“A hipertensão é um mal silencioso”

A cardiologista Márcia Regina Pereira, 49 anos, formou-se em medicina na Universidade Federal de Santa Catarina (Ufsc) há 25 anos. É mestra em ciências médicas pela Ufsc. Em 2003, realizou um estudo sobre a hipertensão em Tubarão. Ministra aulas no curso de medicina na Unisul. Casada com o prefeito Manoel Bertoncini (PSDB), tem dois filhos, Lais, 19, e Igor 14. E não gosta do rótulo de primeira-dama. 

 

Karen Novochadlo
Tubarão
 
Notisul – Há algum tempo, o Notisul divulgou que um pouco mais de nove mil pessoas fazem tratamento contra a hipertensão nos postos de Estratégia Saúde da Família em Tubarão. Existem muito mais hipertensos no município?
Márcia – Em 2003, em um estudo de prevalência de pessoas hipertensas na nossa região, que fazia parte da minha tese do mestrado, encontrei 40% de hipertensos na população acima de 18 anos em Tubarão. É um problema de saúde pública. A hipertensão é a causa de várias doenças cardiovasculares. Hoje, o nível de pressão para ser considerado hipertenso está cada vez mais baixo. Os níveis mais altos de pressão já estão associados com algum nível de doença cardiovascular. Hoje, a pressão boa é igual ou menor a 12/08. Em nível nacional, 35% da população é hipertensa. 
 
Notisul – A hipertensão em Tubarão é alta, em comparação ao resto do Brasil?
Márcia – É alta, mas uma média esperada. Para o estudo, entrevistamos 700 e poucas pessoas da área urbana, que é geralmente  onde tem mais hipertensão. Um dado importante é que muitas pessoas desconhecem que são hipertensas. Apenas 55,6% sabiam. Ou seja, quase metade tinha conhecimento de que era hipertenso, 46,8% estavam em tratamento. Controlada só 21,8%. Isto é similar à média nacional.
 
Notisul – Por que tão poucas pessoas tratam a hipertensão?
Márcia – Um pouco é a dificuldade de acesso à informação. Não sabem que a pressão alta pode trazer consequências. O grande problema é que a maioria das pessoas não sente absolutamente nada e não sabe que é hipertensa. Chamamos de mal silencioso. Aí, quando tomam um remédio e passam a sentir algum sintoma, em função da medicação, acham que o remédio está fazendo mal, e param de tomar. Não levam em consideração que aquilo é algo momentâneo. Na verdade, evita complicações ao longo prazo.
 
Notisul – Quais são os sintomas?
Márcia – Dor de cabeça, tontura, náuseas. Às vezes, abre com um quadro de complicação, como um AVC, paralisia de um lado da face, dificuldade na fala. Ou até com um infarto, um problema de rim. A hipertensão é maior nos homens do que nas mulheres.
 
Notisul – Existe algum motivo?
Márcia – Não tem motivo. Não tem como dizer que é a carga de estresse porque hoje a mulher está igual.
 
Notisul – Não seria por que a mulher cuida mais da saúde?
Márcia – Isso a gente vê também. Observamos no estudo que as mulheres tratam e conhecem mais. Elas têm um controle maior da pressão. No sexo masculino, 47% conheciam que eram hipertensos, enquanto as mulheres 62%. Quanto ao tratamento, 37,8% dos homens tratavam e 54,5% das mulheres. O controle da pressão era feito por 20% dos homens e 22% das mulheres. Conclusão: as mulheres tratam mais, conhecem mais, controlam mais. 
 
Notisul – Você observa que tem aumentado os casos de hipertensos? 
Márcia – Eu acho que, pela questão da mídia e das clínicas, a tendência é que mais pessoas procurem se tratar. Não acho que a prevalência tenha aumentado. Mas acho que a procura é pouca ainda. 
 
