Em decisão unânime, TRF4 mantém condenação e aumenta pena de Lula

Porto Alegre

Com o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) cercado por policiais militares e federais, atiradores de elite no topo do prédio e helicópteros vigiando o espaço aéreo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve mantida sua condenação por corrupção e lavagem de dinheiro no mais emblemático processo da Lava-Jato. A decisão, por 3 votos a 0, além de colocar em risco à candidatura presidencial de Lula e deixa-lo à mercê de uma ordem de prisão, aumentou a pena do petista dos nove anos e seis meses – estipulados pelo juiz Sergio Moro – para 12 anos e um mês de cadeia, em regime fechado. 

Como tanto o veredito como a pena foram unânimes, Lula pode ter decretada sua prisão tão logo sejam julgados os embargos de declaração, recurso utilizado pela defesa para buscar esclarecimentos sobre a decisão do tribunal e que, no TRF4, leva de um a dois meses em média para ser apreciado. O ex-presidente também foi condenado a pagar uma multa de R$ 1,33 milhão.

Enquanto Lula acompanhava a sessão do Sindicato dos Metalúrgicos em São Bernardo do Campo (SP), seu berço sindical e político, os magistrados esquadrinhavam em linguagem jurídica o esquema criminoso que desviou recursos da Petrobras em troca de um tríplex no Guarujá para o ex-presidente. Para os desembargadores João Pedro Gebran Neto, Leandro Paulsen e Victor Luiz dos Santos Laus, o ex-presidente beneficiou a construtora OAS em troca da aquisição e reforma do imóvel em frente ao mar do litoral paulista. 

Após mais de nove horas de sessão, restou inútil a peroração do advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins. Na sustentação oral em que pediu a anulação do processo e, em última análise, a absolvição de seu cliente, Zanin atacou Sergio Moro e disse que não havia uma única prova contra o ex-presidente.

— O que se tem aqui é um processo nulo, que gerou uma sentença nula. Não foi feita a prova da culpa. Foi feita a prova de inocência. Não houve vantagens indevidas. O triplex não é de Lula. O triplex sempre pertenceu à OAS — asseverou. 

No primeiro julgamento da Lava-Jato transmitido ao vivo pela internet – e acompanhado no TRF4 por 43 correspondentes estrangeiros e 250 jornalistas brasileiros –, Gebran, Paulsen e Laus concordaram com os argumentos do Ministério Público Federal, segundo o qual Lula aceitou fazer nomeações políticas para cargos estratégicos na Petrobras. Em troca, os diretores da estatal fraudavam contratos com empreiteiras, obtendo propina para enriquecimento ilícito de agentes públicos e financiamento de campanhas eleitorais. 

Citando depoimentos e provas coletadas durante a investigação, o procurador-regional da República, Mauricio Gerum, apontou Lula como o chefe do aparato criminoso, tendo conhecimento e efetiva participação nos desvios de recursos.

— Um presidente da República que nomeia diretores de estatal em esquema com empreiteiras e engendra o maior esquema de corrupção da história do Brasil. Lamentavelmente, Lula se corrompeu — resumiu. 

Em um voto de 430 páginas e mais três horas, dizendo incumbido de uma tarefa “sensível e dramática” de julgar um ex-presidente, o relator do processo, Gebran, concordou com a sentença original de Moro, no qual o juiz afirma que o tríplex fazia parte de uma propina total no valor de R$ 16 milhões destinados ao PT. Com o imóvel, Lula teria recebido R$ 2,2 milhões. Ele lembrou a visita do ex-presidente e da mulher, Marisa Letícia, ao apartamento, enquanto as obras estavam sendo concluídas. 

— Tenho juízo probatório acima do razoável de que o tríplex foi reservado a Lula. E assim permaneceu após a OAS assumir o empreendimento. Tenho que a reforma e compra da cozinha foram feitas para o ex-presidente e com base em projeto aprovado por ele e pela ex-esposa. 

O magistrado citou ainda inúmeros depoimentos de delatores e réus já condenados para definir a participação do ex-presidente no esquema criminoso gestado na Petrobras.

— As provas indicam que, no mínimo, ele tinha ciência e dava suporte — afirmou, antes de votar pelo aumento da pena para 12 anos e um mês de prisão em regime fechado. 

Durante toda a sessão, numa mensagem velada às insinuações de aliados e simpatizantes de Lula sobre um eventual julgamento político e direcionado do ex-presidente, os desembargadores fizeram questão de salientar a independência do TRF4 e da Justiça Federal de Curitiba.

— Tudo que se faz necessário para assegurar um julgamento legítimo e justo foi feito, pela 13ª Vara e por essa Corte. Ela é complexa, mas complexos são os fatos. O julgamento se deu de modo técnico e devidamente fundamentado. Aqui ninguém pode ser condenado por ter costas largas ou absolvido por ter costas quentes — afirmou Paulsen. 

Ao discorrer sobre o mérito do processo, o desembargador citou o mensalão para exemplificar como as engrenagens da corrupção se mantém ativa no país, dando forma à perpetuação de projetos políticos pessoais. Desfiou os nomes de condenados naquele processo e na Lava-Jato, alguns deles repetidos em ambos os casos. 

— A estrutura e o modus operandi dessa atividade criminosa continuam operante —garantiu, para em seguida comentar a conduta de Lula e também votar por 12 anos e um mês de prisão:

— Há elementos de sobra para mostrar que concorreu para os crimes de forma consciente e livre.

Com 2 votos a 0 contra Lula, o suspenso ficou por conta do voto do terceiro desembargador, Victor Laus. O magistrado, contudo, começou sua explanação com um elogio à atuação de Moro no processo – “corajoso e brilhante, tem diante de si uma complexa análise de casos”, e completou: 

— Após ouvir o relator e o revisor, anulei qualquer dúvida. 

A partir daí, Laus teceu um voto didático. Disse que a acusação tinha provas documentais e testemunhais, reafirmou os privilégios concedidos a Lula na aquisição do tríplex e aderiu à posição dos colegas de turma. Era o voto derradeiro: 3 a 0.

— Temos de formar convicção com provas verossímeis. Ao longo do processo, elas resistiram à defesa. Ficou demonstrada a acusação que vem a juízo. 

Ao cabo do julgamento, o tribunal manteve o restante da sentença de primeira instância, condenando os executivos da OAS Agenor Franklin Magalhães Medeiros, e Leo Pinheiro, e absolvendo os demais quatro réus, entre eles o ex-presidente do Instituo Lula, Paulo Okamotto.