabelas. Tanto na questão do prazo quanto no valor das internações. Hoje já não dá mais. Não há como manter uma emergência com preços tão defasados. Os medicamentos e os materiais hospitalares sofrem reajustes constantes, a tabela do SUS não segue este mesmo ritmo.

Notisul – Ainda que o HNSC seja o maior hospital em número de leitos pelo SUS, havia falta de acomodações para todos. Este problema ainda continua?
Irmã Jacira
– Continua. E considero um problema sério. Ainda não consegui ver uma solução para esta questão. A quantidade (de leitos) que temos hoje já não supre mais as nossas necessidades. Como não temos leitos para atender a todos, muitos ficam instalados na emergência, o que não deveria ocorrer. Isso que são 405 leitos pelo SUS, quase 70% dos leitos do hospital inteiro. Isso deve-se também ao número de dias que os pacientes ficam internados. Encontramos uma realidade complexa em Tubarão. Muitas vezes, o paciente não tem o medicamento para continuar o tratamento em casa, ou a alimentação obrigatória para continuar a dieta. Por isso, muitos precisam ficar o dobro do tempo, às vezes o triplo, para poder recuperar-se. Com isso, não há tanta rotatividade e a solução é deixar quem chega por último na emergência mesmo. Não podemos e não vamos deixar de atender ninguém. Isto reflete também no déficit da emergência.

Notisul – E a UTI? Neste setor, também havia falta de leitos. Isto será resolvido?
Irmã Jacira
– Assim espero. Ao todo, temos 32 leitos de UTI: 20 para adultos, dez para o setor neonatal e dois para a pediatria. Mesmo assim, não são suficientes. Antes da irmã Enedina sair, ela fez uma previsão orçamentária para aumentar o setor. Mas a secretaria estadual de saúde não autorizou a obra. Por enquanto, temos que aguardar. No fim deste ano, quando faremos a previsão orçamentária do hospital para 2010, vamos fazer uma nova tentativa. Se de certo, poderemos abrir mais dez ou 20 vagas.

Notisul – E se está tudo cheio e chega alguém que realmente precisa? O que é feito?
Irmã Jacira
– Não temos leitos, mas temos bastante equipamentos, então, colocamos o paciente nos setores onde há médicos 24 horas por dia e acesso rápido. É o caso do centro cirúrgico, do prontoatendimento e da emergência. Então, o paciente fica como se estivesse na UTI, com toda a aparelhagem, mas em leitos normais. Não é exatamente o correto, mas é o possível.

Notisul – Quais as suas metas frente à direção-geral do hospital neste ano?
Irmã Jacira
– Atendimento, atendimento, atendimento (risos). Desde o começo do ano, o principal foco foi a emergência. Quero que seja nosso cartão de visitas. Que a pessoa chegue ao setor e saiba que será, sempre, bem atendida. Outra meta é capacitar os colaboradores, contratar profissionais que deem excelência no atendimento. Outra meta é finalizar as reformas iniciadas na gestão da irmã Enedina Sacheti. Falta a maternidade e o setor oito, ambos que atendem pacientes do SUS, o revestimento externo do novo prédio e também a instalação de um novo aparelho de raio-x na emergência. Como não há espaço, precisaremos construir um lugar específico.