Notisul – A hipertensão pode ser associada com a idade?
Márcia – Acima dos 60 anos, 60% dos idosos são hipertensos. A chance de ter hipertensão aumenta disparada com a idade, que é um fator de risco.
 
Notisul – Também existem jovens hipertensos…
Márcia – A maior parte dos casos de hipertensão uma causa específica. No jovem, quando fazemos um diagnóstico abaixo dos 30 anos, procuramos uma causa secundária. Um problema de rim ou hormonal. Na mulher, por exemplo, pode estar associado ao anticoncepcional. Se tirarmos aquela causa, vai normalizar. Abaixo dos 30 anos ou mesmo acima dos 55, temos que procurar um fator para a hipertensão.
 
Notisul – Quais os fatores de risco?
Márcia – Os fatores de risco são: obesidade, que é o mal do século agora, o consumo excessivo de sal, o estresse e a falta de atividade física. 
 
Notisul – O que fazer quando se tem hipertensão?
Márcia – Uma das primeiras coisas para saber se é hipertenso é fazer o controle da pressão. A questão de parar de fumar não é para evitar a hipertensão. É um fator de risco a menos. A pessoa que fuma tem uma chance maior de ter um problema cardiovascular. Deve-se diminuir o consumo de álcool. Adotar uma dieta balanceada para não ganhar peso, evitar o excesso de gordura e de carboidrato. Diminuir o consumo de sal. Por exemplo, não  adicioná-lo em alimentos que não são salgados, como a salada. Reduzir a quantidade no preparo da comida. Também cuidar com os alimentos pré-faturados, embutidos, como salame, queijo. Existe uma campanha para que as indústrias diminuam sódio ou ofereçam alimentos com menor quantidade da substância. Hoje, temos alimentos diet, light. Mas, alguns são sal puro.
 
Notisul – Muitas pessoas enganam-se e pensam que produtos light e diet são os mais saudáveis. 
Márcia – Sim. Por exemplo, o refrigerante diet tem um teor de sódio maior. Alguns têm 50 miligramas numa latinha. O normal tem em torno de dez miligramas de sódio. 
 
Notisul – Como a pessoa pode descobrir que está com a pressão alta? Um dia posso medir e estar com a pressão alta por causa do estresse?
Márcia – Quem tem fator de risco é bom verificar a pressão uma vez por mês ou a cada seis meses.  No mínimo, uma vez por ano.  O ideal é que sempre se verifique a pressão. O diagnóstico da hipertensão tem requisitos, com duas visitas e três medidas sempre em  diferentes momentos. 
 
Notisul – Quanto à saúde do Dr. Manoel, imagino que para você que é médica seja difícil lidar com a questão do câncer. Até por não ver o assunto como uma leiga.
Márcia – É bem complicado. Hoje está bem melhor. Ele continua a fazer o tratamento. Nos habituamos com a doença. Nós estamos nos familiarizando e aceitando. É isso que faz a pessoa batalhar contra a doença. Quando aceita e não se entregue. Mas, com certeza, isso  te tira o chão. Na época foi terrível. Foi um drama na cidade inteira, recém eleito. Todo mundo quer saber. Na época, saímos daqui e fomos fazer o tratamento fora, para ter um pouco de traquilidade. Depois, voltamos continuamos com tratamento aqui.
 
Márcia por Márcia
Deus: É tudo. 
Família: Alicerce.
Trabalho: Objetivo de vida.
Passado: O que passou a gente esquece.
Presente: É o que a gente vive.
Futuro: A Deus pertence.
 
As doenças cardiovasculares são responsáveis por 30% das mortes, seja aqui no Brasil, em Tubarão, no mundo inteiro. Mostramos uma realidade no mundo todo. Todas as pessoas morrem muito mais do coração (doenças cardiovasculares) do que de Aids ou câncer. As mídias que vemos sobre o câncer na mulher estão corretíssimas. Mas, hoje, a mulher morre muito mais por doenças cardiovasculares.