Início Opinião A Copa da Rússia e o racismo de direita e de esquerda

A Copa da Rússia e o racismo de direita e de esquerda

Víctor Daltoé dos Anjos
Geógrafo pela UFSC
victordaltoe@gmail.com

Quando da vitória dos franceses na Copa da Rússia de 2018, uma charge do cartunista jordaniano Mahmoud Rifai rondou o mundo. Ela mostra um punho negro carregando a taça da Copa, enquanto uma mão branca partindo da França se apropria do objeto. Por debaixo da vontade do chargista de crítica ao racismo e à xenofobia, (fenômenos que todos nós devemos sempre denunciar), está um fundo racista de argumentação.

Primeiro. Os jogadores negros da França vitoriosa na Copa da Rússia em 2018 são franceses, não africanos. Não importa que sejam filhos de imigrantes de países do Maghreb ou do Golfo da Guiné, na África. Nesse continente nasceram apenas dois deles, como Umtiti. A esquerda que afirma que os jogadores negros são africanos, mesmo com a boa e louvável intenção de defender os direitos de imigrantes e seus descendentes, está repetindo os mesmos argumentos da extrema-direita francesa xenófoba para atacar qualquer cidadão francês negro que viva nesse país europeu.

Em 1998, o zagueiro francês Thüran, descendente de africanos, foi o responsável pelos dois gols que levaram à França à final contra o Brasil, e ao panteão dos campeões do mundo. Naquele tempo, o líder da extrema-direita francesa, Jean-Marine Le Pen afirmou que a seleção francesa cada vez mais só tinha negros, e não franceses. Le Pen partia do argumento racista de que a nação é transmitida pelo sangue dos ancestrais, ou pela cor da pele, rejeitando que uma pessoa negra pudesse ser francesa. Le Pen achava que um negro é sempre um africano, não importando onde ele estiver morando ou onde tenha nascido.

Thüran respondeu à provocação afirmando que “não era negro, era francês”. Thüran mostrou ter aprendido que a sua nacionalidade, por ser um ideal eminentemente moderno, se baseia num contrato social, em que um indivíduo e um Estado-nação estão ligados por vínculos de direitos e deveres. Não é o sangue ou a cor que determina a nacionalidade no mundo moderno, é a cidadania. Além disso, Thüran sabe que a África não é um país, e sim um continente com mais de 50 nações, muitas vezes envolvidos em férreos e cruéis confrontos entre si.

A ignorância sobre esses fatos mostra que o racismo está à espreita nos cantos mais obscuros da direita e da esquerda, pois é um camaleão que se disfarça nos matizes de todas as cores do espectro político.

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